MOMENTOS TRÁGICOS NA RODOVIA 169
Oswaldo Romano
Viajava
pela R169 ouvindo Tony Bennett envolvido
com meus pensamentos.
Aquele
olhar despreocupado que a gente dá no espelho lateral, mostrava tudo ok. Como é
normal aproveitei levantar os olhos vendo a paisagem.
É aquele piscar de olhos que, acredite, repeti no
susto.
Vi
quem ha muito procurava encontrar. O mesmo que me jurou de morte! Estava,
calculei, a uns cem metros, ali no centro da praça. Conversava com alguém. Sua
protuberante barriga, o denunciava. Era ele!
Peguei no porta-luvas
minha Taurus e tomado de ódio, pisei no freio, encostei. Abri a porta, sai marcando-o,
não queria perdê-lo.
Ele fora meu sócio
e interessado na minha filha. Descobri
que avançava também nos meus ganhos. Instalei micro câmera na saleta do cofre, provando
que mexia na minha gaveta. Alterava nossas planilhas, e aos poucos aumentou sua
roubalheira, tirando e corrigindo nelas os valores.
Acionei a
polícia. O vídeo não deixava dúvidas. Mesmo com seus argumentos, suas
justificativas não convenciam ninguém. Foi preso. Era o mínimo que merecia. Uma
dona, de nome Juana, a quem também enganou, contribuiu denunciando-o.
O malandro
contratou um famoso causídico, conivente com um corrupto juiz, e em pouco tempo
conseguiu a liberdade.
Livre, um dia apareceu
no escritório com uma ordem judicial, a fim de retirar o que era realmente seu.
Sem aviso e eu sem outra alternativa, abri a porta. Chegou ostensivamente mostrando
uma arma. Disse que estava disposto a me matar.
Um susto. E que
susto! Virou a mesa com raiva, jogando tudo pelos ares. Alegava que desviou porque trabalhava mais.
Mentira usada, por
todos da sua laia.
Sacou o
revolver, me fez de alvo e impôs: ajoelhe e reze, porque você vai morrer.
Fiquei sem chão.
Senti a morte. Ele estava transtornado. Eu imaginava uma bala entrando no meu
corpo. E minha família? Minha mulher?!
Olhando-me com
olhos vidrados, olhava para os lados, preparava uma fuga. Bendita sequência, e
bendito o crucifixo que eu mantinha na parede à direita. Reconsiderou, abaixou a arma colocando-a na
cintura. Vivi uma reconquista do meu eu.
Ainda disse:
— Resolvi, quero
matá-lo, é na rua. Quero ver gente, muita gente vendo-o morrer.
Apanhou um saco
plástico, recolheu suas coisas, e batendo a porta, foi-se.
Imaginem meu
estado. Mal conseguia levantar-me. Apoiando-me na cadeira, sentei. Vi a morte
muito perto. Tremia e tremi dirigindo até em casa. Meu pensamento, agora, era
um só. Ele realmente estava decidido a me matar. Diante dessa premissa, senti
uma injustiça tão grande que aos poucos me contagiei de cólera.
Colérico
resolvi: “Sou eu, eu é quem vai mata-lo. Depois terei o que contar. Diferente
do estar morto.”.
Bem, agora lá
está ele. Vou pega-lo. Chegou a hora. A rodovia 169, será a testemunha.
Corri, corri me misturando
a um casal que fazia cooper. Estava a cinquenta metros do valente. Arma escondida
na mão. Do jeito que ele me surpreendeu, agora chegou minha vez.
Nesse momento
alguém me puxou! Vai rasgar minha camisa, protestei! Largue!! Estanquei, olhei
para os lados e para trás. Ninguém! Não vi ninguém. Coisa estranha!! Meu
pensamento se abriu, dizia: você já perdeu o dinheiro, agora quer perder também
a liberdade?! Ele também pode estar prevenido. O outro pode ser segurança. Você
não morreu antes, quer morrer agora?
Enquanto ainda decidido,
só pude dar alguns passos.
