APAGANDO LEMBRANÇAS
Ledice
Pereira
O dia chuvoso me fez buscar algo para fazer já que
meus planos de sair foram abortados.
Resolvi colocar em ordem algumas caixas onde juntara
papéis antigos, cartas, fotos e bilhetinhos da minha juventude.
Chamou-me a atenção um pacote amarrado com fita
vermelha, contendo vários envelopes amarelados pelo tempo.
Sentei-me no chão puxando uma almofada para ficar
mais confortável e comecei a examinar o conteúdo.
Meu pensamento me levou para a época entre a
adolescência e a juventude, palco dos acontecimentos ligados àquelas cartas.
A
primeira carta veio naquele dia em que cheguei das compras com meu pai. O zelador a
colocou embaixo da porta. A letra era quase infantil. Trazia o endereço certo,
mas não continha nem destinatário nem remetente...
Lembro-me
que achei estranho aquele carimbo de urgente.
E
ao abrir, deparei-me com um lindo papel de carta florido sem, entretanto,
conter algo escrito.
Ainda
brinquei com meu pai, dizendo que devia ser de uma alma do outro mundo.
Depois
dessa vieram outras. Na segunda, onde constava meu nome, havia um desenho: duas
meninas, uma árvore e um sol. E não constava remetente.
A
curiosidade tomou conta de mim. Passei a aguardar a chegada do carteiro
querendo decifrar aquelas mensagens e de quem seriam.
Os
desenhos se intensificaram. Foram tomando conta de toda a folha de papel: corações,
flores, estrelas, pássaros... Até que um dia recebi uma longa carta, na qual
uma ex-colega de escola declarava o seu amor por mim.
Não
era uma colega tão chegada. Não fazia parte da minha turminha. Ficava mais
isolada, não tinha muitas amigas nem participava de nossas atividades
extraclasses.
Nunca
havia passado por uma situação dessas e custei a digeri-la.
Contei
para meu pai, que me aconselhou como sair daquela situação.
Com
educação e firmeza, respondi, explicando que não estava absolutamente
interessada naquele afeto.
Nunca
mais ela me escreveu.
Não sei o que me levou a guardar aquelas
lembranças, talvez pelo inusitado.
Hoje, em minha arrumação, rasguei-as e coloquei os pedaços no cesto de lixo.
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