UM ESPAÇO NO TEMPO
INÍCIO DE UMA BIOGRAFIA
O EMBORNAL
Oswaldo Romano
Nasci em 4 de abril de 1928, mas o que conto é meu
primeiro dia de aula, tinha sete anos quando fui matriculado no pré-primário.
Minha apreensão foi a mesma que todo menino sente nos dias que antecedem à
primeira aula. A cabeça girava. Acompanhava atento o preparativo feito com
muito carinho pela minha mãe. Seu nome era Hermínia, mas todos a chamavam de
Nena.
— Tenho que costurar o embornal para você, disse ela.
Já comprei o brim amarelo-cáqui, cor da fruta. Vai ter o tiracolo, e todas as
suas coisas vão caber nele.
— Mãe, o que é tiracolo?
— Pra saber tudo, é que ocê vai indo à escola filho.
Iria começar a aprender o bê-á-bá.
Na noite precedente fui pra cama cedo, mas como era de se esperar, não
conseguia dormir. Sei lá a que hora, pensando na falada e temida professora dona
Isaura, adormeci. Acordei com o chamado de minha mãe:
— Wado... Tá na hora, seu primeiro
diiia!
Assustei, tremeliquei, mas logo me encontrei. Estava todo
ensopado! Não era suor, não! Sonhei que escondido, nadava na cachoeira, lá
perto da estação da minha pequena cidade natal. A água estava quentinha,
quentinha. E o colchão também!
Como era meu primeiro dia na escola, a mijada foi
perdoada. A expectativa era um assombro. Depois do banho, lá fui eu. Sapato
cheirando a graxa, meias brancas, calção e camisa manga curta impecavelmente
passados, levava orgulhosamente a tiracolo meu embornal, muito lindo, com aba,
botão de fecho, o lanche e muitas recomendações. Eram tantas que nenhuma chegou
até a escola. Foram todas, não esquecidas, mas embaralhadas.
Era moleque, não tinha irmão que me ensinasse. Aprendi
a ouvir e a me impor. Durante o recreio fiz aproximações com outros garotos,
inclusive os do bairro oposto, com quem tínhamos certas rivalidades. Foi quando
um deles, mais metido zombou:
— Que embornal feio! Amarelo! Enrugado!
Pra quê!? Lembrei o carinho com que a mãe o havia
costurado. Levantei a cabeça pro céu aspirando, ele olhou o que seria,
aproveitei e meti-lhe uma botinada na canela. Ele gritou. Logo no primeiro dia!
Por sorte o vigilante estava de costas, virou-se assustado indagando... Eu com cara de dor fui dizendo:
— Moço esse moleque tá me batendo!
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