De mães e
filhos
Ises de Almeida Abrahamsohn
As folhas douradas e vermelhas do grande carvalho
projetavam-se na janela da sala. Anne,
ao ver Steven na calçada, abriu a porta. Não o via desde o escritório da
advogada de divórcio. Esquivou-se do abraço, perguntou maquinalmente sobre o
voo e indicou-lhe o escritório para
colocar a mala. Escapou rapidamente para a cozinha.
Durante os vinte e cinco anos que durara o seu casamento sempre tivera a família reunida por ocasião das grandes festas. Quando as crianças cresceram e saíram de casa, ela e o marido ainda tiveram alguns anos juntos. Os filhos nunca deixavam de vir em novembro para o Thanksgiving. Entretanto desde janeiro, estava só. Leah e o marido cruzavam o país para vir até Filadélfia. Ron vinha de Montreal com Marie e as duas crianças.
Anne pensou em como os filhos gostavam de Steven, talvez mais do que dela. Era ela quem organizava a vida das crianças e controlava o uso da internet enquanto ele era o criativo e esfuziante inventor de prodigiosas brincadeiras. Não havia dúvida. Ele tinha sido um ótimo pai, mas péssimo marido!
Tinha a necessidade obsessiva da conquista. Quantos casos, rápidos ou prolongados ela fingira ignorar! Sempre uma desculpa, um mea culpa. Não pedira antes o divórcio por causa das crianças. Para ela, a humilhação foi se transformando em amargura e em raiva, muita raiva. Até que ele, confrontado, admitiu a ligação com uma enfermeira que já durava três anos. Anne refloresceu quando o ex mudou para Chicago. Não mais cruzaria com ele no hospital onde ambos trabalhavam.
Mas em outubro, ao ligar para os filhos para confirmar a reunião no dia de ação de graças, certamente não esperava ouvir os apelos para ser “compreensiva” e convidar o pai! Relutou, mas enfim cedeu às insistências. Ambos morriam de saudades! É o que diziam.
̶ É extraordinário o que os filhos esperam das mães, pensou Anne, ao espetar o peru que assava no forno.
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