O
amor no século XIX
Ledice Pereira
Corria o ano de 1940, quando Giuseppe
chegou ao Rio de Janeiro, fugindo da guerra e trazendo toda a família. Indicaram-lhe
uma pequena vila onde moravam várias famílias, vindas de diversos lugares da
Europa. Era um amontoado de pequenas casas de dois andares que circundavam um
pátio. Alguns habitavam a parte de cima, outros a parte de baixo dos sobrados.
No pátio, os cheiros, do que se cozinhava,
misturavam-se. Mulheres reuniam-se ali, alternando-se na lavagem de suas
roupas, que ali mesmo estendiam.
Um burburinho se misturava ao barulho das
crianças, que brincavam ou choravam perto de suas mães.
Giuseppe e sua mulher Carmela, timidamente,
se apresentaram ao dono do cortiço e foram encaminhados com os quatro filhos para
o quarto e cozinha que os esperava.
O dono logo foi avisando que o banheiro
ficava fora.
Como não podiam exigir muito trataram de se
instalar no local da melhor maneira possível.
Giovanna, a filha mais velha, tinha catorze
para quinze anos e estava acostumada a ajudar a mãe a cuidar da casa e dos
pequenos.
Giuseppe veio com algumas economias e,
ajudado pelo filho Andrea de treze anos, começou a confeccionar chapéus,
habilidade que aprendera com o pai.
Assim teve início aquela pequena fabriqueta
artesanal que, após alguns anos de muito trabalho e dedicação, tornou-se uma
indústria de chapéus que abastecia o país.
A família comprou uma bela casa e
estabeleceu-se num bairro aristocrático sendo aceitos pelas abastadas famílias
da região.
Giovanna voltou a estudar conseguindo
formar-se na escola normal.
Frequentavam as rodas sociais e eram sempre
convidados para os eventos que ali aconteciam.
Num desses eventos, Giovanna conheceu
Aristides, jovem advogado paulista, recém-formado.
O jovem sentiu-se imediatamente atraído
pela moça e, em pouco tempo, solicitou permissão a Giuseppe para namorá-la,
apesar de continuar residindo em São Paulo, onde trabalhava num escritório de
advocacia.
O casal trocava inúmeras cartas, que
custavam a chegar e sempre que ele podia viajava para o Rio para vê-la.
O fato de se sentirem apaixonados e a
distância que os separavam levaram o casal à decisão de se casarem.
Aristides convidou-os a conhecerem seus
pais em São Paulo, a fim de acertarem os trâmites do casamento, e ficou
decidido que no primeiro fim de semana fariam isso.
Ao chegarem a São Paulo, foram recebidos
por um casal de meia idade, ela negra, que acompanhava Aristides.
Este, eufórico, apresentou seus pais a
Giovanna e família.
Foi um constrangimento geral. Giuseppe mal
olhou para a mulher que lhe foi apresentada, decidindo retornar imediatamente
ao Rio de Janeiro.
Numa época em que os filhos, dificilmente,
desacatavam seus pais, Giovanna deixou-se levar pelo pai indignado. A mãe
procurava acalmá-la, mas nada que dissesse aplacaria a tristeza da jovem
apaixonada.
E assim terminou, como tantos, aquele que
poderia ter sido um lindo caso de amor, mas que, esbarrou na intolerância,
devido a um conceito de superioridade europeia bastante presente à época e que,
infelizmente, ainda persiste.
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