O PESO DE ADOTAR UMA CRIANÇA - Oswaldo Romano

        

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O PESO DE ADOTAR UMA CRIANÇA

                        Oswaldo Romano
                                                                                                                    Neide, aos trinta e cinco anos é abandonada por Celso, um marido que desde o início ninguém o recomendava. Viera do meio dos moradores de rua.

              O tempo em casa o transformou de novo, no mau caráter que era quando lhe foram fechadas as portas. Depois de constantes brigas, evitando um mal maior, Neide cortando o pouco de útil que oferecia em seu barraco, conseguiu expulsá-lo.

              Tarde demais para arrepender-se. Sua atitude foi um tiro que saiu pela culatra. Neide constatou que estava grávida. Sem o apoio de um companheiro, sua situação caminhava pro fundo do poço. Faltava-lhe tudo. Consolando-se dizia: antes só, que carregando aquele trapo.

               Aos cinco meses, um exame no Sus, o médico a parabenizou. Estava tudo correndo bem, quando o doutor, levantando as mãos, pediu-lhe um abraço e anunciou: gêmeos! A senhora vai ter gêmeos!

              Neide consternada, passando a mão na barriga, sentou-se. Chorou. O médico compartilhando, achando nobre sua atitude, disse-lhe: É justo! É a alegria de ser mãe, duas vezes! Deus te ajude!
              A mulher tentando se acalmar, pensou: foi assim que Deus quis, devo aceitar, não posso contraria-lo.

              Aconteceram no tempo previsto os nascimentos. Ela não tinha a menor possibilidade de criá-los. Nos primeiros dias, só pedindo esmola nos faróis. Expunha um bracinho da criança para ajudá-la.  Era olhada com menosprezo, dos seus olhos lágrimas escorriam a cada moeda recebida. Aparentava drogada. Era olhada como vadia.

              Pedia perdão a Deus. Vendo crianças crescidas disputando esmolas, olhava para seus bebês, se perguntava: cresceriam assim?

              Doá-los! Isso, faria isso mesmo, cortando-lhe o coração.

Não seria muito fácil porque vinha escondendo o bracinho de uma delas que havia nascido sem uma das mãos.

              Anunciando seu desejo pelo bairro, cada crítica maldosa, era um punhal no peito.

              Nos faróis, caminhava para fazer parte da Marcha das Vadias. Para a voz das ruas do seu bairro era uma desnaturada, mal podia sair do seu barraco.

              Chega o primeiro casal interessado. Cuidariam de todo processo. Muito simpáticos, entusiasmados, foram levados para o que ela chamava de berço, para a escolha.

              Os dois calaram-se. Extremamente chocados, o silêncio prevaleceu por uma eternidade!

              E agora?

              Foi tão grande o impacto de ver a deformação de uma delas, nasceu um sentimento de dor e dúvida indescritível. Qualquer manifesto no momento seria infeliz, cheio de pecados e incertezas.

              Neide, disse Julia olhando de passagem para o Horácio: por favor, aguarde nossa volta, até amanhã. É o tempo que precisamos.

              Via-se descrença na mãe.

              — Desculpem. Hoje não tenho com que comprar uma fralda...

              — Opa! Claro, claro.

              Deixaram o casebre, Neide na porta via distanciarem-se, apagava uma esperança.

              — Vocês voltam? Perguntou com voz insegura.

              A pergunta caiu como uma bomba! Julia virando-se, respondeu: fique calma, fique tranquila.

              Com um surrado lenço Neide enxugava as lágrimas.

              No casal, corria em seus pensamentos a mesma pergunta: o que vamos fazer, agora?

              — Em casa,  amor, temos tempo...  

              Jamais se apagaria da consciência o peso de qualquer que fosse a escolha. Uma seria por piedade oculta. Nenhuma, estariam fugindo covardemente de um desejo sagrado. Afinal, uma criança procurada, estava lá.

              Julia, mulher de Horácio, era professora de piano, e sempre pensou ter uma filha virtuose. Não aguentaria ver sua filha, virtuose no piano, e no vazio da sua emoção aparecer em sua frente bracinhos, um sem mão, pedindo proteção! Essa imagem a perseguia.

              Horácio, depois da decisão de adotar uma criança, antecipou-se comprando um lindo triciclo. Era a ansiedade da espera.
                                                                                             
              —  Amor, a que horas vamos lá amanhã?

              — Julia, parece que levei uma tremenda surra. Agora vamos dormir.

              Foi a noite que jamais imaginaram passar.
*****

O que você faria?

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