FIGURAS DE LINGUAGEM - TABELA DE ESTUDO

Tabelinha de consulta rápida: FIGURAS DE LINGUAGEM

FIGURAS DE PALAVRAS
FIGURAS DE PENSAMENTOS
FIGURAS DE CONSTRUÇÃO
Comparação:
Elementos ligados por conectivos comparativos explícitos. Ex.: Correu como um guepardo assustado.
Antítese:
Dois termos que contrastam entre si. Ex.: Ela guarda um coração grande em alma pequena.
Anáfora:
Repetição de uma mesma palavra no início de versos ou frases. Ex.: Ontem foi o último dia que a vi. Ontem jamais esquecerei.
Metáfora:
Comparação implícita entre dois elementos. Ex.: Seu olhar é um céu a me espreitar.
Ironia:
Dizer o contrário do que se pretende para ironiza-lo. Ex.:  A boazinha Dona Maria era  especialista em judiar dos pequenos.
Pleonasmo:
Redundância cuja finalidade é reforçar a mensagem. Ex.: Subi a subida um picar de olhos!
Metonímia:
Uma analogia por sentidos próximos, relativos. A parte pelo todo. Ex.: Os cabelos brancos chegaram cedo = (a velhice).
Apostrofe:
Chamamento enfático a alguém (ou alguma coisa personificada).  Ex.: Senhor, não me abandone!
Elipse:
Omissão de um termo da frase que não foi enunciado anteriormente. Ex.: Na casa, nenhum sinal de vida. (Omissão do verbo haver)
Catacrese:
Quando por falta de um termo específico para designar um conceito, torna-se outro por empréstimo.  Ex.: Quebrei o braço do sofá!
Eufemismo:
União de ideias contraditórias. Ex.: Quanto mais trabalha, mais pobre fica.
Zeugma:
Variedade de elipse; omissão de termo anteriormente expresso. Ex.: O inocente foi preso, o culpado solto.
 Sinestesia:
Mesclar, numa expressão, sensações percebidas por diferentes órgãos do sentido. Ex.:  Era muito áspero o doce de seus olhos.
Hipérbole:
Exagerar uma ideia com finalidade enfática. Ex.:  Estou morrendo de medo!
Assindeto:
Falta de conjunção entre elementos coordenados. Ex.: Estava pálido, gelado, atrapalhado.
 Onomatopeia:
Imitar um som com um fonema ou palavra: Ruídos, gritos etc. Ex.: Ratatatá disparou  a metralhadora fria.
Prosopopeia:
Atribuir a seres inanimados predicativos que são próprios de seres animados. Ex.: O jardim dorme há anos.
Anacoluto:
Deixar um termo solto na frase. Ex.: O mundo, as leis precisam ser mais rígidas.

Por: Ana Maria Maruggi

AMBIGUIDADE - Oswaldo Romano



AMBIGUIDADE
GRANDE PROFESSOR DE MATEMÁTICA

Oswaldo Romano

        Foi-me dado a melhor oportunidade de homenagear um grande amigo. Professor de matemática, o Prof. Joaquim Dias Tatit, conquistava seus alunos da faculdade com muita facilidade. Sua matemática, uma matéria vista com desdém, dada sua complexidade, era transformada em interesse concentrado por toda a classe. Introduzia em suas aulas figuras de linguagem, como ambiguidades, preservando resultados, artifício usado para prender suas atenções.

        Quando o conheci ele era um antigo sócio do AP. Eu não, - morava próximo, mas nem sabia da existência do Clube. Éramos unidos pelo esporte. Dois prédios na Praia das Astúrias, no Guarujá, abrigavam mais que uma dezena de tenistas. Os próprios, eu inclusive, construímos esses prédios.  Quando entrei aqui no AP, Joaquim já não frequentava, mas tinha deixado sua marca como sócio.

        Além de matemático, construía. Como fornecedor de materiais, trocávamos muitas ideias relativas a obras, cálculos, etc.

        Uma das coisas que se orgulhava de citar sobre o AP era o aproveitamento do material quando construíram a sede. Entre outras as sobras de ferro que seriam descartadas, transformadas em arte no revestimento das paredes do anfiteatro, ainda hoje admiradas. Aguardando a próxima partida de tênis, no bate papo para encher o tempo, falávamos de cálculos, construções, números, infinitos metros quadrados.

        Lembrei-me dele porque quando nos foi pedido pela monitora no EscreViver que falássemos sobre ambiguidade e outros recursos de linguagem me veio a mente uma pergunta maldosa que lhe fiz:

        — Professor. Quanto é a metade de dois mais dois?

