O jovem empreendedor
Ises de Almeida
Abrahamsohn
A mãe de Manuelito,
conhecido por Nelito, ficou contente
quando o pároco do bairro pediu
autorização para o garoto ser coroinha da igreja. Ele tinha se oferecido e
pedido se podiam ajudar com o estudo. A mãe estranhou um bocado, mas ficou
agradecida. O menino vivia se metendo em confusões pelo bairro e andava mal na
escola. Com três filhos e as tarefas de casa ficava sabendo das travessuras apenas
quando alguém vinha se queixar.
Nelito iria atuar
como coroinha nas missas de sábado e domingo. Três vezes na semana, à tarde, ajudaria
a trocar as flores dos altares. Nesses dias, o menino tomaria o lanche no
seminário que ficava atrás da igreja e teria ajuda de um noviço para estudar
porque estava a perigo de ser reprovado na escola pública do bairro.
O seminário ocupava
meio quarteirão e os seminaristas cultivavam o jardim e a horta. Renques de
pinheiros plantados na face interna dos muros escondiam o cimento enegrecido e
espalhavam agradável cheiro de resina. Lá pelas cinco da tarde, Nelito, depois
de tomar o lanche, saía do refeitório para o jardim e ficava conversando com um
ou outro dos jovens seminaristas antes de ir para casa.
Aproximava-se o
Natal e foi quando o garoto vislumbrou
uma oportunidade de negócios. Pinheirinhos verdes eram obrigatórios nas casas
das famílias alemãs então numerosas no bairro. O esquema de Nelito contava com
a ajuda de seu amigo do peito, Carlinhos. A árvore era cortada por Nelito
quando o jardim ficava vazio ao toque da Ave-Maria. O malandro amarrava uma
corda que era jogada por cima do muro. Depois calmamente se despedia do padre porteiro
e ganhava a rua. Uma hora mais tarde, no escuro, os dois amigos içavam a árvore pelo lado externo do muro. O
pinheirinho encomendado era então transportado e entregue na casa da incauta
família. Não se soube quantos a dupla subtraiu.
O esquema deixou de
funcionar quando Nelito ofereceu um pinheirinho à tia. Diga-se a verdade: o
garoto tinha bom coração, e dela não cobrou nada. Porém a tia desconfiada
perguntou a origem da árvore. Nelito, pego de surpresa, explicou que os padres
estavam refazendo o jardim e estavam doando as árvores às famílias do bairro interessadas. A balela não
colou. A tia telefonou para a mãe do jovem que, por sua vez, ligou para o
pároco. O padre ainda incrédulo se escondeu no jardim ao anoitecer. Com espanto
viu o cuidadoso içamento e o sumiço do pinheiro além do muro. Não conseguiu
deter os garotos que, de bicicleta, sumiram na noite.
Mais uma do Nelito,
pensou a mãe ao se desculpar com o
pároco quando este lhe comunicou o fim do interesse da Igreja pelos préstimos
do garoto. Uma jovem “alma em perigo”, alertou o sacerdote. Mas, Nelito foi
perdoado e, em troca do ultimo pinheirinho, recebeu da tia uma boa gorjeta. Que
“alma em perigo” que nada, sentenciou a tia. Apenas uma estrepolia de garoto.
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