DESCULPE
Dulce Azevedo
Dedicada, atenciosa, amorosa. Com esses adjetivos
posso descrever Maria Isabel, professora experiente que nasceu com o Dom do
ensinamento usando-o com muita habilidade e astucia. Religiosa dedicada,
gostava muito de ajudar os carentes. Ministrava seu tempo livre entre o
catecismo e o crochê. Gostava do que fazia. Como não tinha filhos seu tempo era
todo ocupado deixando de lado sua saúde. Uma dorzinha insistente e incômoda no abdome
foi se intensificando de maneira muito rápida tornando sua rotina impraticável.
Cansada de se automedicar procurou um clínico geral para diagnosticá-la. Durante
a consulta o médico notou que ela, apesar de transpirar muito tinha uns
calafrios, e tentou acalma-la em vão. Sua temperatura estava muito alta e a
pressão não parava de subir. Resolveu medicá-la ali mesmo vendo o total
desconforto com a situação que a paciente apresentava, novamente quis acalmá-la.
Acompanhando a aflição da paciente verificou que seus olhos começaram a perder
o foco e logo desmaiou. Decidiu interná-la, apesar da resistência
imediatamente. O quadro que até então parecia fácil transformou-se num curto
espaço de tempo em seríssimo, pois a paciente estava entrando em coma. O médico
resolveu convocar a família para que ficassem a par da difícil situação, pois
geralmente pacientes neste estado clínico eram acometidos de infecção.
Foi o que aconteceu. De repente Maria Isabel
não reagia mais e entrou em coma deixando os seus familiares desesperados
principalmente Rita, sobrinha extremamente afetuosa e confidente. Transtornada
com o ocorrido sentiu-se desamparada ao pressentir que teria dificuldade em
resolver seus problemas sem a opinião da
tia. Rezava fervorosamente para sua
melhora. Rosa acreditava em milagres e visitava a tia todos os dias. Desta
maneira acompanharia a evolução da enferma de perto. Foi durante uma dessas
visitas que Maria Isabel voltou à si e soube que correu um grande risco de
vida. A sobrinha aliviada começou a pôr toda a conversa em dia, contou que
tinha conhecido um rapaz que lhe despertara grande interesse e necessitava das
dicas da tia para levar essa relação em diante. Ficava impressionada com a
facilidade dela para resolver aqueles conflitos amorosos. Falou tanto que a tia
pediu que agora ela gostaria de revelar seu segredo e esperava que ele fosse guardado
e compreendido com amor e compreensão. Debilitada compartilhou com Rosa seu
angustiante segredo guardado durante anos e com certeza era a causa do pavor
que tinha em relação aos médicos. Confidenciou:
— Rita, sou seu tio!
A jovem, coitada, tomou um susto tão grande
que perdeu a voz. Atordoada com a revelação não sabia como se reportar ao tio
ou a tia. Recordou todos os conselhos acertados que lhe foram dados e concluiu
que só um homem realmente saberia definir tão bem as reações de outro homem. Transexual,
como uma mulher pode ser tão feminina num corpo de homem! - pensou. Tomou fôlego e tranquilizou a tia
dizendo que aquela revelação jamais sairia daquele quarto que ela se
preocupasse apenas com a sua saúde para que as duas retomassem a suas rotinas
normalmente porque elas eram "as eternas confidentes". Com essa
declaração de amor e carinho Maria Isabel, serena, prontificou-se a cuidar melhor
da sua saúde para que elo nunca fosse rompido.
Nenhum comentário:
Postar um comentário