A
Casa do Faz-de-Conta
A
Casa do Faz-de-Conta
I° Ato
Cenário:
Sala de uma casa luxuosa, bem decorada. O dono anda por ali,
observando toda a arrumação.
História de fundo: É
uma casa enorme, rica, com vários cômodos; grande jardim, quintal com árvores
frutíferas, fonte, recantos bem cuidados. Bom cenário para filmagens,
representações.
Personagens:
Mentor: Diego, proprietário da
casa. Cineasta.
Dono da casa do
Faz-de-Conta: Felipe
Mãe:
Amorcito
A empregada: D. Francisca
Filho:
Filha:
1°Colaborador:
2°Colaborador:
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Diego:
(andando pela sala, falando ao celular) – Olá, Felipe? Você está disponível
para mais uma empreitada?
Felipe: (no
celular) – Olá! Como está? Eu estou sempre pronto, Diego! O que você manda
desta vez?
Diego: (andando,
mostrando a casa) – Sabe, Felipe, eu não consigo ver todo esse ambiente vazio,
à espera de realizações. Tenho um projeto em mente, mas queria a sua parceria.
Está preparado para um briefing?
Felipe:
(animado)-Opa! Mas quem acredita em briefing? Só mais essa vez, hein, já não
sei se consigo administrar o caos que seus projetos mirabolantes causam!
(risadas)
1° Colaborador: -
Ele acha que é ele quem administra o caos! E nós? Sou eu quem se vira pra fazer as instalações
elétricas, ajustar os microfones, os fios por todos os lados...
2° Colaborador:- E
eu então, encarando os percalços com os cenários, com os figurinos... Sou um contrarregra
à deriva nesse oceano de coisas imprevisíveis.
Diego:
(desfazendo dos comentários) – Larguem mão de mi mi mi! Vocês têm aqui o melhor
diretor de cena do país, já quase merecendo um Oscar!
1° Colaborador: -
Só gostaria de lembrar que é o bam bam bam aqui que tem de deixar tudo
prontinho para o show!
2° Colaborador:
-Sem falar que sou eu que tenho de dar conta da burocracia com os contratos,
pagamentos de horas-extras, lanchinho para os intervalos...
Diego:
(rindo) -Lá vem a choradeira! Saibam que isso aqui é o filÉ mignon da arte
criativa! Um reality show privé made in Alto de Pinheiros!
Diego:
(senta-se e fica sério) -Bom, lá vai! Desta vez vou patrocinar uma história
grandiosa, inusitada. Entretanto, preciso contratar um staff apurado, nada de
amadores. A não ser para a peça principal; ali, neste lugar, preciso de alguém
que tenha uma presença imersa na realidade, entende o que quero dizer?
Felipe:
(intrigado) -Seja mais preciso, Diego; não estou conseguindo inserir fato e
fake no mesmo bolo!
Diego:
(entusiasmado, levanta-se e caminha pela sala) -Calma, Felipe. O conjunto se
explica no jogo do faz de conta. A peça principal, que dará a “cola” em tudo,
será a empregada.
Felipe:
(surpreso)- A empregada?
Diego:
(didático) – Sim, a empregada! Por isso terá que ser muito bem talhada,
expedita e sensível, porque vai ter de dar conta da casa e das pessoas. Conhece
alguém capaz de encarar essa empreitada?
Felipe:
(pensativo) -Olhe, conheço uma senhora que nos servirá com total segurança;
trata-se de D. Francisca conhecida de minha família há anos. Pessoa de Minas,
trabalhadeira, crente, fiel.
Diego:
(aliviado) -Ótimo, Felipe. Então, traga a senhora já praticamente contratada. Quero
iniciar os trabalhos o quanto antes. O cachê deve ser sedutor o suficiente para
ela se engajar logo de início.
Felipe:
(irônico) -Mas, então, Diego, e o tal do briefing? Vai dar ou não?
Diego:
(senta-se pensativo) -Ok! Queria contar com o fator surpresa, mas aqui vai todo
o escopo: os trabalhos serão uma sequência irreal da vida de uma família rica,
composta por um casal e dois filhos.
Felipe: (atento)
– Seja mais detalhista, por favor.
Diego:
(continuando...) -Ok! Temos um pai na
pele de um irritadiço e grosseiro dono da casa; uma mãe na pele de uma
socialite fútil, sempre ligada nas mídias sociais; e os filhos, jovens
individualistas, um tanto alienados, com comportamentos e atitudes bem esquisitos.
