O imprevisto acontece
Ledice Pereira
Jorge
resolveu viajar àquela hora adiantada da noite. Estava sem sono e preferia
pegar a estrada quando havia menos movimento. Era caminhoneiro há mais de vinte
anos e conhecia as estradas como a palma de sua mão.
Pediu
o carro de seu irmão, pois queria chegar logo ao destino, a cidade onde Letícia
se encontrava.
Haviam
discutido, como sempre, por um motivo qualquer e sem importância e ela virou as
costas e foi se embora.
Fazia
já uma semana e ele achou que devia procurá-la.
O
carro era antigo e fazia ruídos que ele desconhecia. Além disso, falhava muito. Ele estava acostumado ao seu
caminhão que sempre respondia rapidamente ao seu manejo.
A
estradinha que acessou para cortar caminho, estava deserta e a garoa fina que
caía deixava a visão prejudicada, já que o limpador de para brisas não
funcionava adequadamente.
Sintonizou
uma estação de rádio, a única que pegava, e que naquela hora tocava música
sertaneja. O apresentador conversava com o público fiel daquele horário. Uma
monotonia.
De
repente, surgiram não se sabe de onde
quatro homens encapuzados e armados com metralhadoras que apontavam diretamente
para ele. Não teve alternativa, senão parar.
Enquanto
um dos homens apontava para ele, os outros vasculhavam o automóvel para ver o
que ali encontravam.
E
dentro de um dos pneus encontraram o que desejavam, dois pacotes de cocaína e um de dólares.
Como pode ser? Quem poderia ter
colocado ali? Meu irmão? Mas como esses homens sabiam que encontrariam? E como
sabiam que o carro estaria nessa estrada? Que loucura!
Jorge
estava perplexo. Era um homem simples, mas trabalhador. Viajava por essas
estradas entregando mercadorias de segunda a segunda. Jamais poderia se
imaginar vítima de uma situação dessas.
Os
homens levaram o carro e o deixaram ali. Pensou que fosse morrer, mas eles
tinham o que queriam.
O
dia estava amanhecendo. Jorge, com pouco dinheiro, com frio, molhado pela garoa
e assustado começou a andar em direção à estrada principal. Seu velho celular
estava sem bateria. Dirigiu-se ao
primeiro posto de gasolina que encontrou depois de uns dois quilômetros onde
havia vários caminhoneiros tomando café.
De
lá ligou para o irmão que não o atendeu. Conseguiu uma carona até a delegacia
mais próxima onde fez um boletim de ocorrência.
O
delegado comentou que esse bando estava agindo por aquelas pequenas estradas e
que ele havia tido sorte, pois costumavam machucar ou até matar os motoristas
que se negavam a cooperar.
Jorge
disse que não sabia como a droga e o dinheiro tinham ido parar ali. Não podia atribuir ao irmão,
homem direito e trabalhador.
Desistiu
de continuar até a cidade da namorada e voltou pegando carona com alguns
caminhoneiros que o deixaram perto de casa.
À
noite o noticiário policial informou que a polícia havia prendido uma quadrilha
de traficantes no interior de São Paulo.
O
bando agia colocando drogas e dinheiro nos pneus de carros antigos,
estacionados nas ruas, que não chamariam atenção, para transportar e entregar
ao chefe, que da prisão onde se encontrava, comandava toda a ação. Junto
com a droga foi instalado um rastreador, que tornava possível o posterior
ataque.
Jorge,
o irmão, e Letícia, que ao saber do fato, se reconciliou com ele, mal puderam
acreditar que saíram ilesos daquele episódio que poderia ter tido um final
trágico.
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