NEM SÃO VITO SALVA
José
Vicente J. de Camargo
No
Brás, tradicional bairro de imigrantes italianos no coração de SP, um dos dias
mais importantes do ano, era o 15 de junho, dia de São Vito, seu protetor. Não
só pela missa solene matutina na imponente igreja e pela quermesse que
finalizava os festejos, mas principalmente pela procissão da tarde pelas ruas mais
movimentadas do bairro.
Para
esta, o povo chegava cedo, munidos de cadeiras, banquinhos e a sacola de lanche
com tradicionais quitutes da pátria mãe, pois sabiam que a tarde seria longa. A
maioria não estava ali só para reverenciar o santo, expressar sua fé, agradecer
pelas graças recebidas, mas para dar vazão à curiosidade que já vinha crescendo
há dias, nos comentários familiares, com a vizinhança, no trabalho, inclusive
com apostas: Qual das senhoras iria se sobressair mais, exibir as mais caras toalhetes,
peles e joias? O vai e vem das esposas – misturadas com algumas “amigas intimas”
– faziam das calçadas e dos balcões dos casarões que davam para as ruas
festivas da procissão, uma verdadeira passarela do exibicionismo, do poder
aquisitivo dos seus maridos comerciantes e fazendeiros.
A
banda de música invadia o ar morno da tarde. O crucifixo, puxando a corrente de
fiéis, pendulava a frente de todos, segurado pelas frágeis mãos do coroinha. No
meio da procissão, enfeitado com flores nas cores italianas, o pomposo andor tremulava
acima da multidão.
De
repente um grito de surpresa une os espectadores:
− Já ganhou, já ganhou!
Todos
os olhares se voltam para a origem do grito.
Lá,
a esposa de Francesco Lamborgini, toda de renda preta e lantejoulas prateadas,
desfila com um decote entreaberto deixando a mostra o farto peito arfante,
donde prende um vistoso broche de brilhantes em formato da letra “F”.
−
Presente de Francesco, diz! Em honra de São Vito e para calar a boca daqueles
que dizem que ele vai mal nos negócios. O santo o protegerá, não deixando que
isso aconteça.
Mal
sabia ela que o marido, para tão cara aquisição, penhorara o que sobrara do
armazém de secos e molhados e todo o estoque. Dessa situação não há santo que o
salve...
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