Das histórias
africanas
O peru do Natal.
Ana Maria Pinto
Era
quase Natal. O clima de festa já chegara ao coração de todos naquela província
africana e as casas já se enfeitavam para comemorar.
Eu
estava atrasada para o trabalho e corria feito barata tonta tentando organizar
em tempo meus papeis para sair, quando entrou em casa o jardineiro Gomes. Como
fazia em todos os Natais ele me trazia um peru vivo que seria servido na ceia. Um
mimo que eu já não sabia conviver sem. O Gomes era um sujeito afeiçoado a
praticar certas gentilezas e já havia incorporado que o peru de Natal seria um
presente seu.
Na
urgência de minha saída passei a incumbência à minha empregada:
—
Prepare o peru, vamos deixa-lo temperado durante a noite para levar ao forno
somente amanhã.
O
meu dia foi um furor, e no final de tarde cheguei estafada. Entrei devagar na
garagem e me assustei com o que vi. Uma ave tinha metade do corpo depenada e
outra metade emplumada. Realmente era algo estranho aquilo. Foi quando notei tratar-se do peru que o jardineiro
trouxera. O pobre animal saltitava alternando os pés no chão emitindo um
grunhido esquisito. Era visível o sofrimento do bicho. Fiquei desolada.
—
Maria, o que é isso, o que aconteceu com o peru?
—
Deu muito trabalho depena-lo, pois não sabia que havia de mata-lo antes.
Era
evidente que a empregada, como todas elas nessa época, não sabia de nada, o que
me fez ter consciência do atraso cultural. Senti que parte era minha culpa,
pois deveria ter explicado o processo todo.
Então,
dei ordem para matar o bichinho o que evitaria mais sofrimento. Naquela noite o
peru permaneceu de molho. Minha culpa era aliviada pelo compromisso com a esperada
comemoração natalina.
Pela
manhã a ave foi ao forno de maneira majestosa. O cheiro exalava ao longe. Até
Gomes foi convidado para a ceia.
Curiosamente,
nunca um peru ficou tão bom!
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