O
ASSASSINATO DO SENHOR FONSECA – CAPÍTULO II
Oswaldo
Romano
Durante uns quinze
dias fiquei no gelo. Apenas dava cobertura à companheiros. Dificilmente passava
um momento em que esquecesse a misteriosa morte do Sr. Fonseca.
— Chácara,
churrasqueira, biblioteca, empregados, porta trancada e dentro um homem
assassinado. Asfixiado? Respiro... É tem o ar condicionado. Mas é o moderno. O
antigo tem uma abertura que passa um homem. O que vi é modelo Split, chega
apenas um tubo de duas polegadas no vaporizador.
Injetaram outro
tipo de gás? Não, ele foi asfixiado. Segundo a pericia, tamparam sua boca.
Não aguentando meu
anseio, pedi ao Dr. Jurandir, retorno ao caso.
— Poá, espere
esfriar um pouco mais. O caso está quente na sua cabeça.
— Exatamente
Doutor. Procuro algumas respostas. Vou montar uma campana e forçar algumas
perguntas. Quero respostas.
— Poá. Preciso
muito de você aqui. Dá um tempo.
— Sabe doutor
Jurandir, estou incomodado. Às vezes perco o sono. Os delegados que cobrem outros
horários, questionam o caso. Sinto-me incapaz. Parece que sofri uma derrota.
Parece não, estou sofrendo.
— Deixa disso Poá,
você é inteligente. Sempre vamos encontrar alguém que queira nos deixar para
trás. O bandido teve muito mais tempo de preparar o assassinato, do que você
para resolvê-lo. São milhares de casos que estão nas gavetas. E o seu não será
o último.
— Mas doutor, o
senhor fala de casos intrincados, complexos. Mas esse aí doutor... Não fosse o
sumiço dos valores do cofre arrombado, eu diria que o infeliz montou a própria morte.
— Tá bom! Fosse o
caso, eu não acionaria meu melhor detetive. Você quer fugir desse desafio? Eu
fui indicado pela viúva. Ela confia em mim!
— O que é isso
doutor! Deu zica no pensamento. Sou eu que estou pedindo abrir a gaveta.
— É verdade. Vou te
dar mais um mês, ok?
— Ótimo. Posso
contar com algumas despesas?
— Claro!
Poá começou
interrogando a cozinheira Lourdes.
—- Quando foi que
você serviu o doutor pela última vez?
— Seu polícia,
quando ele nos dispensou, virou-se para mim e pediu: Antes de saírem eu quero a
garrafa de café e torradas. Foi tudo que pediu.
— Quem estava com
você na cozinha?
— O jardineiro, o
seu Tião.
— Pense e me
responda com certeza: Em algum momento ele ficou só?
— Não. Ah,
espere... Só saí para fechar a janela do quarto enquanto passava o café. Depois
levei as coisas na biblioteca, ele me recebeu como sempre coloquei na
escrivaninha, ele me acompanhou, ouvi trancar a porta, como de costume.
— Quando você
voltou para a casa encontrou o jardineiro?
— Ele já estava na
saída, deu um tchau e foi para a
chácara vizinha.
— O que você sabe
do crime? Tem medo de me contar?
—Meu Deus! Deus me
livre, seu polícia.
— Você ainda é nova
aqui. Eu estou aqui para dar segurança. Acham que o Tião e o vizinho,
mancomunados teriam...
— Seu polícia, eu
não sei de nada. É o senhor quem vai descobrir. Pelo amor de Deus, eu não sei
de nada. Tomara o senhor descubra logo.
Sentado na
churrasqueira, ouvi vozes do outro lado do gramado, nos fundos da chácara. Subi
pelo terreno, muito aclive, vi lá no fundo um campinho de futebol e praticantes
que chegavam.
Chamei o pirobo,
que várias vezes colaborou. Informou que o campo era usado também pelos
empregados das chácaras vizinhas.
Opa! Nasce mais uma
esperança. Essa conversa levantou a lebre.
Era comum eu
conversar com a viúva dona Thereza, naturalmente sempre trocando pareceres do
lamentável fato. Com sua permissão combinamos que o Tião abrisse um caderno
onde os jogadores deveriam marcar presença. Cada um tinha uma página com nome e
RG. Logo entenderam essa medida, pois o clima estava pesado na área e carecia
de cuidados.
