VIVER EM BOSTON
Oswaldo U. Lopes
Júlio
agora vivia em Boston, tinha green card
e fazia parte da comunidade brasileira legalizada. Quinze anos haviam se
passado e aquilo parecia um sonho. Guiava uma limusine e transportava turistas
brasileiros pela Nova Inglaterra, como se estivesse em Vitória da Conquista sua
terra natal.
Como
é modo de dizer, lá nunca tivera automóvel, sua casa era mesmo um casebre feito
de tijolo baiano, tábua e zinco. Inventara um forro com o que conseguira de
madeirite e muito trabalho com o martelo. Não tivera carro, mas trabalhar na
oficina do seu Antonio desde os 12 anos até que fora muito bom.
O
aprendiz aprendera muito e depois daquela história do Collor chamar os carros
brasileiros de carroças, a indústria tinha melhorado, virara montadora de fato
e muitas peças eram importadas o que levou seu conhecimento a um nível que lhe
valera muito aqui em Boston.
Quem
achava que grampo era coisa de cabelo de mulher nunca havia rebaixado molas
espirais de um carro, sem cortá-las. Ficou surpreso ao ver como os americanos
mexiam nos carros, na base do compre as peças e faça você mesmo. O que havia de
carro rebaixado ou elevado era coisa de espantar. Nunca imaginou que o tempo
passado na oficina do seu Antonio rendesse tanto. Rendeu e muito. De chofer
ilegal para mecânico e chefe da oficina fora um passo. Descobrira também que
trabalho bem pago, permite guardar dinheiro, sobretudo se você leva vida dura e
simples. Com sua qualificação e o guardado virara sócio da empresa. Se você tem
green card sua situação muda muito.
Da para comprar automóvel tendo cinco anos para pagar.
Olhando para traz achava que não fora difícil, esquecia até dos invernos
e da neve que nunca vira antes. Lembrava-se do clima ameno de Vitória da
Conquista por causa da altitude, mas os 10ºC do inverno lá era brincadeira
perto do que sentia aqui. Até os malditos Fahrenheit aprendera e com eles se
virava.
Tinha
família, a querida Anita que deixara em lágrimas na rodoviária agora estava com
ele e falava um inglês até melhor que o seu, com leve sotaque bostoniano, o que não era pouco. Vai ver era porque não
era baiana de nascimento, viera menina ainda de Cachoeiro de Itapemirim.
Fora
andando com ela que tivera uma pequena aventura típica de estados unidos. No
leste americano e canadense os músicos de rua são bem tolerados. Por causa do frio eles em geral
tocam dentro das estações.
Era
o ano de 2007 e estavam em Washington a passeio. Entraram pela estação de metro
L’Enfant Plaza que é grande e movimentada,
com acesso as várias linhas de metro e trens. No imenso hall um rapaz
ainda jovem tocava violino. Ele usava roupas simples e tocava com empenho e
gosto.
Julio
não era muito chegado à música erudita ao contrário de Anita que tivera até
umas aulas em Cachoeiro quando os tempos para sua família eram melhores, mas
sentiu-se muito atraído pelo som maravilhoso que o rapaz arrancava de sua
rebeca. Gostou tanto que puxou uma nota de cinco dólares e a deixou no chapéu ao
mesmo tempo em que uma senhora idosa depositava no mesmo chapéu uma nota de vinte
dólares. Achou esse valor exagerado para um músico de rua.
No
dia seguinte desfez-se o mistério, o rapaz era Joshua Bell aclamado violinista
e o violino que ele tocava um Stradivarius valendo qualquer coisa como quatro
milhões de dólares. Fora uma iniciativa do Jornal Washington Post, e a velhinha dos vinte dólares a única pessoa
que o reconhecera.
É
– pensou - coisas assim não viveria se tivesse continuado sua pacata e, porque
não dizê-lo, miserável vida em Vitória da Conquista.
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