A LUTA DE UMA MULHER - Oswaldo Romano



A LUTA DE UMA MULHER
Oswaldo Romano           
                   
        Um casebre coberto com cascas dos troncos das árvores, abrigava a pobre família do Ernesto. Paredes de bambus, amarrados em paus roliços do cerrado. Um chão de barro batido com sumo do  fícus.

        Habitada pela mãe Maria, dois filhos menores, e o pai que chegando da roça, depois de comer seu jabá, sentado numa pedra chama o Tufo, o cachorro que lhe roça as pernas.

        Distraindo seus filhos apanha sua velha viola e  dedilhando arrancava modas caipiras. Um lindo quadro formado em baixo da lamparina que expelia  línguas de fogo e rolos de fumaça. O cheiro do querosene disputava com seu cigarrinho de palha, quem cheirava mais.

        Esse ambiente repetido quase que diariamente juntava as crianças porque só ali tinham um pouco de luz. Maria e Ernesto sabiam que juntos  disfarçavam o pouco que tinham se alimentado.

        Com tanta penúria era impossível manter aquelas criança saudáveis, coradas. Apresentavam-se definhadas, a pouca beleza demonstrada estavam nos olhos verdes e pele queimada.

        Ernesto o esteio daquele casebre, um dia, chegando queixou-se:
        — Maria, não estou bem. Peguei a maleita. Já estou tremendo. Amanhã fico na cama.

        — Meu Deus Ernesto. Você não pode ficar doente.

        — Na maleita não pensei. Sempre tive medo do “Barbero”. Nossa casa é de taquaras, tem seus esconderijos. Maria me faça um chá do barbaquá, e uma aspirina.

        O Ernesto não conseguia se recuperar.

        Maria entrou em desespero. Apelou proteção a Todos os Santos, ao Padre Cícero, e muito mais a Deus.

        Ernesto juntou as crianças, fez-lhes um difícil carinho  e disse: Maria não dá mais. Deus quer assim. Procure ajuda. Fechou os olhos para sempre.

        Ganhando forças, Maria foi à luta sozinha. Enxada na mão, raspava aquela terra árida protegida com um pano que lhe cobria a cabeça. Triste, chorava, e lamentava-se:

        — Porque eu. Porque tenho este destino?


        Com pouca opção, como fazia seu marido, insistindo, brigando com aquele chão arenoso onde somente alguns cactos sobreviviam, a seu modo fez algumas plantações.

        Toda manhã seu primeiro olhar era para o céu, momento que fazia seu sinal da cruz e lamentosos pedidos. Céu sempre limpo via o infinito. Nenhum rasto, nenhuma esperança. Suas sementes iriam apodrecer. Do poço, só lama.

        Juntando as crianças, disse, chamando-os pelos nomes:

        — Siro, Mira, venham comigo.

Seguiram calados em direção à plantação. O cão Tufo, na frente, a cada tempo olhava se os seguiam. Parou, onde Ernesto costumava parar. Maria com dois gravetos fez uma cruz no chão. Ajoelhou-se, pediu o mesmo às crianças, enquanto Tufo, sentado, os observava.

        — Filhos, juntem as mãos, repitam meus pedidos: “Meu Deus, -repitam – Meu Deus -  o que pedimos –o que pedimos é pouco para o Senhor todo poderoso,  e muito para nós. Derrame sobre esta terra, por São José, um pouco da sua santa água”.

Filhos, vamos levantar. Agora sou eu quem peço: Ernesto, sei que está ai no céu. Me ajude, me ajude Ernesto. Nossas crianças precisam de alimento.     

— Ernesto! Sei que você esperava meu pedido, Ernesto. Pelo amor de Deus, pelo amor que você tem por nós, pelos seus filhos.

        Suplicava entre os choros que permitiam falar.

 Continha-se como podia, para não impressionar as crianças. Mas não conseguia. O Tufo começou a latir. Olhava para cima, virou a cabeça na direção da Maria, deu um longo uivo.

        Sentia-se só o vento. Um triste silêncio tomou conta do lugar.

        Dois dias depois, as chuvas chegaram. Maria saindo eufórica do casebre, recebendo a chuva no rosto, gritava por Deus, preparando-se para ir até aquela cruz, agora uma Santa Cruz.

        — Aonde cê vai mãe? Perguntou o Siro.

        — Ver seu pai, filho. Agradecer a Deus! Olha o Tufo aflito, ele quer ir comigo. 


Mais um mês, aconteceu o esperado milagre. O milagre da germinação.

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