Mais alguns dias,
dias em que era visto como segurança, pois estava sempre lendo, sentado no
banco da churrasqueira.
De posse dos nomes
dos frequentadores do campinho, levantei todos os prontuários. Três tinham
passagem. Um por roubo, um por briga e um aguardava em liberdade o julgamento
por ter matado a mulher.
Entrei fundo no
prontuário dos três, e me ative no assassino. Logo no princípio achei que ele
entrou de gaiato. Estava escrito: “O casal vinha com pequenos desentendimentos.
Ele ficou deturpado quando um amigo lhe contou que estava sendo traído”.
Residentes na Paraisópolis, dia a dia os
ânimos foram engrossando e numa das brigas perdeu o controle atingindo-a com um
taco que mantinha atrás da porta.
Depois de uma fria desta, dificilmente alguém entraria
no mundo do roubo e crime. Como nada é impossível, os três passaram a fazer presença na minha carteirinha.
Até então, pouco ou
quase nada evoluiu.
E eu ali, sentado
no banquinho da churrasqueira, mirava aquela pequena biblioteca, sua estrutura,
seu telhado, suas paredes. Uma pequena construção estilo casa de bonecas.
Ganhava café da
Lourdes. Um dia falou que a patroa Thereza queria falar comigo. Às vezes
conversávamos nos cruzando. Essa foi a primeira vez que me chamou.
— Poá, pensei muito
antes de decidir o que vou lhe contar agora. Não devia, mas vai que clareie os
acontecimentos e eu seja acusada de esconder detalhes. No Carnaval, na
esperança de ficar junto com os meus filhos, o mais velho, o Lauro, deu um
sumiço de três dias. Os mesmos dias do acontecimento. Estranhei seu jeito no
regresso, e querendo se justificar disse não ter gostado da folia, não foi como
esperava, não deu detalhes.
Há pouco havia tido
uma grave desavença com o pai por questão da mesada.
— Dona Thereza. Fez
bem em me contar. Nada podemos deixar de lado num caso deste. Mas, deve ter
sido doloroso a senhora como mãe, ter coragem de me alertar. Tenha calma, ele certamente
apenas se divertiu. É próprio dessa moçada. Fique tranquila. Tenho meios de
apurar se saiu da cidade pelos sinais do celular. Mas agora... Esqueça. Também
não vou registrar no prontuário. Tão logo saiba lhe darei notícias.
— Mas, como?
— Deixa comigo.
Na delegacia, na prestação de contas, o Doutor Jurandir
recebeu com espanto a atitude da dona Thereza. Disse conhece-los há muito
tempo, desde a pequena Torrinha. São meus conterrâneos.
Meu pedido, para tirar
do caminho essa preocupação, foi preencher o pedido solicitando à Técnica,
rastear o celular do moço. Percebi que o Jurandir achou exagero essa medida.
— Poá, você tem que
investir no rapaz que matou a mulher. Ele está com sérios problemas, enroscado
com a justiça. Advogado de porta de cadeia não vai minimizar o resultado da
sentença. Precisa contratar um daqueles que conhecemos. Vai custar caro. E a
grana? Pode ser que já tenha conseguiu!
— Doutor, a
Lourdes...
— Espere. Que Lourdes?
— A cozinheira,
doutor. Disse que tomou do café que serviu o Fonseca.
— Antes ou depois
que foi fechar a janela?
— Boa pergunta. Vamos
deixar a janela pra lá. E a porta doutor? Fechada por dentro, e a chave na
fechadura... Me lembro de um caso semelhante doutor. Porém, quando introduzido um bambuzinho no olho da
fechadura, por fora, a chave caiu. Caiu em cima de uma folha de jornal enfiada
pelo malandro pela fresta inferior da porta. Puxando o jornal, a chave veio
junto.
— Pena não ter sido assim...
É doutor. Nossa
missão é espinhosa! A chave não caiu!
— Bota espinho nisso.
***
NO NOSSO PRÓXIMO
ENCONTRO O, CAPÍTULO III .
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