A ADOÇÃO UM PROCEDIMENTO DIFÍCIL
OSWALDO
U. LOPES
A
adoção nunca foi e nunca será simples. O mais das vezes torna-se um processo
complicado para o conjunto da humanidade. Há
evidências de que no âmbito das famílias constituídas nos moldes tradicionais
as crianças sempre questionam se são adotadas ou não. Ao receberem um belo
pescoção moral ou mesmo físico como resposta, convence-se de imediato que estão
biologicamente inseridas naquela família e ponto final. As adotadas tem ali,
talvez sua primeira experiência negativa.
É frequente que os pais adotantes façam
questão que as crianças alvo sejam de tal ordem que impossibilitem traçar
qualquer traço genealógico. Mães que tiveram filhos em casa e os entregaram
quase que imediatamente, adoções não registradas pela justiça e por ai vai. Querem
matar o mal pela raiz. Será um mal? Que raiz é essa?
No universo estelar da existência das
famílias ditas normais, com filhos biológicos, a adoção é um fenômeno não
significativo, mas é ai que a estatística falece de mal intrínseco. É um não
significativo que toda vez que é tocado assume uma significância impar e nos
comove e no cobra entendimento.
Parece que o conjunto da humanidade
rege-se pela máxima de Terencio:
Nada do que é humano me é estranho. Nihil humani a me alienum puto,
no original latino. Faz parte da peça “O atormentador de si mesmo” e é um
exemplo clássico do texto que fora do contexto ganhou uma dimensão muito
diferente da que tinha no teatro.
Constitui-se hoje em dia um exemplo de
que se um foi ferido todos fomos feridos, se um foi ofendido todos fomos
ofendidos. Não há estatística que nos tire a dor interior por um que esta fora
do abrigo. O filho pródigo é importante exatamente porque é pródigo, não porque
sejam muitos.
Há pouco foi exibido um filme cujo
título original era Lyon (Uma jornada para casa) sobre um menino indiano que se
perde da família e é adotado por um casal australiano e passa a viver uma vida
normal numa família que é muito diferente da sua original.
Baseado em fatos reais o filme termina
quando ele reencontra sua pequena aldeia natal e sua mãe biológica. Há no filme
menção a 60.000 crianças perdidas todo ano na Índia e o enorme esforço para
arranjar um lar para todas.
O trabalho é grande e complicado, na
película mostra-se claramente o perigo que cerca essas crianças sem família e a
conivência expressa de autoridades que deveriam cuidar delas com a bandidagem.
Creio que faz parte da complexidade do
ser humano esse desejo que não se cala, essa questão sem resposta, se há um
perdido então estamos todos implicados.
Não há estatística que nos socorra na
dor interior por um que esta fora do abrigo.
Em que pesem todas as ideologias, todas
as interpretações da história, o numero infinito do todo, o um ainda importa
muito. Não haverá paz enquanto um estiver ao relento. Dificilmente nos
convencemos de que a realidade esmagadora do conjunto supera a tristeza do
apartado.
A mensagem aparentemente cristã é
anterior a Ele próprio e existe mesmo entre povos que nuca ouviram falar Dele.
Não é curioso que a frase de Terencio fosse uma das favoritas de Karl Marx,
ateu convicto e o pensador crítico original do comunismo?
A adoção é certamente uma das partes que
compõe a esperança que foi o que nos restou no vaso de Pandora.
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