CARTA DE MEU PAI
Carlos
Cedano
A viagem se
afigurava urgente pelas notícias alarmantes que nos chegaram de Santo Ângelo
onde morava meu pai. Pedi para Fred se apresar, não havia tempo a perder e nem para
especular, as notícias do vizinho foram confusas e mais parecia não querer alarmar-nos
o que acentuou minha certeza de algo grave! A suspeita bateu forte no meu
coração!
O percurso
seria longo e difícil, e Fred com vontade e firmeza iniciou a viagem, ele
sempre soube controlar suas emoções e mostrar-se tranquilo, a viagem levaria
horas e ele acelerava com mão firme!
O carro zunia solitário na estrada erma, o relógio
gritava as horas e os pés do piloto apertavam mais o acelerador e não falávamos para não denunciar nossos reais temores.
Arrisquei olhá-lo. O rosto franzido, com
a tensão rompendo pelos olhos fixos no asfalto. Logo ele disse: chegando a
essa pequena colina, lá na frente estaremos a quinze quilômetros da cidade de seu
pai.
Mal Fred
acabou de dizer isso o carro perdeu velocidade, estávamos ficando sem
combustível! O automóvel parou! - na pressa
não consideramos essa providência - e no horizonte não se viam veículos
circulando, nem construções, nem nada! Liguei para casa de meu pai pelo celular,
mas ninguém respondia e nossa angustia aumentou.
Só nos
quedava esperar um milagre, eu rezava e espreitávamos nos dois sentidos da
estrada. Após uma hora de espera vislumbramos lá longe um caminhão e fizemos
sinal de parar o que o chofer fez de imediato; explicamos nosso problema e em
menos de vinte minutos estávamos no nosso destino!
À porta da casa
de meu pai encontramos o médico dele, seu Jonas e o Delegado Manoel. O delegado
me entregou um envelope fechado dirigido a mim que tinha encontrado no criado
mudo, imediatamente fui até quarto e vi o corpo inerte e seu rosto sereno,
sinal de uma morte tranquila sem dor, e
até me pareceu perceber um tênue sorriso. Nesse momento tive a plena convicção de
que morreu feliz!
Após um
choro intenso e contando com o consolo de meu marido Fred, abri o envelope, a
carta era curta e direta e primeiro a li só pra mim!
Quando o
Delegado e o Doutor Jonas vieram, mostraram preocupação devido à morte inesperada
de meu pai. Ambos concordaram em dizer que no caso dele precisavam fazer certas
indagações e eu poderia ajudá-los a esclarecer as circunstancias de sua “partida”.
Entreguei a carta para eles, que a leram com cuidado, se emocionaram com sua
leitura e disseram que respeitariam sua última vontade. Expediram o atestado de
óbito como morte natural durante o sono.
Após três
dias para o enterro e recebimento dos pêsames e após a missa fúnebre voltamos
para casa, desta vez com o tanque bem cheio! Uma hora depois da partida Fred me
perguntou:
— Que dizia seu
pai na sua carta, Marlene?
— Vou ler
pra você, meu amor:
Marlene, minha filha adorada:
Há seis meses partiu sua mãe que foi minha companheira por mais de
sessenta anos. Durante esse tempo fomos muito felizes cada dia e cada instante!
Minha morte inesperada, mas desejada, obedece a minha certeza de que ela está a
minha espera. Não lamentem minha partida, ela faz parte de minha vontade de
estar o mais pronto possível com ela e continuar nossa eterna felicidade!
Para você e para Fred meus carinhos póstumos e que a paz e o amor
estejam sempre com vocês.
Seu Pai
Fernando
A viagem
continuou em silencio e rodeado de uma sensação de bem-estar e felicidade; Marlene
chorava, mas não eram lágrimas de morte, uma nova perspectiva de vida se abria
pra ela e Fred!
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