ISSO É
IMPRESSIONISMO
Jeremias
Moreira
À distância ele percebeu uma falha no
último A de PRIMAVERA. Então, aproximou-se do toldo, molhou o pincel na têmpera
branca e fez o retoque. Enquanto pintava o letreiro CASA DE CARNES PRIMAVERA, na franja do toldo do açougue, Philemon
deixou alguns quadros que pintara, enfileirados ao rés do chão da parede do
estabelecimento, na esperança de despertar o interesse de alguém.
Nessa hora, Dona Zezé saiu do açougue,
se deparou com as pinturas e pôs-se a examiná-las. De repente se deteve no
quadro que retratava uma mulher nua e metralhou indgnada.
− Olha aqui, ô rapaz! Além de fazer uns
borrões que ninguém entende, você tem a cara de pau de exibir essa pornografia!
Surpreso com a repreensão da senhora,
Philemon tentou contemporizar:
− Não, dona Zezé, isso é um nú
artístico. Não tem nada de pornográfico.
− Não tem pra você que é um desregrado,
mas para nossas crianças tem, sim!
A essa altura já se juntara seu
Orlando, o jornaleiro, dona Geralda, que também saira do açougue, o taxista que
esperava dona Nenê e a própria dona Nenê que igualmente chegou esculhambando
com as pinturas:
− Nossa, que coisa mais grotesca!
− Isso é Impressionismo, dona Nenê! −
falou seu Orlando, com ar de entendido. − Lembro da coleção da Folha que vendi
na banca há alguns anos.
− Que mané Impressionismo, isso é
sacanagem, isso sim! – insistia dona Zezé.
Pilemon se apressou a corrigir:
− É Arte Contemporânea, seu Orlando!
− Pra mim não passa de um monte de borrões!
− insitiu dona Nenê.
Vendo o jovem Philemon em apuros, Zé do
Boi, o dono do açougue, foi em seu socorro e o chamou para acertar o letreiro recém
pintado.
Philemon é auto-didata e seu sonho é
viver de pintura. Enquanto o mar não dá peixe ele faz uns bicos como letrista.
Zé do Boi pagou o serviço e aconselhou
Philemon a guardar seus quadros antes que as mulheres tumultuassem mais.
Philemon voltou, encontrou a rodinha
acalorada, aproveitou o momento e guardou os quadros no fusquinha. Quando se
preparava para sair, sentiu dona Zezé se aproximar:
− Desculpe a franqueza, moço! Mas, não
troco a folhinha da farmácia, lá de casa, por um desses quadros!
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