O Braga. - Fernando Braga


O Braga.
Fernando Braga

Há muitos anos, na capital paulista, atravessando o Viaduto do Chá, lá vinha ele vestindo o seu terno de linho branco 120, sapato preto bem engraxado, sobre a cabeça o seu chapéu Ramenzoni, caminhando ligeiro para seguir os passos daquela multidão apressada. Isto por volta do ano 1950

Chegando próximo ao nosso Teatro Municipal, de 1911, na Praça Ramos de Azevedo, próximo à Rua Conselheiro Crispiniano, lá estava uma enorme faixa branca, um banner, pendurado entre dois postes, onde se lia: Para Deputado Estadual, vote em    Rubem Mendonça Braga.

Ele parou, olhou bem a faixa, seus olhos quase saltaram das órbitas, enraiveceu, fechou os punhos, balançou sua cabeça mostrando uma enorme desaprovação e, começou a olhar as pessoas que passavam apressadas como se procurasse apoio, mas ninguém lhe dava a menor atenção. Ardendo em raiva, cogitou consigo mesmo:

— Que desgraçado, que cafajeste, maldito, enganador, falso: Rubem Mendonça Braga. Esse miserável colocou em letras enormes, garrafais o Rubem Braga e o Mendonça bem pequeno. Quem olha para este banner, só vai ler o Rubem Braga e pensar que sou eu e vão confundi-lo comigo. Não sou nenhum Mendonça. Isto mostra sua má intenção em querer se passar por mim, como se eu fosse o candidato.

— Aqueles que bem me conhecem sabem que nunca fui e nunca serei um político, pois não gosto deles, a maioria quer se tornar um deles para roubar, fazer trambiques, negociatas. É uma classe desprezível e que um dia poderá destruir nosso Brasil! Gostaria de poder gritar bem alto no meio desta multidão que este tal de Rubem Braga, não sou eu e não o conheço. Este Mendonça dever ser ele no mínimo um falsário, um grande falsário! Sou apenas um escritor, um cronista brasileiro, mas sou bem conhecido, pelo menos pela classe mais estudiosa, mais letrada!

Eu não vou e não passo admitir tamanha desfaçatez. Tenho que tomar alguma medida e, isto não pode ficar assim! Vou conseguir seu endereço, telefonar a ele ou talvez colocar nos jornais que nada tem ele a ver comigo, este Mendonça.

— Pera aí, talvez o melhor seja dar um pulo no Tribunal Regional Eleitoral, conversar com alguém que possa tomar alguma providência e impugnar o nome deste candidato!

É o que vou fazer e agora! O TRE mais próximo deve ser o da Rua Francisca Miquelina, na Bela Vista.

 Seguiu pela Barão de Itapetininga até a Avenida São João e lá, tomou o primeiro táxi para rumar direto ao seu destino.

Sentou-se no banco de trás e durante o trajeto ia pensando no ultraje, de que tinha sido vítima. Exasperado, continuava delirando:

— Isto não ficar assim seu malandro! Você vai ter que retirar seu nome de todas as praças, ruas, postes, que emporcalham o visual e meu nome é jogado às traças. Por enquanto só vi este banner, mas sei que quando se aproximar mais a eleição, a cidade ficará bem emporcalhada.

À medida que ia se aproximando do local, ficava mais e mais tenso. Movia muito sua boca, gesticulando e às vezes saia um som mais agressivo, uma palavra áspera. Estava falando sozinho. O chofer do táxi olhava para trás e via o desespero de seu passageiro. Perguntou: - O sr. está passando mal? Quer que eu pare para tomar uma água?

Não, não!  Estou apenas um pouco nervoso, mas não se incomode, vamos em frente!

Não estava um pouco nervoso, estava possesso!

Quando o chofer parou a 30 metros do local onde se lia TRE, pagou o taxista e desceu resmungando, mas um pouco mais calmo, mais senhor de si. Antes de entrar no edifício ficou parado, pensativo, sentou-se na beirada de um pequeno muro. Após uns 10 minutos de confabulação, levantou-se:

— Meu Deus! O que estou fazendo? Posso estar cometendo um erro, uma grande injustiça!

Ele se chama Rubem Mendonça Braga e, é claro que não sou eu!

Mas ele é Braga, é Braga e se ele é Braga... Ele é bom!

— Sabe de uma coisa, vou votar nele!


Tomou o caminho de volta e agora, sorrindo.

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