QUEIMA DE ARQUIVO - Carlos Cedano


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QUEIMA DE ARQUIVO
Carlos Cedano

Foi num curto período de tempo que Valdomiro deu robustos sinais de que sua a vida tinha melhorado muito: uma bela e ampla casa em fase final de construção, compra de luxuosos carros para ele e para a mulher e viagens, familiares para o exterior. Comentava-se ainda que tivesse um sólido patrimônio em títulos e ações. Os vizinhos e amigos surpresos com esse súbito progresso financeiro se perguntavam se ele tinha ganhado na loteria, talvez na megasena.  Ninguém sabia de nada, mas as especulações iam surgindo e se afirmavam como verdades!

Valdomiro era Diretor de Obras numa grande empresa do governo que realizava vultosos investimentos na infraestrutura básica do país. Era muito respeitado tecnicamente e pela sua eficiência gerencial. Todos os projetos e contratos passavam pelas suas mãos e os outros membros da diretoria normalmente acatavam seus comentários e sugestões. Entretanto, quem dava a última palavra para aprovação ou não dos contratos era o Presidente e o Diretor Financeiro. Com o passar do Valdomiro suspeitou que os valores dos contratos apresentavam fortes indícios de superfaturamento e começou a juntar provas desses ilícitos e não foi difícil, possuía copia de todos os documentos probatórios e os armazenava em casa.

Mas nosso Diretor de Obras tinha suas próprias ambições. Aproximou-se do Presidente e do Diretor Financeiro e agora jantava com eles, até recebeu convites para a casa desses diretores e foi consolidando amizade entre suas famílias. Esta aproximação marcou o inicio da melhoria de sua vida observada por amigos e vizinhos.

Depois de quase um ano Valdomiro, sempre atento, observou que os valores dos contratos aumentavam de modo incompatível com o incremento real dos custos. Nosso diretor de obras sacou rapidamente que o valor da propina total tinha aumentado bastante, mas sua parte permanecia no mesmo patamar. Teve discussões violentas com os diretores envolvidos e os acusou de estarem passando-o para trás, e insinuou que possuía provas do que dizia. Exigiu ser “reembolsado” pelas suas “perdas” e os cumplices pediram um prazo para avaliar seu pedido. Valdomiro deu-lhes uma semana.

Numa noite estava só em sua casa, a família tinha ido para a praia, chovia intensamente com trovões sequenciais, raios que explodiam em enormes clarões na casa de Valdomiro, os tiros nem puderam ser ouvidos. Sua família interrompeu as férias, preocupada por que ele que não respondia às constantes ligações. Ao entrar na casa encontraram o cadáver na sala, de pijama e no meio de uma poça de sangue já quase seca.
...
— Então, “coronel” foi trabalho limpo? Perguntou um distinto senhor ao indivíduo a sua frente.

 — Limpo e completo. Tivemos muito tempo para trabalhar com tranquilidade, revisamos arquivos e depois provocamos um “acidente” no computador que queimou as partes internas do computador “causada pela tormenta dessa noite”; as provas materiais já foram destruídas, tinha muita papelada!

— Então posso considerar que a eliminação de provas foi um sucesso total, “coronel”?


 — Com toda certeza senhor Presidente! Foi uma queima de arquivo no mais amplo sentido da palavra!

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