MACHISMO - Oswaldo U. Lopes

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MACHISMO
Oswaldo U. Lopes

         No grego o sufixo ismo era usado com os verbos que indicavam movimento. Automobilismo é um bom exemplo, movimento de carros. Na nossa língua os dicionários chegam a registrar “s” opções que utilizam esse sufixo. Encontramos exemplos em movimentos ou pensamentos políticos (getulismo), formas de governo (autoritarismo, parlamentarismo) e mesmo correntes artísticas (cubismo, impressionismo).

        No nosso caso não é difícil perceber que machismo se refere a um comportamento e o habitue desse comportamento é o machista.

        Sempre me esforcei para não ser ou parecer machista, nem sempre com bons resultados. Às vezes fica difícil explicar que não ser machista, não implica em igualdade de gêneros. Creio firmemente que eles não são iguais o que eles têm que ter é muito respeito mutuo e tratamento igual perante a lei. Me arrepia a noticia de que na Rússia aprovaram uma lei que descriminaliza o chamado crime doméstico (99,5% das vezes violência contra a mulher).

        Já fui derrubado, em muitas ocasiões, da minha tola empáfia. Uma memorável vez, foi por uma aluna excepcional que tive e que foi minha orientada de mestrado e doutorado. Eloisa sapecou no meio de uma reunião com outros pós-graduandos:

- Mas o professor (eu) é um pouquinho machista né não?

        Ela era notável por certas observações que denotavam aquela notória sabedoria caipira.

- “Para o homem a mulher tem que molhar a barriga no tanque e secar no fogão”.

        Dela se poderia dizer, como aquela arguta professora na Inglaterra dissera, de minha filha Lúcia então com 8 anos:

- She is a very determined little girl.

        Eloisa era e ainda é.

        Vai dai que perdido em pensamentos em meio à chuva que não tinha fim, sem nem poder tirar o nariz de casa para ir à praia, li um texto, numa revista feminina, de Fernanda D’Umbra. Transcrevo ipsis litteris:

“Comentei que nunca havia lavado roupa de homem”... Era, portanto, alguém totalmente apto a lavar a própria roupa; seria até injusto dizer o contrário “.

        Eu já lavei a minha própria roupa, mas em condições digamos não habituais: viagens ou quando por algum motivo fico sozinho em casa.  No geral alguém (certamente uma mulher) lava a minha roupa. Tai sou um machista que não lava a própria roupa. Confesso que se quiser faze-lo a confusão vai ser grande e não vai dar para explicar que estou querendo simplesmente deixar de ser machista.

        Mas reconheço o argumento de Fernanda e sua crítica avassaladora.

        Só num ponto discordo dela e de sua poderosa argumentação:

“Os homens só não podem fazer duas coisas: gestar e amamentar”.

        Gestar não podem, amamentar depende das circunstâncias. Não falo dos tempos atuais em que o mundo se tornou muito mais tolerante e a diversidade é encarada como natural e respeitável.

        Há no famoso livro Testut de anatomia (são quatro alentados volumes) a descrição que sempre surpreende e chama a atenção, dos jovens calouros das Faculdades de Medicina.

        No inicio do século XX, lá por volta dos mil e novecentos e pouco, numa pequena e distante aldeia francesa uma terrível nevasca bloqueou completamente, um casal de jovens camponeses. A mulher dera a luz uma menina e tornou-se vitima de uma fortíssima febre puerperal que a impedia completamente de amamentar. Desesperado sem saber o que fazer o marido deu o próprio peito para a criança e rapidamente começou a aleitá-la. O caso teve um final feliz: a mulher se recuperou e o bebe graças ao aleitamento paterno sobreviveu e viveram felizes e tiveram outros filhos sem que ele tivesse que amamentar de novo. A literatura médica é prodiga em relatos semelhantes. A glândula mamária no homem pode produzir leite, muitas vezes sem maiores dificuldades, bastando a estimulação dos mamilos.

