O CIRCO
Oswaldo
Romano
Numa
madrugada destas, dormia um sono pesado, quando conseguiram me acordar. Assustei
com barulho de madeiras jogadas da carroceria de um caminhão.
Moro
próximo a um terreno da Prefeitura, futura área de lazer, prometida há mais de
vinte anos. Eu tinha setenta e sete anos quando o Prefeito lançou a pedra
fundamental do parque. Não pude ir porque estava com uma artrite do cão. Meus
netos ali jogam suas peladas.
Acordei
a Maria e disse que acabaria nosso sossego.
—Porque
Artur. O que aconteceu?
—
Um novo circo está chegando.
—Coitados.
Os meninos vão ficar sem jogar bola. Vão acabar com a grama.
—Grama
que eu semeei, a Prefeitura nunca fez nada.
—É
verdade, mas também vão se divertir com o circo.
—O
que?
—Mas
você está mesmo surdo! Não disse nada, nada, tá bom?
Artur
a primeira coisa que fez ao se levantar, abre a janela e procura ver onde
jogaram as madeiras.
—Maria, não consigo ver onde jogaram.
—Foi
sempre assim, Artur. Eles jogam num
canto para não atrapalhar a montagem, disse em voz alta.
Maria
ao se levantar, depois do café, foi logo informando os filhos casados e netos,
da novidade. Quem ficou mais feliz foi o Luiz. Adora circo.
Depois
do almoço, Artur foi para a reunião semanal dos escritores, no Clube Alto dos Pinheiros,
onde se aprimoram na escrita com a monitora Ana Maria Maruggi.
O
escritor é um sonhador, cultiva qualquer fato ou imagem e cria logo um enredo. E
na terceira idade, caso da maioria desse grupo, o esforço de criação é maior
porque é a idade da luta contra o erro, contra o esquecimento, o descuido, a canseira.
Os participantes vão chegando ávidos para
saber, ou contar a novidade da semana. A vez de contar, é disputada. Não raro
conseguindo se encaixar, esquece o que ia dizer.
E
a notícia do circo mexe com o burburinho da cidade. É uma notícia alegre que
rapidamente se espalha.
—Fui
o primeiro a dar o furo da chegada do novo circo. Anunciou Artur. Fiz sucesso, o
circo é sempre esperado. Logo amigos apanharam os celulares. Passavam a
novidade as suas famílias.
Quem
vibrava, eram as crianças que jogavam bola! Souberam na cidade que este ano o
circo seria montado em outro lugar.
Dois
dias depois o Mario encontra o Artur:
—E
ai Artur como vai a montagem do circo.
—Faziam
festa quando erguiam a lona. Se escutava, lá de casa. Gritavam, cantavam,
felizes da vida.
Quem
não está gostando é o Faustino, dono do velho cinema.
Cristina
e Sueli, netas do avô Artur, bem conhecidas na cidade, sentiam-se constrangidas
quando perguntavam pelo circo.
Desde
o dia das madeiras, elas sabiam do entendimento errôneo, da ilusão do avô. Só não
esperavam tanta repercussão.
—Oi
Cristina. Vi a montagem, está bem adiantada! – Ouviu ao cruzar com uma amiga.
O
que fazer agora?
Com o consentimento da avó, ofereceram ao
velho umas férias de descanso. Escolheram a Estância de Águas de São Pedro. Relutou,
mas aceitou.
Foi
o tempo de com o esforço do Faustino, o dono do cinema, desfazerem o que deram
como um boato.
Quando
Artur regressou, perguntou para a Maria:
—Maria?
Cadê o circo?
—Escafedeu-se
—Fez
o que?
—Artur
é o seguinte... pensou, pensou e disse:
Foi
embora. Crise, pouca gente interessada - e falou quase gritando -
O
Faustino do Cinema, sentiu que seria prejudicado e resolveu que
uma
entrada, dava direito à duas pessoas, enquanto ali estivesse o circo. O povo
preferiu aproveitar o cinema. Esqueceram o circo.
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