        — O que você quer dizer. Você brinca comigo né?

        — Então responda, mesmo na brincadeira.

        — Dois, claro.

        — Professor. Não é não! Completando a brincadeira, vou responder: A metade de dois, mais dois são três. - E não querendo inibi-lo expliquei - A metade de dois é um, mais dois, igual a três.

        Provoquei-o, ai ele perguntou:


—  Como é que muda pede café?...

Encontro e Desencontro - José Vicente J. de Camargo

Encontro e Desencontro                  
José Vicente J. de Camargo

Vinha caminhando com certa dificuldade, arrastando uma das pernas, quando sinto no ombro   um tapinha:

− E aí Zé, quanto tempo, como vai essa simpatia?

Virei, olhei, esbocei um sorriso, e, enquanto o tipo me abraçava, remexia a memória a procura de uma pista de onde o conhecia e, lógico, seu nome.

− Vou indo mais ou menos, contestei. Recebi umas “espetadas” nas costas, foi bem dolorido, mas já estou melhor. Recuperando-me aos poucos...

− Não me digas... Mas já estás caminhando, foram muitas?

− Umas quatro ou cinco. Como não vi, não sei ao certo.

− Foi muito dolorido?

 Brincando lhe contesto:

 −Com anestesia teria sido melhor né! É coisa pra cabra macho...

− Puxa! Então você é mais uma dessas vítimas...

− Pois é! Para certas coisas não existe hora, pode passar com qualquer um, um descuido e pronto.

− Mas qual foi o motivo?

− O motivo foi o mais tolo possível... Resolvi passar uns dias no campo com a Mirna, minha esposa. Estava precisando descansar, de um pouco de ar puro, comida caseira, ler bons livros, jogar papo fora. Certa manhã resolvi sair para um passeio com meu cachorro. Entrei por uma trilha no bosque e, ao ouvir um barulho estranho na mata, o cachorro se assusta e corre me puxando com força. Eu, não esperando o tranco, tropeço e caio de quatro. Neste instante sai da mata um...

− Já sei! Um tipo mal encarado que te quer assaltar, você reage, briga e leva umas nas costas!

− Pô! Vira essa boca pra lá, que imaginação mais idiota! Não foi nada disso. Foi um quati que atravessou o caminho.

− Ah! E as espetadas, pensei.

− Pensou errado, isso sim! Com a queda tive uma distensão do nervo ciático e estou fazendo um tratamento de acupuntura.

E rápido completo:

− Tchau! Tenho de ir andando, até a próxima.

Afastando-me sem esperar resposta, concluo:


− Que sujeito mais chato! Deve ter sido algum amigo da onça que me o apresentou. Não vale nem o esforço pra lembrar seu nome.

RODANDO E NAVEGANDO - Oswaldo Romano

Mapa da região de Paraty. Mapa ilustrando as regiões do Saco do Mamanguá e as áreas de proteção ambiental

RODANDO E NAVEGANDO
Oswaldo Romano
                                                  
        Ufa! Chegamos depois de percorrermos 300 quilômetros, quando já noite. Estávamos aturdidos, zonzos. Mas, felizes por estarmos inteiros, salvos das tantas que passamos. Não foi uma viagem tranquila como esperado, não!

        Envolvemo-nos com diversos acontecimentos, o mais grave um engavetamento que nos privou dos dois carros em que viajávamos.

        Por isso chegamos malhados, mas aliviados deles termos nos safado.

        Agora, respirávamos a maresia, expelíamos a satisfação de um início de férias. O pensamento era um só: Mar, lancha, navegar! Mas, como ninguém é de ferro, o corpo pedia cama.

        Combinamos sair cedo.

        Enquanto tomávamos o café da manhã, os apressados rodeando-nos botavam pressa.

        — Tudo bem. Vamos gente! Protetores solar, chapéus, sungas e tais, pés de patos, snorkels, máquinas fotográficas. Agasalho, não pode faltar.

        — Oi sogrão! Vamos dormir na lancha? Indagou Cris.

        — Não, filha! Vamos voltar à noitinha, assim que o sol se pôr.

        Deram ao passeio um sugestivo nome: Vereda Fotográfica. Justificava porque, disputávamos quem tiraria a melhor fotografia. Vistas panorâmicas, e inesperados motivos, não faltariam. A festa dos golfinhos seria um deles.

