Intransigência - Maria Verônica Azevedo


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Intransigência
Maria Verônica Azevedo

        Lourdes, a professora de história, chegava pontualmente para a aula, colocava os livros e a bolsa sobre a mesa e começava a falar, depois de um bom dia seco para a turma, com um olhar perdido.

        Parecia que não se dava conta da presença de cada um dos alunos.

        Ela não usava a lousa e nem distribuía textos ou resumos. Falava o tempo todo sobre o tema escolhido com um entusiasmo que pensava ser contagiante.

        Seu discurso não deixava nenhuma janela para perguntas.

        Parecia que ela não queria mesmo ser interrompida com perguntas ou palpites. Os alunos foram paulatinamente perdendo o interesse e a maioria permanecia alheia ao que a professora dizia.

        Lourdes falava e ia se entusiasmando emendando o tema com exemplos e relatos de fatos. Ela achava que assim ajudaria a compreensão para os alunos.

        Tinha dias em que ela resolvia contar um filme de época que tinha assistido considerando-o um tesouro para ilustrar um fato histórico. Nesse dia ela se perdia nos detalhes da trama esquecendo que a aula era de história, muitas vezes vestindo a personagem do filme.


        Para alguns alunos as aulas eram tesouros que os faziam viajar no tempo, mas para outros eram enfadonhas e davam sono.

        Valéria, aluna que era uma leitora insaciável, prestava muita atenção no discurso de Lourdes, pois histórias eram para ela janelas para compreender o mundo a sua volta. Ela lia tudo que chegava às suas mãos e, em casa, vasculhava a biblioteca de seu pai. Ele, também um leitor assíduo, estava o tempo todo sugerindo novos livros para a filha.

        Um dia em que Lourdes discorria sobre movimentos políticos fez afirmações que Valéria estranhou.

        A menina interrompeu a professora dizendo que não concordava tentando argumentar...

        Não conseguiu concluir sua argumentação, pois Lourdes a interrompeu indignada.

        A professora falava alto e a aluna não desistia.

        Aos gritos, Lourdes a fez calar a boca. Como se atrevia a contestá-la?

        A professora parecia entregue à histeria e saiu da sala deixando a classe  em polvorosa.

        Nas aulas seguintes, Lourdes passou a ignorar a presença de Valéria. Não lhe dirigia a palavra.

        As aulas passaram a acontecer sob uma nuvem de insegurança da professora que parecia estar num beco sem saída,  e dos alunos que não encontravam uma brecha para se manifestar.

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