Ciúme,
monstro da sociedade
Fernando Braga
Raul e Marcio guardavam
uma boa e sincera amizade desde os tempos do colegial. Aos 18 anos, ambos
entraram na mesma faculdade e a convivência permanente fez deles uma dupla
inseparável. Aos poucos outros colegas se juntaram a eles, formando uma
panelinha, que jogavam juntos o futebol, estudavam por ocasião das provas, saiam
os fins de semana para tomar chopes no Brahma, festinhas, viagens a Santos, idas
ao Pacaembu. Faziam curso de inglês para aprimorar seus conhecimentos e ainda
jogavam pôquer. Eram inseparáveis, mas a dupla Raul e Marcio, comandava.
Já no término da
faculdade, praticamente todos tinham suas namoradas, Raul com Célia e Marcio
com Gisela, ambas muito prendadas e gatas. A namorada de Raul era muito
inteligente, mais desenvolta nos relacionamentos e ainda de família rica. Saiam
sempre para jantar, irem aos cinemas, teatros, bailes e os quatro tornaram-se
inseparáveis.
Raul e Célia, da turma, foram
os primeiros a se casar, com uma festança inesquecível, onde todos aproveitaram
o máximo. Ela tinha dinheiro! Foram morar em um belo apartamento nos Jardins e,
frequentemente, adoravam reunir os amigos. Marcio e Gisela, logo ficaram
noivos, programando o casamento para o início do ano próximo.
Raul observou aos poucos, que
Celia sentia enorme satisfação em convidar dentre todos, o Mario e Gisela, mas
também notou que quando conversava com Marcio, se tornava por demais risonha, liberada,
tocando-o no braço, dando-lhe tapinhas e quando o abraçava na saída para se despedirem,
grudava-se um pouco mais.
Raul começou a ficar
cabreiro, desconfiado, ciumento de seu amigo favorito.
Certo dia, os quatro
resolveram jogar Tranca e Célia ficou do lado esquerdo de Marcio, em uma
pequena mesa redonda. A certa altura Raul pediu uns minutos para ir ao banheiro
e quando estava voltando, através de um grande espelho da sala, viu que sua
esposa estava sem a sandália e roçava seu lindo pezinho na perna de Marcio e
este por sua vez parecia muito irrequieto. Gisela estava na maior tranquilidade,
mas muito quieta, percebendo certa
jogada dos dois. Raul nada falou com Célia, mas começou a se remoer por dentro.
Queria saber até que ponto eles iriam chegar. Não tinha coragem de tocar no
assunto, mas tinha a certeza de que Celia estava afim de seu amigo do peito.
O ciúme começou
envolve-lo, a comê-lo por dentro, a devorá-lo. Aquele monstro da sociedade,
ladrão da felicidade.
Recebeu o convite de
casamento de Marcio e ao mesmo tempo, para que fossem seus padrinhos, o que foi
aceito de imediato por Celinha, como passou a ser chamada. Ela se encarregou da
incumbência de comprar o presente!
Nestas alturas, Raul quis
resolver o caso e para tal, ao invés de ir trabalhar por uns dias, parava seu
carro a meio quarteirão de seu apartamento e ficava de olho quando sua mulher
saía. Ia a certa distância atrás, tudo fazendo para não perdê-la de vista. Duas
vezes ela entrou em shopping, outra para fazer compra no Empório Sta Luzia, mas
na quinta feira, logo pela manhã ela saiu após ele, que continuava de tocaia,
seguiu-a e viu que parou em uma rua menos movimentada. Marcio já a esperava em
seu bem conhecido Corolla. Célia desceu, entrou no carro de Marcio e após 20
minutos davam entrada no Motel Momentos de Prazer.
Nesta altura, Raul pensava
em fazer uma loucura, castigar a ambos. Entrar no motel e matá-los seria uma
solução para sua cabeça, no momento desvairada, mas estava sem sua arma. Ardia
em febre pela enorme traição de sua esposa e de seu melhor amigo, mas conseguiu
colocar panos quentes e resolveu agir de outra maneira, com impacto, que não
precisasse ir preso. Então, planejou...
Marcio, gostava de sua
noiva e considerava Celinha apenas um caso a mais, embora esposa de seu melhor
amigo. Ele pensava:
-Mas...e daí...quem pode mais, chora menos ...C´est la vie! mon ami!
Na cerimônia de casamento,
a igreja NS do Brasil estava lotada, mulheres com vestidos longos, cheios de
paetês, os homens todos engravatados. A chegada da noiva, com seu pai, ao som
da orquestra de Bacarelli, tocando o Nesum Dorma, de Turandot, com muitos
profissionais fotografando e filmando, registrando o comovente evento. O noivo
recebeu a noiva das mãos de seu pai, beijando-a suavemente na face. Posicionaram-se
para ouvir a preleção do padre, que logo após fez a pergunta a Marcio:- É de
sua livre e espontânea vontade...
Neste exato momento, Raul adiantou-se
e interpelou em voz alta:
- Pera aí, este casamento não deve ser realizado. Este
moço é um grande safado e mesmo antes de casar, já está prevaricando e com
quem? Com aquela ali, apontando para sua esposa, também
muito, muito safada. Peguei os dois se beijando e entrando em um motel e tenho
as fotografias aqui comigo. Retirou uma penca de fotos 15X10 e atirou-as ao ar.
Neste momento deixou a
igreja, ficando todos, todos mesmo, sem exceção, em silêncio e com a boca
aberta, inclusive o padre, que precisou sentar-se e começou a fazer um sinal da
cruz atrás do outro.
A grande festa foi
cancelada!
Aquilo, realmente, foi
pior do que se Raul tivesse cometido o mais comum desatino: um crime com morte!
Nenhum comentário:
Postar um comentário