        Ávidas, as crianças corriam e pulavam entre os adultos carregados de tralhas para o embarque na Roma.

        Iniciamos navegando pela Costa Verde. Uma alegria geral contagiava a todos. Passamos pela Praia do Sono, dos Antigos e Antiguinhos, Ponta Negra, e fizemos pequena parada na Ilha Cairuçú. À vista, cintilava a respeitada Ponta da Joatinga, local marcado por naufrágios de algumas embarcações desavisadas. Ali o mar exige o maior respeito. Passamos, e logo contornamos a Ponta da Cajaíba, entrada para o Saco do Mamanguá. É o celebrado Fiorde Brasileiro. Pouco adentro suas águas alcançaríamos de novo o mar, local de onde partimos ha mais de hora.

        Ancoramos no melhor ponto que encontramos. Ficamos até o almoço. Em seguida, lentamente navegamos pelo Fiorde, clicando locais que renderam dezenas de maravilhosas fotos.

        À tarde iniciamos nossa volta com previsão de alcançarmos o pôr do sol nas imediações da Ponta Negra. Desse ponto, visávamos às montanhas que abrigam nosso condomínio. Soltamos a ancora, mar aberto, ela comeu uns quarenta metros de corrente.

        Um novo espetáculo nascia com o sol se pondo. Um mar dourado refletia  as nuvens que o cobriam, perdendo-se no horizonte. Como num passe de mágica seus raios, tão distantes, corriam sobre as águas até nossa lancha. Mais meia hora, ele sumiria, deixando-nos com certeza absortos, respeitando nosso mundo.

        Mas ainda havia resquícios do dia anterior que espicaçava nossa mente, por mais que tentássemos esquecê-los.

Caía a noite, nos preparamos para levantar a ancora. Ela subiu muito bem puxada pela corrente.

        Acionados os motores Volvos responderam prontamente. O gerador estava ligado fornecendo as energias necessárias. Ótimo porque era dele que dependíamos da iluminação, ar, geladeiras e demais equipamentos elétricos.

        Acontece que tudo isso dependia do combustível, o diesel. Seus tanques são respeitados pelos 1.700 litros de capacidade. Mas, tudo tem um fim. Na atropelada saída de casa, ninguém, nem o Arrais, fez o obrigatório check list.

        Os motores silenciaram antes de partirmos. Acabou o combustível!

        — Gente! Acabou o combustível! Alguém gritou.

Foi uma correria desordenada.

        — Gente! Calma! Esperem, a pressa é inimiga da ordem. Calmaaaaa! Temos o bote. Ele vai pedir socorro no continente.

        — Valmirrrrr! - chamei o Arrais - Desça o bote... Leve a lanterna.

        — Doutor, gastamos gasosa rodando no Mamanguá. Ele não vai alcançar o continente. Já pensei nisso!

        Soltei um palavrão recebendo mais esse banho frio. Agarrando-me ao pior, queimando os cartuchos finais disse:

— Está bem, mas se acontecer isso, levante o motor e siga com o remo. Sei que você pode.

        Na alegria da manhã, e na comemoração da saída, os rádios não foram embarcados. As baterias estavam enfraquecendo. A lancha rodava ao léu! Pelo jeito, de novo a bruxa rondava.

        — Sem desespero... Sem desespero, escutaram? - Gritei.

        — Vou descer a ancora na manivela! -  avisou o Arrais.

        — Percebi que já carregava o peso da responsabilidade.

        — Cuidado para não cair. Amarre-se! Eu recomendei pensando no pior. Afinal, ele é prestativo, não podia magoá-lo.

Homem ao mar à noite, ainda sem alarme, só Deus salva.

        Fábio, meu filho, também mestre e que dirigia a lancha na maior parte do tempo, enlouqueceu. Corria, subia no fly, descia no cockpit, apavorado. Achei melhor não mexer com ele nesse momento!

        — Fogos!! Os fogos gente! Foi bem lembrado, nem vi por quem.

        — Peguem, estão na emergência, rápido. Na verdade, escondíamos o pânico que estava nos possuindo. Todos procuravam uma solução. Coube a Cris, envolta no maior medo, lembrar-se do celular. Conseguiu contato com a Bia, a cunhada, que ficou no condomínio. Bia que já é alvoroçada, imaginem como ficou! Botou a boca no trombone!

        Já dava para respirar! Tivemos contato com o continente. Sensação de alívio!