Felipe: (um
tanto surpreso, irônico) -Mas é um contexto de TDAH, de TEA? O que pode
redundar disso tudo?
Diego
(animado)-Aí é que se insere “the heart of the matter” ! D.Francisca, a
empregada! Ela será a pessoa mais normal e verdadeira de toda essa
circunstância. Ela não pressentirá, nem por um instante que estará participando
de uma espécie de reality show.
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II Ato
(Cenário a meia luz; entram os figurantes; foco de luz em um
de cada vez até todos aparecerem)
Filha: (admirando a casa) – Nossa, que bela sala! (rodopia) Um cenário
caprichado, não é mesmo gente?
Filho: (encenando, teatral) – Ser ou não ser. Eis a questão! Que tal? Isso aqui
combina com Shakespeare, não acham?
Mãe:
(admirando a sala) – Essa decoração é um capricho! Espero ser a estrela da peça, circular por esse
espaço charmoso... Combina bem comigo!
Pai:
(pondo fim aos comentários) – Podem baixar as expectativas, pessoal. Ninguém
aqui vai brilhar sob os holofotes tanto assim. Na verdade, teremos que
apresentar nossas piores expressões faciais, verbais e gestuais, coisa nada
fácil como vocês bem sabem. Afinal, interpretaremos uma família estressada e eu
serei o mestre do mau humor patriarcal.
Filho: (desmunhecando um pouco) – Eu que não vou ser a vítima de nenhum tirano
aqui, falou?
Mãe: (afetada) – Se eu vou ser a esposa de um mal-humorado acho que mereço um
cachê bem alto, certo?
Filha: (divertindo-se) – Pelo jeito vou poder deitar e rolar na teimosia, nas
discussões. Sou boa nisso, sabia? Treino em casa direto!
Diego: (sério) – Calma, calma todo mundo. A coisa é séria. Conto com vocês,
artistas já escolados na dramaturgia, para dar veracidade à fábula do “show
de Truman!” E lembrem-se bem que a
personagem de D. Francisca não é uma artista; trata-se de uma pessoa comum,
contratada para trabalhar para essa família rica, entretanto esquisita e mal-educada.
Pai: (sério) – Diego, pode contar conosco. Já trabalhamos juntos antes e rola
um bom entrosamento entre a gente. Vamos representar tão bem que D. Francisca
não vai nem acreditar com o final da peça!
(Mudança de cenário: agora todo iluminado, tal uma manhã de
sol. D. Francisca chega, se arruma num canto pondo um avental e uma touca)
D. Francisca: (discreta, expressão satisfeita) – Êta dia bonito pra
começar num emprego novo! Sorte eu tenho, porque é uma família pequena, um
casal e só dois filhos – valha-me Deus!- já crescidos; melhor, não darão
trabalho!
(Põe a mesa para o café com cuidado e esmero e fica aguardando
o pessoal chegar. Entram todos juntos)
Todos: (Jovens emburrados) – Bom dia!
Pai:(arrogante)
-Como é, esse café está pronto ou não está? Pode servir, então, em vez de ficar
aí parada como uma estátua!
(Sentam-se à mesa com caras de pouco caso)
Mãe: (antipática) – Vejo que essa mesa não está bem-posta! Onde aprendeu a pôr
as louças desse jeito? Fique esperta, hein, D. Francisca, que meu marido é
muito exigente!
Pai: (autoritário) – Oh, D. Francisca, olhe aqui, o meu guardanapo é colocado
ao lado esquerdo do prato; não se esqueça mais disto, entendeu?
D. Francisca: (espantada, consente com um aceno de cabeça.)
Pai:
(dirigindo-se aos filhos, áspero) – Não quero comentários à mesa. Quem quiser
se manifestar, saia para o quintal e fale com os passarinhos. (dirigindo-se à
esposa, bem seco) – “Amorcito”, (diz afetado) vai sair hoje outra vez?
Para que? Não quero que se encontre com sua amiga Dolores, entendeu? Essa
mulher é péssima companhia para você, muito metida a ser dona da verdade!
(D. Francisca se afasta, assustada. Não consegue falar nada.
Encolhida num canto murmura baixinho)
D. Francisca: (Encolhida num canto, murmura baixinho)- Que família estranha!
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