O
PREFERIDO DO REI
Jeremias
Moreira
O personagem Escriba caminha até a boca do palco e
diz solene:
− Tenho más notícias,
Majestade! Correm fortes rumores no reino, que não devem ser ignorados! Chrétien de
Troyes insinua que sir Lancelot e a rainha Guinevere são amantes!
Indignado, Rei Artur responde enérgico:
- Sir Lancelot
lutou bravamente pela libertação da rainha! E, desde então tem sido o mais fiel
cavaleiro da corte. − virando-se para a plateia − Proíbo-o de propagar tais suspeitas! Ordenarei que Chrétien de Troyes
seja punido por denegrir a imagem da rainha!
Caradoc, o bobo da corte, sentado no chão, bem na
boca do palco e bem próximo ao público, com a mão esquerda em concha, fala em
tom jocoso:
− Tem gente que não sabe de nada!
A plateia explode em gargalhada!
Assim tem se repetido nos últimos seis meses. Toda noite o
Grupo Chave de Armário faz sucesso com a paródia que achincalha com os
relacionamentos do Rei Artur, Sir Lancelot e a Rainha Guinevere. A adaptação picante
sugere que o Rei e o Cavaleiro eram amantes, assim como Lancelot e a Rainha.
Depois do espetáculo, e após receber os amigos e fãs, no
camarim, os atores vão assinar o ponto na Cantina do Piolin, que é onde a
classe teatral se reúne. Lá pelas tanta, Bereba, que faz o Rei, junto com
Tatinha, que interpreta Guinevere, e é sua mulher, tomam um taxi e vão para
casa. Bereba deixa Tatinha e continua no carro até o Morumbi, na rádio Jovem Pan,
onde é locutor, da uma às seis da manhã. É um duro danado! Mas, vida de ator é
assim. Não dá para viver só do teatro. Por isso a maioria dos atores tem outro
emprego ou faz bico em publicidade.
O que Bereba não sabe é que, vez ou outra, minutos depois de
deixar a mulher, Rubão, que é o Lancelot na peça, estaciona o carro na frente
da sua casa. A Tatinha abre a porta. E, na quentura da cama, os dois monitoram
sua chegada com o radio sintonizado na Jovem Pan.
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