O
HÁBITO NÃO FAZ O MONGE
Ledice Pereira
Eram jovens senhoras, muitas delas recém-casadas,
que da vida pouco sabiam. Tinham sido preparadas para o casamento. Deveriam ser
perfeitas donas de casa, sabendo cozinhar, lavar passar, costurar e bordar. Nem
todas, entretanto, exerciam essas atividades.
Corria o ano de 1950 quando Arlete mudou-se
para Presidente Prudente. Vinha de Ibirarema, também recém-casada, deixando ali
toda sua família.
Sentia-se só. O marido, médico, ficava fora
o dia todo e a pequena casa era muito prática para limpar. Estava habituada à
casa da cidadezinha onde crescera com seus cinco irmãos, cuja limpeza e
arrumação dividia com duas irmãs enquanto a mãe se dedicava à cozinha e à roupa
que não era pouca. Tinham uma auxiliar que as ajudava, mas o trabalho era intenso
e tomava muito tempo.
Quando acabava os afazeres, Arlete dedicava-se
a ler, coisa que adorava fazer, e aos trabalhos manuais.
No final do dia, tomava um banho e saía ao
jardim de cujo portão apreciava o movimento e a criançada que brincava sob o
olhar vigilante de suas mães ou babás, enquanto aguardava ansiosa a chegada de
Edgard.
Essa rotina fez com que, aos poucos, ela
fosse se aproximando da vizinhança até ser convidada para um chá na casa de uma
delas.
No dia marcado, colocou um vestido floral
que achou adequado para a hora e o evento.
Foi recebida por um mordomo que, de luvas,
conferia o nome das convidadas.
O chá, servido no imenso quintal cheio de
árvores onde uma mesa oval enorme havia sido montada, era acompanhado de
delicados biscoitos e uma variedade infinita de pãezinhos.
A anfitriã, que vestia um tailleur de linho
azul acinzentado, do alto de seu salto veio recebê-la exibindo inúmeras joias
mais parecendo uma vitrine ambulante.
As convidadas foram chegando, cada uma mais
elegante do que a outra e cheias de anéis e pulseiras que faziam tilintar em
exibicionismo.
Arlete, na simplicidade de seu vestidinho
colorido, sem nenhuma joia além da aliança de casamento sentia-se totalmente
fora daquele ambiente ao qual não estava habituada.
Uma das jovens, que se apresentou como
sendo Lucíola Penteado Guimarães, comadre da dona da casa e que ostentava um
enorme anel de brilhantes, iniciou com ela uma espécie de entrevista para saber
há quanto tempo estava casada, o que o marido dela fazia, de onde ela era e
quantos empregados tinham.
A cada tímida resposta da jovem, Lucíola
fazia caras e bocas, sem prestar muita atenção no que era dito, aproveitando-se
para falar de si própria: o marido era um respeitoso médico de senhoras e
trabalhava no Hospital de Clínicas da cidade, mal tendo tempo para a família.
Estava casada há dez anos e tinha três filhos que havia colocado numa escolinha
porque não suportava o barulho que faziam. Tinha três empregados, que se
encarregavam de tudo para ela, e costumava frequentar eventos como aquele
sempre que era convidada. Pelo menos uns três por semana. Detestava ficar em
casa sem ter o que fazer.
Arlete deu graças a Deus quando vieram
chamar Lucíola avisando-a de que o marido ali estava e tinha pressa em
falar-lhe. Aproveitou para despedir-se da dona da casa dizendo-lhe que
precisava ir embora.
Ao sair, encontrou a jovem Lucíola aos
prantos, abraçada ao senhor de branco que devia ser o tal famoso médico e que
parecia transtornado.
Voltou para casa sentindo-se inferior
àquelas madames tão empertigadas.
Minutos após, chegou Edgard, com um sorriso
enigmático nos lábios, abraçou-a e disse-lhe:
─ Querida, como você está linda nesse
vestido! Digna mesmo de ser esposa do novo Diretor Geral do Hospital de
Clínicas da cidade. Hoje, fui convidado a substituir o Dr. Guimarães, que foi
denunciado por algumas clientes, por exigir pagamento por fora, das consultas e
cirurgias que ali realizava.
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