O Zodíaco e a Rosa
Vermelha
José Vicente J. de Camargo
A rosa vermelha destacava-se no vaso de boca fina em cima da
cômoda da sala de visitas. Era um local nobre da casa e todos que entravam e
saíam tinham seu olhar atraído pela sua cor viva de sangue que automaticamente instigava
o olfato à procura do seu perfume adocicado.
Ele sempre a trazia, decorada com raminhos verdes numa
caixinha apropriada, em suas visitas diárias. Sabia da preferência dela por
rosas e da cor vermelha. Nada a ver com a crença popular de que rosa vermelha é
símbolo de amor ardente ou coisa que o valha. Era uma simples questão de gosto
e estética. Além do mais, gestos exagerados de afeto iam contra sua natureza
libriana.
Apesar de não acreditar em astrologia, tinha de concordar com
algumas das características atribuídas aos do signo de libra:
Procuram evitar os extremos!
Pois sua posição de conforto era ficar no meio ou, como dizem
os críticos, “em cima do muro”. Não demonstrar
preferências, pelo menos aparente, para qualquer das partes em questão. Considerava-se
também uma pessoa calma, ponderada, avessa a encrencas, um pouco retraída e que
detestava incomodar os outros com pedidos de qualquer natureza.
Ela, no inicio do namoro, o recebia na sala com um sorriso faceiro,
um selinho dengoso e corria a trocar a água do vaso para colocar a nova rosa ainda
em botão. Depois o levava à copa para o lanche da noite, os comentários das
novidades do dia e o acerto do programa do final de semana. Na despedida na
sala, as trocas de juras de amor acompanhadas de confidências da vontade dos
corpos nus unidos na paixão crescente.
A rosa vermelha inicia lentamente
a desabrochar a primeira pétala!
Porém, com o passar do tempo, as carícias dela foram
diminuindo. Os selinhos se tornaram leves roçar de lábios e as confidências se
abreviaram. O lanche já não tinha mais
as novidades preparadas com esmero dado, segundo ela, o trabalho excessivo, a
academia lotada, o transito cada vez mais complicado. E quando ele iniciava seu
relato do dia, ela o interrompia querendo saber se resolveu os assuntos pendentes,
se tomou providências, se fixou as datas, se já fez isso, quando fará aquilo,
enfim uma ladainha de questionamentos que lhe tirava o prazer de estarem juntos.
É típico do signo de Aires, pensou: mandona, apressada, impaciente ─ quer tudo para
já.
Quando ele procurava desviar o assunto, ela voltava a comentar
suas características librianas: muito calmo, indeciso, avesso a assumir riscos
e responsabilidades. Nesse ritmo não chegaria a lugar algum...
Na despedida, o beijo ia se tornando cada vez mais frio. Até
que um dia, a campainha não mais tocou. A rosa vermelha pendeu inerte e deixou
cair as primeiras pétalas. A água do vaso escureceu, o perfume virou lembrança.
No firmamento, as constelações do Zodíaco brilham majestosas
como sempre. Áries e Libra, que influenciam comportamentos nem sempre
semelhantes, se entreolham cautelosas. Zeus, deus dos deuses e dos homens,
zelando pela paz universal, envia seus raios a ambas pedindo reflexões. A Áries
que a impaciência não leve a julgamentos precipitados e a Libra que use seus
dons de mediação que será recompensada.
Conselhos estes acatados sem ressalvas e transmitidos aos
súditos terráqueos.
Então, uma noite, a campainha volta a tocar.
A rosa vermelha retoma
seu lugar de destaque na sala de visitas.
As caricias se
reencontram abraçadas no aroma penetrante do perfume floral.
E assim tem sido há muitos anos. Um não
tendo a coragem de viver sem o outro...
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