O
HEROI ESQUECIDO
Jeremias
Moreira
Ele
era esquálido e alquebrado. Caminhava com passos curtos e pesados como se
acorrentado a grilhões. Estivera entre os pracinhas que participaram da
incursão brasileira na Itália, durante a Segunda Guerra. Acolhido pela família da
qual a mãe fora cozinheira, ocupou o mesmo quartinho dos fundos onde morara com
ela desde seu nascimento. . Ela morrera na sua ausência e ele nunca conhecera o
pai. Era um rapaz ativo antes do alistamento, mas agora se encontrava completamente
fora de prumo, emocional e físico. Fora diagnosticado com neurose de guerra. Mantinha-se recluso, seus assuntos eram
desconexos e perdera a vivacidade. Às vezes saia, caminhava a esmo. Envelhecera precocemente e pôs-se a falar
sozinho. Foi o bastante para ser notado pela molecada do bairro, que cada vez
que o via, corria atrás e o infernizava:
−
Felix morreu na guerra! Felix morreu na guerra!
Ele
entrava em parafuso. Endoidava e punha-se a gritar de volta:
−
Morreu nada! Morreu nada!
Era
um grito lamentoso. Catava o que estivesse próximo e atirava nas crianças, que
desviavam às gargalhadas. Esse tormento continuava até que, eventualmente,
algum adulto se interpunha e repreendia a garotada.
Certo
dia Osmar ouviu uma conversa de seu pai, com alguns amigos, sobre o desempenho
da FEB em território italiano. Felix foi citado como um dos heróis daquela
expedição. Ele tivera um papel destacado no resgate de um pelotão aprisionado
pelos alemães. Recebeu medalha de Honra ao Mérito, por isso.
Por
ser mais velho, Osmar exercia certa liderança sobre os demais meninos da rua. O
que ouviu na roda de adultos o fez refletir sobre a forma como tratavam uma pessoa que expôs sua vida em
defesa da liberdade. Deu-se conta da injustiça que cometiam. Desse dia em
diante não permitiria mais as provocações.
A
decisão de Osmar chegou tarde. Felix morreu naquela semana.
Foi
sepultado no túmulo em que estava a mãe, no Cemitério Municipal.
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