ENCRENCA - Oswaldo U. Lopes


ENCRENCA
Oswaldo U. Lopes

       Encrenca! Foi o que pensou o investigador Hiroito quando o telefone tocou as 03 h da madrugada. E era. A voz inconfundível do Dr. Fabricio, delegado chefe da divisão especial do DHPP, começou a falar com a maior naturalidade:

        — Hiroito, da um pulo no IML (Instituto Médico Legal) que tem um caso de suicídio com oito facadas no peito.

        — Como é que é?!

É o que você ouviu. Tem gato na tuba. Ou você acha que eu ia te chamar a essa hora para te convidar para tomar chá?

        Hiroito foi se levantando devagar e pensando. O doutor Fabricio era um bom chefe apesar da idade. Gato na tuba. Ainda bem que mesmo sendo relativamente jovem Hiroito era bem vivido. Gato na tuba. Algo cheira mal, está errado. Ele podia ter dito tem leão na tuba, suicídio com sete facadas no peito. Coisa para lá de esquisita.

Chegou no IML e foi chamando:

Borges?

Fala Hiroito!

Que negócio e esse de suicídio com oito facadas no peito?

Pois é, e ainda tem uma que pegou de raspão nas costas. Eu até falei pro Geraldo que trouxe o corpo que a história de suicídio estava cheirando mal, mas ele insistiu que era uma viciada em cocaína que surtou e eu fiz apenas a verificação.

Você pediu toxicológico?

Ele disse que ela era habitual do 17º Distrito, e que todo mundo sabia que ela era chegada à coca e que eu andasse rápido e liberasse o cadáver que ele conhecia uns familiares e iria providenciar a papelada, enterro e tudo.

Sem toxicológico? E olha que para viciada ela não tem marcas nos braços nem hematomas recentes. Pela cor dos dedos ela não fumava nem cigarro.

Bem eu não queria acordar o Dr. Marcos de madrugada, se tem uma coisa que os nossos pacientes não tem é pressa. A grande maioria não vai a lugar nenhum. Logo cedo falo com ele e já vou colher toxicológico.

Hiroito examinou o cadáver. Moça jovem, bem cuidada, não era do tipo que frequenta delegacias de polícia ou anda pelos corredores de distritos. A faca nas costas pegara no ombro direito e produzira um talho fundo. As outras eram na face anterior do tórax, todas muito próximas do coração. Para suicídio teria que ser na frente de um espelho, na terceira que acertasse o pericárdio ia cair desmaiada ou desmaiando e ainda desferiria mais cinco!!!

O gato na tuba era simples. Fora atacada pelas costas e ao se virar recebera mais oito facadas, todas dirigidas ao tórax e neste, no lado esquerdo, onde está o coração.

Nem precisava do toxicológico que deu totalmente negativo para saber que era homicídio e passional. Por que o Geraldo queria abafar o caso e transformar em suicídio de uma perdida qualquer? Identificou a moça e conseguiu acessar seu Facebook. Lá estava ela feliz e radiante. Estudante de arquitetura no Mackenzie gostava de ler, bebida favorita piña colada, melhores amigas duas colegas do curso. Epa quem era esse cara na foto recente! Já vi esse cara antes.

Apelou para o José Maria do DENARC, e dito e feito.

— É o Gabriel irmão do Geraldo do 17º. Dá um trabalho louco para o irmão. Viciado, ultimamente anda traficando. Boa pinta, atrai moças que nem perfume francês ou cesta de flores, mas é violento. Teve uma vez que cortou uma prostituta na cara e foi um abafa difícil.  Se for prendê-lo leva arma e reforço.
Não levou. Telefonou para o Dr. Fabricio, explicou o tamanho do leão na tuba e deu os detalhes.

Como premio foi dispensado da pior parte, era um precioso investigador e o chefe não podia nem de leve arriscá-lo numa missão dessas.


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