JARJACHA
Carlos
Cedano
Na
Cordilheira dos Andes existe a lenda que quando uma pessoa comete incesto ou
infidelidade sua alma fica feia, tão feia que pelas noites pode escapar de seu
corpo tomando formas aterradoras.
Eu
não acreditei, pensei que se tratava de uma das muitas lendas que povoam o
imaginário dos andinos. Porém a narrativa me deixou encafifado. De passagem por
Cuzco, rumo para Capital, aproveitei para visitar, o xamã Taita Sinchi, um
velho senhor que conhecia de muitos anos e sabia de minhas andanças pelas
cidades da cordilheira.
Após
de um curto período de conversa, necessário para atualizar nossas respectivas
vidas, falei para ele sobre estória que não me saia da cabeça, e perguntei:
—
Taita Sinchi, como é possível que isso ocorra sem que a pessoa perceba as
transformações que está sofrendo sem morrer?
O
velho homem percebeu minha ansiedade, pensou alguns poucos minutos e enquanto
me oferecia um copo de chicha, me disse:
—
Não é necessário morrer para que isso ocorra, a pessoa pode estar simplesmente
dormida. No dia seguinte, ao despertar pensará que teve maus sonhos, mas em
realidade era sua alma que tinha rondado pelas ruas da cidade.
Ainda
ansioso perguntei:
—
Então são espíritos que vagam simplesmente pela cidade?
—
Estas almas são chamadas de Jarjachas e podem aparecer como uma lhama
com uma, duas ou três cabeças segundo a frequência com que cometem seus
pecados. Se a intensidade de seus pecados foi maior aparecem como uma lhama com
cabeça humana ou ainda, uma combinação de metade lhama e metade mulher.
O
velho Taita continuou sua narrativa:
— É
muito perigoso encontrar-se com uma jarjacha. Quando se percebe que há
alguma rondando a cidade e apavorando os habitantes se organiza um grupo de
vizinhos para atacá-la com paus e pedras. Normalmente fogem e as pessoas das
quais saíram apresentam nos seus corpos marcas dos golpes recebidos que só as
percebem quando acordam.
— E
daí Taita,... como é que essas pessoas ficam?
— Aí
que vem a parte mais difícil, meu filho. O primeiro a fazer é resgatar as almas
desses pecadores das “garras” das jarjachas. Para isso precisamos do
arrependimento deles através de jejuns, confissões, banhos com ervas, banhos
gelados no rio, carregar cruzes durante as procissões e muita reza. Quando as
marcas desaparecem, temos o sinal que suas almas foram perdoadas. Por outro
lado, a população assistira às novenas, às missas de sextas feiras e
procissões.
Fiquei
pensativo por um bom tempo tratando de equacionar todo o escutado embora sem
acreditar.
O
Taita Sinchi percebeu minha dúvida:
—
Vamos fazer o seguinte meu filho, na próxima aparição de uma jarjacha por
esta região vou te escrever e você vem, tá?
—
Não, não obrigado! Respondi imediatamente.
Olhamos
um para o outro e rimos.
Também fiquei pensativa e com muito medo. rsrsrsrs
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