A
VILA
Jeremias
Moreira
Na noite de segunda feira de carnaval fiquei retido
no trânsito da Rua Teodoro Sampaio por muitas horas. O motivo foi um bloco
carnavalesco que sambava na Praça Benedito Calixto e imediações. Onde me
encontrava, há quatro quadras do evento, uma turba desceu a rua saltando entre
os carros e zoando com seus ocupantes. Por sorte, não passaram de provocações. Certamente
dirigiam-se para o coração da Vila Madalena, onde a folia rolava mais
desenfreada. Ali, no congestionamento, sem nada o que fazer, pus-me a comparar a
Vila Madalena de hoje com a da minha chegada a São Paulo, quando fui morar por
aquelas bandas. A Vila, como é conhecida, era um lugar bucólico, que pouca
diferença tinha com a vida pacata da cidade do interior de onde vim.
Conhecia-se o jornaleiro da esquina e chamava-se pelo nome, o padeiro, o
verdureiro e o amolador de facas. Encontrava-se os amigos para um bom chope no
Bartolo ou curtir as empanadas argentinas no Martin Fierro. Hoje mudou muito. A
boemia tornou-se impessoal. Surgiram novos e sofisticados bares e restaurantes,
que atraem paulistanos de todos os cantos e turistas. Porém, se essa glamorização
fez a Vila famosa e extrapolar fronteiras, provocou um novo fenômeno: ela está
atraindo uma invasão de forasteiros, que se agrupam pelas ruas e que trazem consigo
os produtos a serem consumidos. Com o passar das horas a embriaguês predomina.
O espírito arruaceiro se dissemina e contagia a massa. O respeito alheio e a noção
de cidadania desaparecem. Transformam as ruas e quintais em sanitários. De tão
intensas, as aglomerações tornam as ruas intransitáveis aos veículos. Os bares
e restaurantes perdem seus fregueses e os moradores ficam ilhados e sujeitos a
essa baderna. Conclui que, nesse carnaval, a exemplo dos dias de jogos da Copa
do Mundo, morar na Vila Madalena tornou-se infernal.
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