O pião-Oswaldo Romano



O PIÃO
Oswaldo Romano



        Aproveitei minha infância até os catorze anos. Na mais pura verdade, quase não tive infância. Afinal, tive ou não tive! Explico: sabe por quê Foi muito diversificada essa época. Eu mesmo me coloquei os freios. Uma divertida reprimenda. Entre outras coisas eu fabricava maquininhas de madeira para empinar e recolher papagaios, fazia alçapão de taquara, carrinho de rolamento. Para vendê-los, era necessário demonstrações, exibindo-os à molecada. No interior, bambu “era mato” e rolamentos eram os descartados do Ford do pai. Estes serviam também como eixo da roleta. Como moedas aceitava caixas de fósforos e funcionava na garage do pai quando chovia, minha indispensável oficina.

        Quando o Professor Américo veio morar próximo de casa, onde alugou um quarto da família do Seu Zé marceneiro, já estava juntado com a professora Violeta, a mais bonita do nosso Grupo Escolar. Olhada até pelos pirralhos da minha idade. Nas suas horas de lazer esportivo, ficava observando nossas disputas. Sim, disputávamos quem derrubaria o quadrado do outro. Ele me chamou, quis ver a maquininha.

        — Parabéns, disse. Só que seus quadrados são muito pesados. Faço um para você ver a diferença. Você quer?

        — Claro, acompanho, quero aprender.

        — Traga as varetas, cola, papel de seda manteiga e linha Corrente.

        — O homem sabia! Foi fantástico! Eram leves, cheios de graça, muito delicados. Com rabo e brincos, ou sem, foi rápido o aprendizado. Aumentaram  minhas vendas, e como! Tanto que deixei de vender os piões, eles foram meu carro chefe, mas não podia fabricá-los. Eu não tinha o torno. Por vezes fornecia a madeira trazida do sítio e própria como, Ipê, Sucupira, Cumarú, Páu-D’alho para o torneiro o velho Cosme, não bastasse, reclamava doces. O torno era coisa de gente grande. Criança queria era estilingue, pneu p’ra rolar, arco p’ra rodar e lago para nadar. Nunca esqueci o segredo da jogada do pião, ele está no trato do barbante, e o aprendizado só aparece depois de levar muitas na canela e o barbante encerado firmar-se ao monta-lo...

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