O OLHAR DO MEU PAI
Oswaldo Romano
O
olhar do meu pai é lembrado com melancolia. Começa assim? Quando tinha uns cinco
anos, a noite ocupava o quarto da irmã Zilda com poucos anos mais que eu.
Deitávamos cedo, logo depois que a mãe
nos dava aquele chá fervido com folhas colhidas no quintal, junto a horta. Eu
preferia o chá das folhas da laranjeira, mas podia-se escolher a do abacate ou
do limão. Cidreira, camomila, erva doce eu dispensava: eram plantas baixas e
nosso cachorro zanzava entre elas. De televisão não se
conhecia nem o nome.
Meu pai, que tinha o único carro de
praça da cidade, fazia ponto no bar do Ernesto. Estacionava e jogava pôquer até
as 9 da noite. Não tenho notícia de que tenha feito alguma corrida partindo
dali. Mas o ponto era indispensável.
Nós aguardávamos sua chegada, já
deitados. Quando ouvíamos o ronco do Ford, pulávamos da cama, e pela fresta da veneziana,
assistíamos sua entrada na garagem que ficava ao lado.
Súbito abria a porta do quarto. Disfarçávamos
estar quase dormindo. Na verdade, , havia uma inquietação. Vinha já com a mão no bolso do
paletó, mexendo nas balas que jogaria, ora numa cama ora na outra.
Alto, cabelos loiros, levemente
ondulados, olhos azuis, não usava óculos. Nos vendo demonstrava uma desusada
alegria, comedida, satisfação repetida todos os dias.
Seus olhos refletiam um azul topázio do
melhor feldspato, diante da felicidade estampada de rever os filhos. Semicerrados,
com a expressão do sorriso contido, refletia entre os cílios um iridescente
brilho.
O olhar do meu pai, lembra as balas... é
doce.
Que lindo...pena que acabou logo, estava pronta pra ler mais...
ResponderExcluir