Odores de Buenos Aires
(Paro Geral) - Ana Maria Maruggi
Ao desembarcar em Buenos Aires logo sinto cheiro de organização no aeroporto Ezeiza. Os amplos espaços bem mobiliados acomodavam centenas e centenas de passageiros conectados à internet livre passando vistas em fotos, tuitando ou facebucando. Os balcões com sorridentes moças me esperam para carimbar o passaporte. Parece mesmo que os argentinos subiram alguns degraus na vida da tecnologia, e da receptividade.
O transfer contratado pelo hotel tenta me dar uma panorâmica diferente da situação. Desabafa que a Argentina está descuidando do povo que, enquanto a presidente enriquece a olhos vistos. Insistente ainda alerta que a Argentina entrará em greve geral no dia seguinte, como se isso me abalasse de alguma forma. Confesso que a boa impressão do aeroporto ainda prevalece, e a queixa do homem soa como algo isolado e sem grande importância.
Um quê estranho de lixo amontoado pelas calçadas sinaliza um deslize. O primeiro deles. Os vidros do carro fechados – com aquele tradicional medo paulistano – inibem os aromas que por certo existem lá fora. Mas, ainda o bom ar do Ezeiza está equilibrado em minha opinião sobre Buenos Aires. Afinal, estas são as minhas primeiras horas na capital.
No bar do hotel o carpete antigo, o mesmo em que pisaram grandes nomes da história, exala envelhecido odor asfixiante. É como um velho, mas importante livro, que precisa ser guardado em pé na estante podendo ser consultado a qualquer momento. Descubro que tentam manter a boa aparência quando noto o piso do hall, o mesmo da fundação em 1920, em mármore italiano trabalhado com extrema competência, o pé direito de quatro metros dando ares de suntuosidade, e a escalinata em mármore tão branco que ofusca a vista. Mas, o que se sobrepõe é ainda o fedor do puído revestimento do piano bar.
Comer em Buenos Aires é, indiscutivelmente, obrigatório. E inevitável!
Nos restaurantes o aroma que chega com os pratos é estonteantemente delicioso. Podem-se degustar excelentes cardápios, de diferentes formas de preparo, todos saborosos e altamente recomendáveis. Uma pena que esse deleite, quase sempre, é servido por uma gama de descarados garçons sem educação, aproveitadores e pouco preocupados com a imagem da casa em que trabalham, ou do país em que vivem. Esses não aderiram à greve, mas deveriam.
A Florida e suas pequenas floriculturas de esquina, que ainda perfumam alguns trechos, oferece um proveitoso estar para os turistas. Mesmo que pelo chão haja centenas e milhares de folhetos “Paro Geral” cobrindo o pavimento, mostrando a força sindical das categorias, tentando intimidar a todos. Mesmo que isso não cheire bem, ainda ressalto que pela Florida os variados perfumes norteiam-me. Câmbio! Câmbio! Cacharrel, Gabana, Vitória Secret, misturam-se embalados pelo furação de cambistas e vendedores de turismo, onde a moeda local desvalorizada não é a preferida. Onde o cheiro do real e do dólar americano é que preenchem as caixas registradoras. Onde o fedorento lixo dos restaurantes, amontoado em algumas esquinas, impede passagem.
Os perfumados passantes de origens variadas, portando suas câmeras fotográficas, deixam-se parar curiosos na esquina da Cordoba, ante o antigo edifício de 1914, de construção exótica, ocupado pela Marinha. Corro meus olhos pelas máquinas fotográficas que apontam para o edifício e tento descobrir a origem de seus donos. Mas, a imponente porta de bronze ricamente trabalhada em alto relevo que dá entrada ao prédio, me atrai, e aponto meu flash para ela. Um colírio para meus olhos brasileiros onde os prédios antigos são velhas e decadentes edificações abandonadas.
Aproveito para comprar casacos nas lojas cheirosas de dois andares onde muitas balconistas brasileiras ficam felizes em poder falar seu idioma pátrio.
Em Puerto Madero espero sentir cheiro de mar, mas não há mar nenhum. O lugar propício para passeios e bons jantares, faz-me voltar muitas vezes. O conjunto harmonioso de charmosos prédios à beira do canal, a iluminação romântica projetada para o espaço, permite passeios agradáveis ao ar livre. E, de novo me envolvem os bons ares da Argentina.
No táxi do Pablo, o odor de sachê de lavanda é tolerável. Compensa pela boa companhia e bom papo. Um camarada servil e muito educado, um amigo que descubro em tempo de trocar calorosos apertos de mãos e abraços de despedida.
Enfim o Ezeiza, e o mix de perfumes importados no free shop!
Vou sentir saudade do cheiro de Buenos Aires...
Muito bom, professora, norteou bem o texto através dos aromas de Buenos Aires. História bem amarrada, traz um quê de nostalgia, dos velhos e bons tempos de uma rica Argentina, agora desgastada. No sexto parágrafo há um erro de impressão, ou seria, ato falho, trocar "greve" por "grave". Continue se esmerando, está quase um Ricardo Freire!
ResponderExcluirVera
ResponderExcluirObrigada.
Era erro de digitacão. refiro-me à greve geral.