        Uma lancha que navegava à distancia percebeu o drama. Era da nossa Marina. Cônscios dos deveres no mar chegaram e nos rebocaram até o posto de combustível. Reabriria as oito da manhã. Ali ficou com Deus, e com Deus fomos para casa.

        Um filminho de dois dias rodava pelas nossas cabeças. Mar sempre é aventura. A estrada também! Discutiu-se quem seria o pé frio.

De manhã duas obrigações eram urgentes. Reavivar a Roma enchendo seus tanques, e liberar o píer do posto. E mais importante: Envergonhados, mandar algum champanhe, ao senhor proprietário da lancha File, a abençoada.


        E as fotografias? — Demoramos a nos lembrar delas. Mas, demos muitas risadas recordando a cara de pânico de cada um. Que ninguém fotografou.

O MISTÉRIO DA PUREZA! - Carlos Cedano


O MISTÉRIO DA PUREZA!
Carlos Cedano

O ambiente era de expectativa e mistério! Haveria um dia dedicado a um tema importantíssimo de nossa religião: a Pureza. Todas as salas ouviriam a palavra do padre salesiano “sobre o significado da Pureza, essa bela virtude, na vida de nossos jovens”, no dizer do diretor da escola.

Dois dias antes havia um clima de ansiedade e curiosidade entre os jovens. Os comentários se multiplicavam, mas nem sempre aceitos, alguns não passavam de chutes ou de um “eu acho que.....” Em outros casos, como o do Chayo, as indagações tinham sido feitas em casa:

                — Perguntei pra minha mãe e me respondeu que se tratava de um assunto muito importante para evitar pecados! Dos tenebrosos!

                — Só isso? Retrucou um colega.

                — Sim! Mas quando lhe pedi para ser mais clara ela me respondeu que o padre é quem poderia explicar melhor - concluiu Chayo parafraseando sua mãe.

                —Então! Vamos ter que esperar os dois dias. -  disse outro colega com voz chorosa, tal seu desespero!

A expectativa continuava aumentando junto com a ansiedade, até que um aluno “corajoso”, não se conteve e em alta voz disse:

                — Então, que p....... é essa tal da Pureza?

Todos os meninos olharam pra ele com um profundo olhar de reprovação. Como! Você não sabe? Parecia ser a pergunta que ninguém sabia responder, mas que todos fingiam saber! Precisamos ter paciência! Disse outro jovem, com voz forte e ar de superioridade de quem com certeza, sabia a resposta!

O dia chegou! Os alunos esperavam com ar contrito e em absoluto silêncio. Um padre de rosto sisudo entrou e começo logo sua fala que foi um amontoado de frases apocalípticas e ambíguas. Frases como as seguintes permeavam sua fala:
                — Quem atentar contra a Pureza queimará no fogo eterno do inferno! A Pureza deve ser preservada como uma flor, se ela murchar será a condenação eterna!  Será muito difícil obter o perdão de Deus! Vocês terão que fazer enormes sacrifícios para obtê-lo!

Quando acabaram as palestras os jovens se reuniram no pátio num silencio cuidadoso e cheio de suspeitas, à procura dos “condenados”. Aos poucos vieram as perguntas: Você entendeu a fala do padre? A resposta maioritária foi sim! Outros diziam que tinha sido uma palestra muito clara! Ninguém ousou discordar!

Subitamente passou correndo Pedro, o aluno metido a galã, tendo Marcelo no seu encalço com o rosto cheio de raiva.

Que será que aconteceu perguntaram, enquanto ao longe se ouvia-se Pedro gritar: Desculpa, desculpa! Não sabia que era um pecado que ofende a Deus!

—Eu sei. -  disse Chayo - Estávamos num grupo pedindo a Marcelo que nos dissesse, em bom português, o que significava a Pureza. Ele nos respondeu curto e grosso:  A Pureza é a virtude que se perde no momento que se comete um pecado muito grave! Que ofende a Deus!

Aí vieram as perguntas:

                — Roubar um pirulito o um doce nos faz perder a Pureza? Desobedecer nossos pais, chutar um colega, xingar alguém? A todas essas perguntas Marcelo respondeu com um sonoro não! Precisa ser algo muito, muito grave!

Foi a vez de Pedro perguntar:

                — Beijar ou morder o pescoço da namorada é pecado que ofende Deus?

— Como? Você fez isso com minha irmã de onze anos seu desgraçado? E avançou sobre Pedro que botou sebo nas canelas.

Eis aí -  disse Chayo, com sorriso malicioso: Pedro agora entendeu que a Pureza é algo que perdemos no momento que a desvendamos!
               


