Viagem
à Cádiz
Angela Barros
O sol estava a pino naquele momento do
dia e o ar condicionado do carro tinha pifado logo no início da viagem, que aliás
seria longa. O suor pingava do seu rosto, a camisa colada no corpo estava
deixando-o cada vez mais mal humorado e ainda tinha pela frente cerca de cinco
horas até chegar em Cádiz.
Para
percorrer o trajeto entre Madri e Cádiz, nesse época do ano, ele sabia que deveria ter saído mais cedo de
casa, mas dormira mal, acordou tarde e a cama estava tão gostosa quando despertou
que decidiu aproveitar aqueles momentos preguiçosamente, afinal não tinha hora
marcada para chegar. Agora se arrependia até o último fio de cabelo.
Ligou
o rádio tentando desviar o pensamento do calor. Afinal o motivo da viagem valia
a pena, sua filha Ana, finalmente depois de vários relacionamentos frustados,
conheceu Carlos, o homem que a levaria para o altar e estava grávida do seu
primeiro neto. Ana, sapeca, da pá virada, mais para menino de tanto que chutava
a barriga da mãe nos últimos meses da gravidez, apressada para sair para o mundo. Agora
parecia que estava pronta para assumir a responsabilidade de uma vida
tranquila, familiar, pelos menos era o que dizia.
Além disso, no
final das fatídicas
horas ao volante estaria de volta a sua querida Cádiz, pequena cidade da Andaluzia, no sul da Espanha,
considerada a mais antiga da Europa Ocidental, com sua costa ensolarada, praias
de areia fina e branca.
Naquele ponto a estrada fazia uma curva acentuada para a direita, foi
quando Medeiros teve que pisar no freio ao ver uma jovem
mulher acenando desesperadamente
para ele. Apertou
tão forte o freio que o carro
derrapou quase acertando a grade de proteção que separava o pequeno acostamento do penhasco. Os olhos se arregalam, o coração acelera. Meu Deus, o
que essa louca está fazendo? O sangue espanhol subiu às ventas, desceu do carro
e foi em direção da mulher aos berros. Você sabe que eu poderia ter lhe
atropelado? Mais ainda, poderíamos estar os dois mortos agora! Sua louca!
Dolores
pediu mil desculpas, já tinha
pedido ajuda para vários carros que simplesmente a ignoraram. Sabia que tinha
arriscado suas vidas mas não podia continuar ali, não aguentava mais o color
que fazia, o cansaço, estava a ponto de desmaiar, precisava de ajuda. Por
favor, não fique bravo. Você pode, por favor, me dar uma carona até Cádiz?
Medeiros,
dava voltas ao redor do carro, olhava para o penhasco, para a mulher, enxugava
o suor que insistia em escorrer. A vontade era esganar a dita cuja. Ela por sua
vez, exaurida, sentada no chão
com as lágrimas escorrendo no rosto, paralisada esperava. Mais calmo ele
percebe que não tem outra alternativa a não ser ajudar a louca.
Depois
de dirigir por uma hora de cara amarrada Medeiros decide puxar papo com a mulher e perguntar o que tinha
acontecido. Dolores, meio sem graça
conta que tinha se recusada a seguir viagem com o namorado depois dela ter
encontrado no porta luvas do carro dele uma calcinha e ele ter a cara de pau de
falar que não sabia como ela tinha ido parar ali. Ele pensa que sou idiota?
Medeiros
não diz nada, apenas observa da
cabeça aos pés a mulher ao seu lado. Longos cabelos pretos, pele queimada do
sol, cativantes olhos cor de mel, mingnon, do jeito que ele gosta.
Ela
diz que está indo para Cádiz,
cidade que não conhece, para o casamento de uma aluna muito querida. Ela quer
muito que eu conheça o pai dela que está separado há alguns anos e acha que ele
tem tudo a ver comigo, pois está aposentado e adora viajar de bicicleta pela Europa como eu. O
casamento será na Igreja Divino Salvador, amanhã.
- Como chama sua amiga, pergunta Medeiros.
- Ana, responde Dolores.
- Você não vai acreditar, Ana é minha filha!
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