A PASSARELA ENCARNADA.
Sergio Dalla Vecchia
O casal se aprontava com seus trajes de gala.
Ele vestiu-se rápido.
Essa vantagem o homem possui sobre as mulheres.
Para ele é fácil, pois não há alternativa ao não ser o
velho e tradicional smoking.
Traje de gala privilegiado, pois veste sempre com
muita elegância, mostrando a silhueta mais esbelta, graças ao efeito ótico do
tecido na cor preta.
Assim é só vesti-lo, procurar uma poltrona e ficar
aguardando pela ansiosa esposa aprontar-se.
Tudo isso porque era o mês de dezembro de 1993 e o
casal foi convidado para a festa de comemoração dos 120 anos da fundação do
Liceu de Artes e Ofício de São Paulo.
A instituição foi criada em 1873 por um grupo de aristocratas da elite cafeeira, visando capacitar mão de obra para a indústria
e teve como seu diretor o arquiteto Francisco de Paula Ramos de Azevedo a partir de 1890.
Enfim era uma grande comemoração!
Para tanto, o local não poderia ser outro a não ser o
Teatro Municipal de São Paulo.
O casal acabou saindo de casa em tempo hábil para que
não chegassem com atraso ao evento.
Chegando à porta apresentaram-se ao hostess, foram fotografados
e pronto. Lá estavam eles diante daquele hall maravilhoso, composto de um
conjunto arquitetônico eclético, que era moda na Europa desde o século XIX,
combinando os estilos Renascentistas, Barroco e Art Nouveau.
O Teatro também foi projetado pelo arquiteto Ramos de
Azevedo e as obras iniciaram-se em 1903 e terminando em 1911, ano da sua
inauguração.
Estavam maravilhados com o esplendor do local! Embora
residissem na cidade de São Paulo e era a primeira vez que adentravam em tal
requintado recinto.
Viam a sua frente uma linda escada de mármore, que se
dividia num patamar em dois novos lances; um para ala direita e o outro para a
ala esquerda, ambos chegando ao piso superior.
Mas o que mais chamou a atenção dele foi uma linda
passarela na cor encarnada, que contrastava harmoniosamente, com o mármore
branco da escadaria.
Ele, com seus
olhos ávidos de reconhecimento do local, observava tudo ao redor.
Senhoras bonitas muito bem vestidas, ostentando as
suas melhores joias.
Os distintos cavalheiros padronizados pelo mesmo traje,
também mostravam muita elegância.
Estavam distribuídos em rodas de conversas, onde o
riso era fácil e os goles de uísque também.
Ele conversava sobre a decoração do hall com a esposa que
segurava uma taça de vinho em uma das mãos. Repentinamente sentiu uma força estranha,
que o induzia a fixar seus os olhos na impecável passarela carmim.
Veio à sua mente a fisionomia de uma ex-namorada.
Morena linda, traços delicados, um sorriso encantador e uma boca convidativa à
um acalorado beijo.
Ela vestia um vestido longo da mesma cor a da
passarela em um baile de formatura no Clube Pinheiros, onde se conheceram e iniciaram um pequeno romance na juventude.
As condições do
evento eram parecidas. Um grande salão de baile, gente elegante e o mesmo clima
de festa.
Lembrou-se da sensação do instante em que segurou em
suas mãos, da batida acelerada do seu coração, o braço enlaçando a sua cintura,
o inicio da musica romântica, os rostos colados, o arrepio e os céus!
Ele estava enfeitiçado por aquela cor vermelha, a
ponto de se ausentar em pensamento do local
onde se encontrava para reviver o seu
antigo romance.
De repente ecoa o som de uma campainha pelo hall do
Teatro, convocando a todos para o inicio do balé “ O CORPO “ interpretando
musicas de Ernesto Nazaré.
Assim, ele despertou de seu encantamento, ofereceu o
braço para sua esposa e o casal entrou na sala para assistir ao seu primeiro
espetáculo no Teatro Municipal de São Paulo.
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