OS DOCINHOS - Jeremias Moreira


OS DOCINHOS
Jeremias Moreira

São amigas. Fazem uma dupla. São alegres, divertidas, chamam atenção. Batem papo, andam juntas. São primas. Uma é morena, a outra loira. A morena, de cabelos longos, é expansiva, faz acenos largos, fala alto e gesticula.  Demonstra que se impõe à outra. A loira parece não ligar. Seu cabelo é curto, é mais baixa e mais gordinha, mas de igual beleza. Simplesmente é mais contida. Necessita de menos espaço. Elas surgem da ala lateral e entram no corredor onde Jairo as espera. Caminham juntas, com suas calças justas, blusinhas decotadas, barriguinhas de fora e suas jaquetas finas. A da morena, vermelha e a da loira, azul.  Passam pelas vitrines, olham e se manifestam. Elas, não apenas andam, mas fazem gestos, rodopios, corridinhas. Avistam Jairo e acenam. Dali a instantes curtirão, juntos, momentos prazerosos. Ele as ama igualmente. Não se importam. Ambas sabem que são seus docinhos. Correm ao seu encontro. Ele se levanta e as abraça ao mesmo tempo. Depois, de mãos dadas se encaminham para o cinema. Vão assistir ao filme “O meu malvado favorito”. Em meio à caminhada elas pedem, quase em coro: 


— Vovô, podemos comprar pipoca?

MINHA PRIMEIRA FLOR! - Carlos Cedano


MINHA PRIMEIRA FLOR!
Carlos Cedano

Passou por minha cabeça a fantasia que aquela linda criatura poderia ser minha amiga! Com certeza, a mesma fantasia  estaria presente em todos esses caras vindos de todos os cantos do mundo.

Essa improbabilidade não me impediu de sonha-la e admira-la. Como era bonita! Parecia uma donzela medieval que se encaixava perfeitamente no local de nossa faculdade, um prédio do século XV. Guardei essa tênue esperança bem dentro de mim!

Dias mais tarde ela, finalmente, respondeu meu “bom dia” com um leve sorriso.

Sabia que seu nome era Marike, mas quem não sabia! De certo ela não sabia o meu. Ledo engano! Um dia no restaurante universitário estava com minha bandeja procurando um lugar quando a vi. Ela me olhou com naturalidade e disse: Marcos, você não quer sentar comigo? A cadeira a minha frente está livre. Minhas pernas tremeram, porem me refiz de imediato:  

                — Quero sim Marike! - Ajeitei a bandeja na mesa -  Vejo que na faculdade as pessoas sabem rapidamente o nome dos colegas.

                — No meu caso não foi bem assim – respondeu - eu tive que perguntar o seu nome a várias pessoas. Foi uma moça chilena que me disse.

Percebi sua desenvoltura e espontaneidade perguntando sobre mim, minha família e sobre meu país. De seu lado soube que era filha única, nasceu e mora em Bruges, e toca violoncelo. Após essa breve conversa ficamos de nos ver outras vezes.

De fato isso aconteceu. E aos poucos ficamos muito amigos. Numa das conversas ela indagou sobre meus hobbies e falei que eram futebol e leitura. Perguntou-me se gostava de música clássica e respondi que gostava, mas que minha formação nessa área era precária.

Um dia Marike estava na porta da faculdade, quando me viu, veio em minha direção:

                — Marcos, você não gostaria estudar comigo no meu apartamento? Eu costumo  escutar música enquanto o faço. Acho que você também gostará.

Marike tinha a virtude de sempre me surpreender, e aceitei logo seu convite. Foi ela que, com paciência e carinho, me iniciou nas delicias da música clássica.

Meses depois eu ainda não estava bem certo do que ela realmente sentia por mim. Era só amizade ou, talvez, a falta de um gesto ou palavra minha mais ousada a impedia de mostrar algo mais que amizade.......Eu temia arriscar!

Precisava de um modo diferente de dizer a ela quanto a amava! Precisava de uma linguagem diferente! Mais sutil.

Após a publicação dos resultados dos exames nosso Centro de Estudantes Estrangeiros realizava o tradicional baile de despedida. Convidei-a pra a festa e ela aceitou.

Chegou o dia! Passaria pelo seu departamento e iriamos caminhando até o clube do Centro que ficava de sua casa. Quando abriu a porta ela estava cativante e com um sorriso luminoso!