— Volte,
apoie-se no amor a vida que você tem. Não conheço nenhum bandido vencedor. Volte,
tenha amor a sua família. Deixe que o mundo o julgue..
Foi
bom ouvi-lo.
— Sabe
de uma coisa? Meu pensamento está certo. Meu carro me espera. Ele vai levar-me
para casa, e eu vou seguir meu destino.
Longe,
ficaram o sócio que certamente já o havia visto, e seu segurança.
***
SEGUNDO CAPÍTULO
Pau que nasce torto, nunca se endireita. Eu não
sentiria sua morte caso o matasse. Ele é o tipo do cara, o chamado cara de pau.
Não devia ter desistido da minha intensão quando o vi naquela praça. Faz menos
que um ano e já está envolvido em novo mistério de família. Muito mais grave
que o simples furto. Trata-se de sequestro, prevendo-se assassinato.
Seu nome é Armando foi expulso da nossa
sociedade, Ferraro & Armando Ltda.- quando pego no roubo em nosso cofre. Minha
filha Noelí que com ele se engraçou, vivem juntos ha quase dois anos. Agora está misteriosamente desaparecida! Forte
desconfiança é de que ele a escondeu montando um golpe, um acharque com ajuda
de outros de sua laia.
Sou o Ferraro,
Vicente Ferraro. Tido como homem muito rico. Baseiam-se no meu patrimônio. Acreditam
que posso pagar qualquer valor de resgate. Há tempos deixei de ser político, e
como todos, queira ou não, político é sempre envolvido com maracutaias. Nunca precisei de dinheiro ilícito, apenas acompanhava
os demais.
Não tenho dúvidas
de que é ele o mentor dessa trama.
Entre as
inúmeras amizades da Noelí está o jornalista Cícero que gerência a coluna
investigativa do Jornal Guia da Cidade. Cícero é considerado bom amigo, embora
eu guarde certa reserva dessa amizade.
Acho, assim como
meus seguranças, que Cícero também cortejava Noelí usando-a para descobrir meus
negócios, nem sempre declarados no mundo empresarial.
Foi ele quem acionou
a polícia no processo do roubo do dinheiro da nossa sociedade. Prato cheio para
um grande furo investigativo seria agora descobrir o paradeiro da Noelí. Tem se
movimentado muito, acompanhado de agentes da polícia.
Está mexendo com fogo. Sabe do que Armando é
capaz, caso seja o culpado. Ele tem consciência disso.
Levantando
possibilidades não esquece que Ferraro proibia o namoro de Noelí detentora dos
segredos do pai que com ela compartilhava posses, perigosas de constar no próprio nome.
Afasta-la de Armando era a solução que procurava desde que se aproximaram.
Nessa ocasião Ferraro assistia aos flertes de Cícero com a filha. União que até
seria melhor.
Na polícia o volumoso processo estava a cargo
do Delegado Fausto. Diante dos inúmeros e vulneráveis fatos, pouco definidos, o
Doutor apelou para delegados criminalistas e formou uma mesa redonda. Queria
ouvir pareceres.
— Primeiro faço uma
relação dos envolvidos para facilitar montagem do perfil de cada um.
Os senhores têm
nessa pasta o resumo dos suspeitos. São dados desde a abertura do inquérito,
mais as anteriores constantes nas folhas corridas.
— Bem... sugiro
começarmos pelo chefão, o Ferraro.
— Sim concordo,
porem, deixa-nos ver o escopo dos fatos, para avaliação. - Pediu Dr. Guedes.
Acharam muito
importante a sugestão e no silêncio leram as sinopses.
— Ok iniciou o
Dr. Guedes. O Ferraro tem tudo para ser o sequestrador da filha.
—Sim. - disse
Dr. Gentil, mas vejam as fichas. O bandido aqui é o Armando. Tem passagem,
botou Ferraro de Joelhos, disse que iria matá-lo.
