Síndrome de Abstinência
Ises de Almeida Abrahamsohn
Era domingo, Marina completava 14 anos. A mãe preparava um café
da manhã especial e o pai saíra para comprar
os croissants. De repente, chegaram até a cozinha sons sincopados alternados com palavras de
desespero.
Marina soluçava e
exibiu o i-fone :
_ Parou, sem mais nem menos! Morreu !
Logo hoje no meu aniversário!
A mãe
ainda arriscou:
_ Será que não é a pilha que acabou ?
Marina lançou-lhe um olhar de desprezo acompanhado de algumas fungadas :
_ Mãe, os i-Mac não usam mais pilhas há
anos ! Precisamos ir urgente à
loja do Shopping. Uma amiga minha disse
que nesses casos eles trocam na hora por um novo.
O restante da manhã transcorreu em clima de tragédia.
Emprestou o celular do pai e ficou passando mensagens contando a
tragédia. Os avôs telefonaram e
ouviram a voz lacrimosa contar a desventura atual e as futuras a acontecer se
ficasse sem o i-fone.
Finalmente
às duas da tarde mãe e filha entraram na Mac-loja. Lotada....
Meia hora depois Marina explicava
o ocorrido ao funcionário.
_ Sinto muito,
mas só podemos examinar o seu i-fone em
horário agendado . Talvez na livraria onde
também há um setor de consertos, eles possam dar uma olhada.
Na livraria não tiveram mais sorte. Nesses
casos realmente era necessário
agendar , demoraria um dia. Mas era possível agendar num computador dali mesmo.
Um dia a mais sem comunicação era
algo terrível e Marina desatou a
chorar. Não conseguiu fazer o agendamento, era preciso o numero de série do aparelho. A custo
a mãe convenceu-a a voltar para casa. O
primo estudante da Poli viria à noite
para o bolo de aniversario e ele poderia ajuda-la.
À noite
Marina não queria saber nem do bolo nem de nada. Assim que o primo chegou foi direcionado para o velho computador da mãe para fazer o
tal agendamento. Só depois, por boa educação,
Marina apareceu na sala para soprar as velinhas e
cortar o bolo. Nem queria que
tirassem fotos: as pálpebras estavam inchadas e não tinha nenhuma vontade de
sorrir. Desdenhou quaisquer palavras
de conforto ou solidariedade dos
parentes. Que sabiam eles das
agruras de ter que viver desconectada!
Ao rezar
antes de dormir teve a ideia. Deveria
existir algum santo a quem pedir socorro, um
que fosse protetor dos
internautas e dos tecno-dependentes. Quem seria? Havia santos para todos os misteres, algum seria o mais indicado ! Lembrou-se
de Santo Expedito, padroeiro das causas urgentes ... A dela era realmente urgente! Mas este Santo era muito genérico ...
_O Google
deve saber !.... Lembrou do jurássico
computador da mãe. De fato, lá
encontrou:
“ Santo Isidoro de
Sevilha, protetor dos usuários de
Internet e programadores de computador. Acredita-se que Isidoro, que viveu no
século sétimo, escreveu a primeira enciclopédia do mundo, a Etymologies, a qual
inclui registros da medicina, matemática, história e teologia. “
Marina explicou tudo ao Santo, e
fez o
pedido... Também achou por bem
acrescentar uma promessa : ajudar o
irmão mais novo a usar o novo
Photoshop.
No dia
seguinte, após a escola, lá foram de novo Marina e a mãe ao Shopping.
_
Não, garota , não tem nada agendado em seu nome. - Marina começou a chorar e o rapaz desconcertado falou - Vou chamar minha colega Lucia, talvez ela
possa resolver.
Marina apelou mentalmente a São Isidoro:
_Talvez
tenha esquecido , devem ser muitas mensagens, mas lembre-se de mim !
Marina voltou a relatar o
problema, agora à Lucia. A moça parecia
legal. Iria levar o i-fone para examinarem.
Enquanto esperavam, Lucia contou-lhe que estudava informática e que tinha participado da última Campus Party. Ganhara uma medalha por ter criado um novo programa de análise de imagens.
Neste momento, apareceu alguém do fundo da loja dizendo que o i-fone não
tinha mesmo conserto, mas que iriam substituí-lo.
Marina respirou aliviada. Mas havia um
problema, não tinham aquele modelo em
estoque e iria demorar 3 semanas para chegar.
Lucia viu as lágrimas
que começavam a toldar os olhos
da garota.
_ Calma, calma, foi só brincadeira. Aqui está
o seu novo i-fone com uma capa cor de rosa de
brinde. Venha vou lhe mostrar a
minha medalha.
Ao examinar a
medalha , Marina viu no verso a imagem de Santo Isidoro , que parecia piscar-lhe um olho.
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