RODANDO E NAVEGANDO
Oswaldo Romano
Ufa! Chegamos depois de percorrermos 300
quilômetros, quando já noite. Estávamos aturdidos, zonzos. Mas, felizes por estarmos
inteiros, salvos das tantas que passamos. Não foi uma viagem tranquila como
esperado, não!
Envolvemo-nos com diversos acontecimentos,
o mais grave um engavetamento que nos privou dos dois carros em que viajávamos.
Por isso chegamos malhados, mas
aliviados deles termos nos safado.
Agora, respirávamos a maresia,
expelíamos a satisfação de um início de férias. O pensamento era um só: Mar, lancha,
navegar! Mas, como ninguém é de ferro, o corpo pedia cama.
Combinamos sair cedo.
Enquanto tomávamos o café da manhã, os
apressados rodeando-nos botavam pressa.
— Tudo bem. Vamos gente! Protetores
solar, chapéus, sungas e tais, pés de patos, snorkels, máquinas fotográficas. Agasalho,
não pode faltar.
— Oi sogrão! Vamos dormir na lancha?
Indagou Cris.
— Não, filha! Vamos voltar à noitinha,
assim que o sol se pôr.
Deram ao passeio um sugestivo nome:
Vereda Fotográfica. Justificava porque, disputávamos quem tiraria a melhor fotografia.
Vistas panorâmicas, e inesperados motivos, não faltariam. A festa dos golfinhos
seria um deles.
Ávidas, as crianças corriam e pulavam
entre os adultos carregados de tralhas para o embarque na Roma.
Iniciamos navegando pela Costa Verde. Uma
alegria geral contagiava a todos. Passamos pela Praia do Sono, dos Antigos e
Antiguinhos, Ponta Negra, e fizemos pequena parada na Ilha Cairuçú. À vista, cintilava
a respeitada Ponta da Joatinga, local marcado por naufrágios de algumas embarcações
desavisadas. Ali o mar exige o maior respeito. Passamos, e logo contornamos a
Ponta da Cajaíba, entrada para o Saco do Mamanguá. É o celebrado Fiorde Brasileiro. Pouco adentro suas águas alcançaríamos
de novo o mar, local de onde partimos ha mais de hora.
Ancoramos no melhor ponto que encontramos.
Ficamos até o almoço. Em seguida, lentamente navegamos pelo Fiorde, clicando locais
que renderam dezenas de maravilhosas fotos.
À tarde iniciamos nossa volta com
previsão de alcançarmos o pôr do sol nas imediações da Ponta Negra. Desse ponto,
visávamos às montanhas que abrigam nosso condomínio. Soltamos a ancora, mar
aberto, ela comeu uns quarenta metros de corrente.
Um novo espetáculo nascia com o sol se
pondo. Um mar dourado refletia as nuvens
que o cobriam, perdendo-se no horizonte. Como num passe de mágica seus raios,
tão distantes, corriam sobre as águas até nossa lancha. Mais meia hora, ele
sumiria, deixando-nos com certeza absortos, respeitando nosso mundo.
Mas ainda havia resquícios do dia
anterior que espicaçava nossa mente, por mais que tentássemos esquecê-los.
Caía a noite, nos
preparamos para levantar a ancora. Ela subiu muito bem puxada pela corrente.
Acionados os motores Volvos responderam prontamente. O gerador estava
ligado fornecendo as energias necessárias. Ótimo porque era dele que
dependíamos da iluminação, ar, geladeiras e demais equipamentos elétricos.
Acontece que tudo isso dependia do
combustível, o diesel. Seus tanques são respeitados pelos 1.700 litros de
capacidade. Mas, tudo tem um fim. Na atropelada saída de casa, ninguém, nem o Arrais,
fez o obrigatório check list.
Os motores silenciaram antes de partirmos.
Acabou o combustível!
— Gente! Acabou o combustível! Alguém
gritou.
Foi uma correria
desordenada.
— Gente! Calma! Esperem, a pressa é
inimiga da ordem. Calmaaaaa! Temos o bote. Ele vai pedir socorro no continente.
— Valmirrrrr! - chamei o Arrais - Desça
o bote... Leve a lanterna.
— Doutor, gastamos gasosa rodando no
Mamanguá. Ele não vai alcançar o continente. Já pensei nisso!
Soltei um palavrão recebendo mais esse banho
frio. Agarrando-me ao pior, queimando os cartuchos finais disse:
— Está bem, mas se
acontecer isso, levante o motor e siga com o remo. Sei que você pode.
Na alegria da manhã, e na comemoração da
saída, os rádios não foram embarcados. As baterias estavam enfraquecendo. A
lancha rodava ao léu! Pelo jeito, de novo a bruxa rondava.
— Sem desespero... Sem desespero,
escutaram? - Gritei.
— Vou descer a ancora na manivela! - avisou o Arrais.
— Percebi que já carregava o peso da
responsabilidade.
— Cuidado para não cair. Amarre-se! Eu recomendei
pensando no pior. Afinal, ele é prestativo, não podia magoá-lo.
Homem ao mar à
noite, ainda sem alarme, só Deus salva.
Fábio, meu filho, também mestre e que
dirigia a lancha na maior parte do tempo, enlouqueceu. Corria, subia no fly,
descia no cockpit, apavorado. Achei melhor não mexer com ele nesse momento!
— Fogos!! Os fogos gente! Foi bem
lembrado, nem vi por quem.
— Peguem, estão na emergência, rápido. Na
verdade, escondíamos o pânico que estava nos possuindo. Todos procuravam uma
solução. Coube a Cris, envolta no maior medo, lembrar-se do celular. Conseguiu
contato com a Bia, a cunhada, que ficou no condomínio. Bia que já é alvoroçada,
imaginem como ficou! Botou a boca no trombone!
Já dava para respirar! Tivemos contato
com o continente. Sensação de alívio!
Uma lancha que navegava à distancia
percebeu o drama. Era da nossa Marina. Cônscios dos deveres no mar chegaram e
nos rebocaram até o posto de combustível. Reabriria as oito da manhã. Ali ficou
com Deus, e com Deus fomos para casa.
Um filminho de dois dias rodava pelas
nossas cabeças. Mar sempre é aventura. A estrada também! Discutiu-se quem seria
o pé frio.
De manhã duas obrigações
eram urgentes. Reavivar a Roma enchendo seus tanques, e liberar o píer do posto.
E mais importante: Envergonhados, mandar algum champanhe, ao senhor proprietário
da lancha File, a abençoada.
E as fotografias? — Demoramos a nos
lembrar delas. Mas, demos muitas risadas recordando a cara de pânico de cada
um. Que ninguém fotografou.