SITIO PRIMAVERA – Dr.
Sherlock
Oswaldo U. Lopes
O alvoroço no Sitio do
Pica-Pau Amarelo era visível. Todos corriam de um lado para o outro como que
buscando alguma coisa, mas infrutiferamente, baratas tontas seria uma
comparação razoável. Corria o mês de fevereiro e estavam todos no sitio.
Pedrinho de férias estava a toda. Lucia (Narizinho) sua prima, que morava no
sitio, também corria. Tia Anastácia, D.
Benta, Emília, a boneca falante, todos corriam. Epa! Todos? Cadê o Visconde?
Esse era o mistério e a causa do alvoroço, o
Visconde desaparecera. Já haviam procurado por toda parte, e nada. Pensaram até
na policia, em dar parte do desaparecimento, mas como? O delegado Gentil, amigo
de D. Benta, conhecia todos e entendia bem o sitio, mas estava de férias.
Chamar um investigador qualquer e explicar que um sabugo de milho inteligente e
cientista amador havia desaparecido, e
que a boneca falante fora a última a vê-lo, era pedir para que ele chamasse o manicômio
de imediato, sem mais conversa.
Foi
a que Emília se lembrou do Prof. Resende, ilustre médico, vizinho, dono do
sitio Primavera, e que era conhecido como Dr. Sherlock por causa de suas
incríveis deduções. Toda redondeza o conhecia e achava-o muito simpático. Ele
comprara o sitio e em vez de mudar o nome para Sitio do Sherlock ou algo
parecido, mantivera o nome, mas acrescentara na placa “Dr. Sherlock”.
Amigo
de D. Benta e mais ainda do café e dos bolinhos de tia Anastácia, quando estava
no seu sitio gostava de aparecer e, às vezes, ficava até tarde contando casos e
como os resolvera ou diagnosticara baseado em fatos e evidências
surpreendentes.
— Vamos chamar o Prof. Resende, é nosso amigo e
tenho certeza de que ele é capaz de resolver esse caso.
Modernidades havidas Narizinho passou a mão no
telefone e ligou para o sitio Primavera. O próprio Prof. Resende atendeu e
posto a par do caso, disse que iria de imediato. Dito e feito! Não se passou
muito tempo e já se ouvia o som inconfundível de uma charrete e lá estava o
professor que adorava andar desse modo quando estava no sitio.
Foi saudado por D. Benta que o chamava sempre de
Dr. Luís André e por tia Anastácia, de quem era médico particular, que chegava da cozinha com seus famosos
bolinhos e o café, famoso café, do qual se dizia que não havia outro igual,
feito por máquina ou barista. O segredo do café? Não contava nem ao médico,
muito menos ao padre, o médico até que merecia, mas como é que ficaria a troca
de favores, ele adorava aquele café e ela adorava aquele doutor.
Posto a par do caso o Prof. Resende virou-se para
D. Benta e perguntou “cui bono”? D.
Benta vendo a curiosidade estampada em todos os rostos foi explicando:
— Expressão
latina que quer dizer quem lucra? Ou seja, diante de um crime ou um mal feito
começa-se a investigação perguntando a quem interessa essa ação, quem lucra com
ela. Às vezes é usada a forma “cui prodest” que quer dizer a mesma coisa, mas
no latim clássico “cui bono” era a locução empregada. Cícero a usou muitas
vezes e atribui sua origem a Lucius Cassius conceituado juiz romano.
Emília que era não somente falante, mas muito inteligente,
começou a olhar em volta a procura do Marques de Rabicó. Afinal quem lucraria
comendo uma espiga de milho? Um porquinho simpático e gordinho seria um culpado
muito presumível. O marquês jurou a mais absoluta inocência e a coisa parecia
ir para o caminho da Lava Jato quando o Prof. Resende pediu para dar uma olhada
no laboratório do Visconde que ficava no porão.
Foram e não encontraram nada. Anotações, cadernos,
bloco com escritos a modo de lembretes, mas nada que denotasse interrupção
abrupta, saída forçada, sequestro ou algo semelhante. Se dali saíra era
evidente que não o fizera de maneira forçada, provavelmente o fizera como quem
vai tomar ar, ou refrescar as ideias ao sol.
O professor pôs-se a pensar, aonde você iria se
quisesse espairecer, descontrair? Ora iria visitar a parentalha não é mesmo.
— Vamos todos
ao milharal! - comandou sem pestanejar e lá foram todos.
Chegando lá deram com a plantação de milho já
colhida pela metade, de modo que parte das espigas ainda era visível e lá no
meio dos pés de milho, um pé de outra espécie, um sapato do visconde e mais a
frente sua inconfundível cartola. Pronto! Parte do mistério estava resolvida. O
visconde fora colhido pelo Tio Barnabé junto com as outras espigas secas do
milharal.
Agora era ir para o paiol e ver se encontravam o Visconde.
Se depararem com quase uma centena de sacos. E agora onde andaria ele? O jeito
foi ir revirando saco por saco, já tinham verificado uns vinte quando no vigésimo primeiro, ouviram lá de
dentro a voz inconfundível do Visconde. Aberto, eis que surge o próprio com um
ar muito ofendido e vendo ali junto sua cartola e seu sapato, foi se recompondo
e saindo.
Todos riam muito, Emília em vez de agradecer ao
professor queria que agradecessem a ela, pois fora quem tivera a ideia de chamá-lo.
Este trocava olhares cúmplices com D. Benta e sorrindo exclamou:
— Não é o
caso de cobrar a visita, que é sempre um imenso prazer, mas que eu mereço mais
um café com bolinhos, mereço sim!
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