Noites
escuras em Papolândia
Ises A. Abrahamsohn
Sem
iluminação nas casas e nas ruas os habitantes da vila Papolândia tinham que se virar com velas e
lampiões. Gás também não havia e os fogões
eram à lenha. As promessas feitas pelos candidatos que por lá passavam apenas na época de eleições não
resultavam em nada. Uma estradinha de terra, pouco mais que uma picada, ligava
Papolândia à cidade de Baturi onde havia prefeito e energia elétrica. Eram seis horas em lombo de burro para percorrer os 80
km até Baturi. Tal como Papolândia, existem centenas de outras vilas pelo
Brasil. Havia entretanto uma diferença: o pessoal de Papolândia era muito bom
de conversa e mais ainda de articulação.
Reunidos à luz de lampião bolaram um plano
para conseguir as melhorias. Seria executado na próxima visita do prefeito que tentava a reeleição.
Pois então veio lá o prefeito e sua comitiva. Foram recebidos com festa,
feijoada e a famosa pinga da vila. Seguiram-se os habituais discursos,
promessas e beijinhos nas crianças. Lá pelas cinco da tarde o prefeito e sua
turma não viam a hora de se mandar dali. Despedidas feitas, puseram-se a
caminho. Meia hora depois a consternação! A estrada estava interrompida por uma
profunda cratera: impossível de passar veículo, ser humano ou animal. Restava
voltar à vila e pedir socorro. Mas como?
Sem energia não havia telefone e naquele fim de mundo nenhum sinal de celular.
Alguém lembrou que talvez houvesse um rádio na vila. O Belarmino, que parecia
ser o líder local, já os esperava com um lampião na mão. Sim, havia um rádio,
mas infelizmente estava com defeito. Suas excelências teriam que pernoitar em
Papolândia e, com sorte, amanhã tentariam comunicação. Poderiam jantar e se
alojar nas redes a serem estendidas na varanda da escolinha. Após o jantar,
Belarmino e os habitantes da cidade vieram em peso ver como se ajeitariam as
autoridades. Estas tropeçavam e praguejavam enquanto, à luz de lampião,
tentavam achar o caminho para a latrina atrás da escola.
Belarmino ofereceu uma rodada da célebre pinga,
servida na sala de aula, e começou o papo, assim com quem não quer nada...
_ “Pois é, se houvesse energia, daria prá consertar
o rádio e se a estrada fosse melhor não teria desabado e vosmicês poderiam
voltar prá cidade....” E por aí foi a
conversa, com os papolandinos fazendo uso do seu melhor papo. Aí pelas tantas,
alguém sugeriu:
_
“Seu prefeito, agora que vosmicê viu a nossa situação, escreva aí a ordem para
a companhia instalar a fiação pra nós aqui!” Apareceram papel e tinta e o prefeito
não teve outro remédio senão escrever a ordem de serviço requerida. A bem dizer,
ficou com medo de ter que ficar ali por mais dias. A professora leu em voz alta
o documento e o povo se dispersou. Ao clarear apareceu o Seu Miguel com a notícia
de que o rádio voltara funcionar. Transmitido o pedido de socorro, foi
improvisada uma ponte e prefeito e sua turma puderam passar. Uma semana depois
começaram a puxar os fios e a erguerem os postes na estradinha de Papolândia.
A
próxima batalha seria conseguir asfalto na estrada!
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