— Pode ser que
me engane, disse o Dr. Darci, mas quando menos se espera... Vejam o astuto jornalista
Cícero. Precisava tirar dela o que queria. Com uma reportagem bomba receberia o
que almejou a vida toda: O prêmio Jabuti desbancando Laurentino Gomes neste
ano.
Nessa altura o
Delegado Fausto, interrompendo, disse: — Gente, estamos na estaca zero, vocês
estão jogando tudo no meu colo!
Falou rindo.
— Sua vez Dr.
Vieira. Agora eu me calo!
— Bem, até agora
não encontraram o corpo. Quem pode afirmar ter sido assassinada? Noelí se
escondeu! Sentiu que sua vida corria perigo. Aguarda uma oportunidade de se
mostrar e fazer reconhecer os bens que estão em seu nome.
—Vocês têm em mãos o contencioso
completo do caso Noelí, interveio Dr. Fausto. Peço que estudem, removam achados
evasivos e me deem notícias.
Dr. Fausto
convocou os dois seguranças do Ferraro. Eram Fernando e Joel. Fernando, filho
da cozinheira Isaura, foi criado na mansão de Ferraro, considerado de estrema
confiança. Joel fora indicado pela própria delegacia.
Apenas
compareceu Joel porque Fernando havia viajado para o norte, licença concedida
por Ferraro, pois queria procurar e conhecer familiares da mãe.
Ao delegado,
Joel diz que sempre acompanhou o patrão. Nunca viu nada de anormal entre pai e
a filha, a não ser discussões de família. — Ele tinha ódio de morte era do
Armando que se dizia genro e se tornou sócio no escritório. Meu patrão provou
que ele é ladrão. Foi preso, e logo conseguiu sair. Sei que entre eles havia
jura de morte. Meu patrão não tem dúvida de que ele é o responsável pelo sumiço
da Noelí. Fez por vingança. Em dois anos deve ter tirado as informações que
queria.
— Das conversas
com seu patrão, em que mais você pode nos ajudar?
— Doutor, sou
seu segurança. Olhar atento, mas surdo e mudo. O que falei é do conhecimento de
todos.
— Aqui e na
justiça você deve falar. O direito de se calar lhe é dado, porem se você veste
a carapuça, deixa alusões de culpado, seria prejulgado depois.
— Acho que entendi mais ou menos, doutor. Tem,
nada não. Todo mundo sabe do desgosto que causou aqueles dois se juntarem. Noelí
era a filha confidente. O patrão ficou louco quando ela se amigou. Ele é um cara
malandro, manjado.
—Tá bem Joel, você
sabe muito mais, não faltará oportunidade de nos contar. Pode ir agora.
Doutor Fausto
acomoda-se na poltrona, põe seu pensamento a navegar: - “poderia o próprio pai sumir com a filha? Caso ela revelasse o que sabe
o pai correria risco de vida? Ele teria coragem de numa discussão mata-la? E Armando,
depois de tirar dela os segredos a mataria? O Cicero ficou em cima do muro. O
que estaria planejando. Seria só reportagem? Devo esperar, é possível que o
corpo apareça. Em todo caso...” —
Moça, me traga um café. Obrigado.
Não demorou. No
domingo foi dada a notícia de que fora encontrado um corpo em cova rasa. Levada
a notícia ao delegado, Fausto vibra na esperança de tê-la encontrado. Requisita
o IML e juntos seguem até o local.
Era um corpo sim, mas de homem.
Sofreu um banho de água fria!
Dia seguinte Ferraro recebe uma carta. Reconhece a
letra! Não tinha remetente. Abre e ansioso, tremia e lê:
— Pai, estou bem e bem feliz! Vivo com o Fernando.
Estamos revivendo nosso tempo de meninos, brincando nas dunas, nas trilhas, no
mar. Fique sossegado que está tudo sobre controle. Dê notícias a quem perguntar
por nós. Para a Dona Isaura, meu beijo e diga que seu filho é um amor! Para o
Armando que procure outra vida. Pai, seus segredos estão muito bem guardados.
Meu amor por Fernando sempre existiu. Eu é que o
descobri tarde. Beijos.
Noelí
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