Cleópatra Tupiniquim
José Vicente J. de Camargo
A cena estava pronta! Os figurantes que fariam
a guarda da rainha, uniformizados e perfilados aguardavam. Assistentes da
filmagem corriam a tomar seus lugares. Atores coadjuvantes terminavam os
últimos retoques na maquiagem, nas mãos os scripts eram relidos dinamicamente
mais uma vez. O diretor, de megafone em punho dando as últimas instruções,
comentou:
- E ela, onde está? Já devia estar sentada no
trono.
A escrava negra de pele luzidia já segurava
nas mãos a caixa da morte contendo a mortífera coral. Ao lado um dos
sacerdotes, conhecido gozador, lhe cochichava no ouvido: -“a jiboiá lhe mostro
a noite!”.
Impaciente o diretor grita no megafone:
- Liz, estamos aguardando, só falta você!
Atriz que se preza chega atrasada, comenta um
dos figurantes.
O encarregado da cenografia diz que a Diva só
entra com os efeitos da fumaça colorida e com a musica apropriada.
- Pois então ação! Ordena o diretor nervoso,
já contabilizando o pagamento extra da cena prolongada.
Sob a atmosfera nebulosa e colorida e o som
estridente das
Trombetas, desfila, cena a dentro, Liz e o séquito de escravas cabisbaixas
pressentindo o desfecho fatal.
Senta no trono de purpurina dourada e recebe
com carinho a caixa que mudará o destino da história.
Nisto, um apagão característico das urbes
provincianas, interrompe a cena milenar. A caixa da morte cai ao chão, gritaria
geral...
-Cuidado com a cobra! Grita um engraçadinho
incentivando o corre-corre.
E o diretor, desacorçoado, interrompe a
encenação:
- Chega por hoje, não adianta continuar.
Tupiniquim não nasceu pra faraó!
- Vamos todos pro forró do Alcides! Cleópatra
não esqueça de levar os balangandãs, que pertencem a baiana do acarajé da
esquina!
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