A CIGARRA E A FORMIGA
Oswaldo
U. Lopes
Todo
mundo conhece a fábula da cigarra e da formiga, a que canta e a que trabalha
pesado.
Não conheço ninguém que não odeie
profundamente essa história. Alguns poderão até disfarçar ou expressar um desprezo
velado, irônico, perverso, mas de todo modo incontestável. A fábula é uma
agressão a nossa querida lei do mínimo esforço. A existência dessa formiga
trabalhadeira que se esfalfa durante todo o verão para ter alimento quando o
inverno chegar e uma afronta a nossa alegria de viver.
No fundo, todos achamos que o frio pode
não chagar ou nós não chegarmos a ele, que cantar é bom e a alegria esta sob
nossa pele, dentro de nós, ponha a música mais alta, quero cantar e dançar,
dane-se o amanhã!
Deve ser por isso que a versão da
cigarra aparecendo no começo do inverno, para visitar a formiga, num imenso
cadilaque cor de rosa, indo para Nice cumprir uma temporada que seu empresário
arranjou é tão festejada.
Tanto ou mais festejada do que a
expressão da formiga ao saber o destino da cigarra.
─ Já que você vai para a França se
encontrar por lá um tal de La Fontaine, diz para ele ir à pqp com todo o meu
apreço.
Amamos muito mais a cigarra boemia do
que a formiga trabalhadeira. Esta não nos dá inveja, dá raiva.
Nota. A
fábula original é de Esopo e é bem curtinha. La Fontaine produziu e reproduziu
as fábulas de Esopo em versos que foram muito populares no século XIX. Há quem
atribua esta versão, da temporada na Europa, a Millôr Fernandes, não é verdade.
Millôr também usou versos, mas sua cigarra foi cantar na rádio Nacional.
Esta versão tão charmosa é atribuída a
um professor português de nome Vaz Nunes proveniente da cidade de Ovar. O site
original não mais é encontrado e nada mais se sabe dele, mas a história parece
verdadeira, sobretudo porque na versão mais antiga a frase final da formiga é a
seguinte:
─Se
você encontrar por lá um tal de La Fontaine, o que escreveu nossa história,
mande-o esfregar-se em urtigas.
Eu, pessoalmente, não conheço expressão
mais portuguesa do que “esfregar-se nas urtigas”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário