O CIRCO - Jeremias Moreira

O CIRCO
Jeremias Moreira

A garotada do bairro ocupou as abandonadas quadras do antigo clube de tênis e transformou num campinho de futebol. Estavam numa pelada animada quando o Telê chegou esbaforido:

- O circo chegou! O circo chegou!

A cinco quarteirões mais abaixo, num descampado, onde o rio Canoinhas forma uma pequena cachoeira, se instalam os circos e os parques de diversão que passam pela cidade. É costume a garotada ajudar na instalação e assim ganhar ingressos para os espetáculos. Alguns até conseguem uma boquinha como vendedor de pipoca ou maçã do amor durante as apresentações. Por isso, o anúncio do Telê pôs fim ao jogo de bola. Todos correram para lá. Viram surpresos que o Circo do Palpitoso estava de volta. O Palpitoso é um palhaço muito engraçado e esteve na cidade, com seu circo, há cerca de um ano. O Pança lembrou que foi num espetáculo com sua avó Zulmira e que ela quase morreu de rir das palhaçadas do Palpitoso.  Num dos skets ele entrou no picadeiro vestido de bebê. Usava uma fralda de bolinhas, presa por um enorme alfinete vermelho, uma chupetona na boca e arrastava um pinico gigante. No meio do picadeiro, sentou-se no pinico, que quase o engoliu, depois se levantou, correu em direção ã sua avó e jogou o conteúdo bem em cima dela. Ela levou um tremendo susto, mas recebeu com alegria uma chuva de confetes.  Dona Zulmira riu tanto que até saíram lagrimas dos seus olhos.

Quem também apareceu à procura de um trabalho extra na banda, foi seu Xexéu. Ele toca sax e já é figurinha fácil na casa. Sempre integra as bandas dos circos que passam por Ribeirãozinho.

De quem os meninos gostam mesmo é da Sarita, filha do Palpitoso. Ela é ambivalente. Exibe-se no trapézio, faz acrobacias sobre um cavalo e canta. Quando ela aparece montando Castelo, seu cavalo alazão,  faz misérias pelo picadeiro. É tão perfeita a sincronia entre ela e o cavalo que é como se fossem um só corpo. Com exceção de quando canta, ela usa um biquíni franjado que deixa aparecer seu corpo bem delineado e leva a molecada à loucura. Uma coisa que intriga os meninos é que em cada numero ela aparece com o cabelo de uma cor. Uma hora é vermelho, na outra é azul, depois amarelo. Quando na verdade ela é morena e de cabelo bem preto.

No meio do corre-corre da montagem do circo, os meninos avistaram Sarita entrar no seu trailer. Apostaram quem teria coragem de ir falar com ela. Desinibido, Cadu se ofereceu e foi. À distância, os outros viram Cadu bater na porta, Sarita aparecer, ele falar alguma coisa e ela aceder. Em seguida, Cadu virou-se para a turma, deu uma piscadela sacana e entrou atrás atrás dela. Dentro do trailer, enquanto Sarita autografava sua foto, ele viu diversas cabeças de plástico, cada uma com o cabelo de uma cor. Eram as perucas coloridas que Sarita usava e que eles, meninos do interior, ignoravam existir.


Cadu voltou com a foto de Sarita autografada e azucrinou os amigos. Com ar malicioso, fez mistério do que aconteceu dentro do trailer.

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