         Ouso dizer que o camponês não tinha ideia da diversidade sexual de nossos dias nem da tolerância que temos (graças a Deus) para as variações de gênero que ocorrem nestes tempos. Alguém precisava providenciar leite para o recém-nascido e ele o fez.

        Onde quero chegar? Bem, só as mulheres podem gestar e todos nós podemos lavar nossas próprias roupas.

        

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Pelos direitos dos homens

Os homens só não podem fazer 2 coisas: gestar e amamentar. Todo o resto – cuidar de si mesmo, dos filhos, da casa – são seus direitos e devem ser exercidos

Estávamos eu e mais três amigos – todos homens – batendo papo depois de uma oficina de teatro. Armou-se um temporal e eu lamentei que minha roupa no varal iria molhar. Um deles disse que sua mulher também devia estar muito brava porque tinha lavado um monte de camisas dele.
Comentei que nunca havia lavado roupa de homem. (Na época, eu estava no meu primeiro casamento.) Ele achou muito estranho que meu marido lavasse a própria roupa. Respondi que ele era um grande dramaturgo, um escritor brilhante, ator e diretor muito talentoso e, além disso, tinha uma saúde de ferro. Era, portanto, alguém totalmente apto a lavar a própria roupa; seria até injusto dizer o contrário. Meu amigo ficou calado por um tempo. Perguntei se eles queriam mais uma cerveja, fui buscar e a chuva caiu forte.
Tive certa pena desse meu amigo. Na minha ideia de liberdade, não cabia o fato de ele depender de alguém para cuidar da sua roupa. Se a pessoa tem condições físicas e psíquicas para lavar a própria roupa, por que não o faria?
Então comecei a listar mentalmente os muitos direitos que, com o tempo, foram tomados dos homens. Eles não poderiam ser privados, por exemplo, de cuidar da própria alimentação. Cozinhar é tão bom quanto comer, e saber fazer arroz, feijão, bife, macarrão, salada, suco, legumes refogados e o que mais eles quiserem gera independência e poder.
Buscar as crianças na escola também é um direito do qual os homens não poderiam abrir mão – jamais. Eu não tenho filhos, mas busquei meu sobrinho na escola muitas vezes. Nada se compara à carinha deles saindo com aquela mochilinha nas costas. É a coisa mais linda. Sem contar o luxo que é a conversa a caminho de casa. Homens que ainda não exercem esse direito deveriam lutar por isso.
Cuidar dos filhos é um privilégio que as mulheres e os homens precisam dividir de forma igualitária. Outro dia meu atual marido penteava os cabelos da filha dele. Os dois no grau máximo de uma relação de amor e confiança que só se estabelece com as mãos. Afinal, são as mãos que amam. Esse papo de coração é conversa. E amar não é só botar dinheiro em casa e dar exemplo. Isso é muito velho, já era. Os homens podem mais e sabem disso. 
Os homens só não podem fazer duas coisas: gestar e amamentar. Todo o resto – cuidar de si mesmo, dos filhos, da casa, dos pais, do corpo – são seus direitos e devem ser exercidos.
Até mesmo não lavar as próprias roupas é um direito dos homens. Se quiserem usar as roupas sujas, o que podemos fazer? O direito de escolha é deles. Eu estou casada pela segunda vez e nem preciso dizer que continuo não lavando as roupas do meu marido. Ele é forte e não necessita de mim para isso. Até o cuidado com lençóis e toalhas é dividido. E nunca falamos a respeito; não precisa.
Mas uma vez eu recolhi as roupas dele e fiz o jantar. Quando ele chegou, eu estava lendo no sofá. Ele elogiou o cheiro da comida, me beijou e foi para o quarto. Voltou para a sala e disse baixinho ao meu ouvido: “Eu vi a roupa em cima da cama. Obrigado”. Então me deu um beijo bem demorado e o jantar esfriou de tanto esperar.

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