— Marike! Gostaria de vê-la com  este pingente que me chegou de meu país. Posso coloca-lo para você?

Era uma pequena e bela joia com esmeralda que a encantou e emocionou. Ela agradeceu com um misto de alegria e lágrimas.

— Marcos espera um minuto querido, eu também tenho um presente pra você! Quando voltou trazia uma rosa vermelha na mão e a entregou-me dizendo:

                — Ela te diz alguma coisa, meu amor?

Abraçaram-se, olharam-se e se beijaram. E, de mãos dadas, caminharam lentamente até o lugar da festa!


A CASA DAS MULHERES - Jeremias Moreira




A CASA DAS MULHERES
Jeremias Moreira

Salete era nova na casa. Na verdade, um casarão que ficava numa chácara na periferia e era muito conhecido na cidade. Viera de Barretos. Resolvera entrar para aquela vida e tinha que ir para outra cidade para não constranger os pais, que eram evangélicos. Mas, sentia muitas saudades da família.

A casa era administrada com mão de ferro por Isabel. Certo dia, quando estendia roupa no varal, Salete viu Duda chegar Salete viu Duda chegar entregando compras do supermercado. O rapaz era boa pinta e impressionou a garota. Ela nunca tinha visto um moço tão bonito! Por seu lado, Duda tinha muita curiosidade para saber como as coisas rolavam naquela casa. Rigorosa, Isabel atendia pessoalmente seus fornecedores e não deixava que passassem do portão. E, tinha que ser assim, pois ali só moravam mulheres. Entre uma roupa e outra, que estendia, Salete mirava o rapaz. Ele a olhava de volta. Isabel percebeu a troca de olhares dos jovens e ordenou que Salete entrasse. Ao chegar à porta Salete virou-se e Duda sinalizou para que ela o encontrasse no outro lado da chácara, onde havia um bosque de eucaliptos. Ela assentiu e se dirigiu para lá. Entrega feita, Duda subiu na moto e rumou, a toda, ao encontro da garota. Também gostara dela e ansiava por encontra-la. Ao chegar, usou a moto como escada para saltar o muro. Salete estava a poucos metros dali, o avistou e foi ao seu encontro. Estavam tímidos. Ele se apresentou e perguntou o nome dela e em seguida se tinha certeza de que era essa vida que ela queria para si. Ela disse não ter certeza, mas não tinha muita alternativa. Seus pais eram bastante rigorosos e ela viera para aquele lugar como um escape do jugo paterno. Ele estendeu as mãos e tomou as delas. Ela recuou a princípio e depois deixou.  Neste instante ouviram uma tossida. Ambos olharam na direção do som e se depararam com o padre Benedito, o capelão do convento. Ele costumava fazer suas preces diárias no bosque dos eucaliptos.  Passou um sermão nos dois e fez Duda saltar o muro de volta. À Salete, disse que por ora não contaria nada à irmã Isabel, mas ela que pensasse muito bem, pois se não tivesse certeza absoluta de que se entregava totalmente a Deus, ali não era seu lugar.

Portunhol - José Vicente J. de Camargo



Portunhol      
José Vicente J. de Camargo                        

Aluguei uma casa para esperar minha noiva argentina que vinha a São Paulo para o casório.

 O proprietário me ofereceu para comprar o mobiliário do quarto de dormir. Como o achei de bom gosto e em boas condições, o adquiri.

Dias depois, ao mostrar o novo lar à pretendente, me indago ao entrar no dormitório:

− Estão faltando os dois criados-mudos...

Mostrando surpresa, ela me pergunta:

− Para que queremos dois criados-mudos? Como eles são?

− Baixinhos e negros combinando com a mobília – completo.

−Nem pense em reclamar com o proprietário, não preciso de criados mudos! – Retruca.

− Mas no Brasil se usa. Novo país, novos costumes... - Respondo

− Esses brasileiros pensam que ainda vivem no tempo colonial, dos escravos e mudos, deve ser para não comentarem as intimidades do casal... ranzinza ela.

− Mas o que você está falando?  - Indago  curioso. Servem para apoiar rádio, relógio, livros e até a dentadura no copo d’água...

− Ah! Você quer dizer “mesitas de luz”? - sorri ela

− Lógico! O que você estava pensando...

− Me imaginava dois nanicos pretinhos e mudos com turbante na cabeça nos abanando...

Gargalhando lhe abraço:


− Deixa pra lá! Vamos ter muito portunhol pela frente... O melhor agora é experimentarmos o colchão...