O
INTRUSO
Sérgio Dalla Vecchia
A menina entrou correndo
em casa:
— Mãe, seu amigo está
aqui. Venha ver, ele veio fazer uma visita.
Samara não se lembrava de
amigo algum. Apressou-se para ver de quem se tratava. Teve um sobressalto. Ela
não conhecia aquele homem que estava de mãos dadas com sua filha.
Não teve como escapar.
Criou coragem e dirigiu-se à sala ao encontro do “amigo”.
Nervosa perguntou:
— Desculpe, você se diz
meu amigo, mas não o estou reconhecendo. Qual é seu nome?
O homem de aparência cansada,
vestindo uma roupa casual respondeu:
— Hoje é o dia mais feliz
de minha vida! Finalmente a encontrei depois de tantos anos.
Surpresa, Samara
respondeu:
— Mas, como? Não o
conheço, já disse!
O homem, mantendo-se
sereno falou:
— Lembra-se do Grupo Escolar
Estadual. Eu sou o Zezinho que compartilhou uma carteira escolar com você. Agora
se lembrou?
Mais surpresa ainda,
Samara buscava na memória a figura do Zezinho. Nada!
— Desculpe-me, mas não
estou lembrando mesmo. - Disse Samara, agora mais confusa ainda.
— Da professora Alcione
você tem que lembrar! Do bedel Jurandir também!
Samara começou a perceber
que o homem dizia a verdade. Era ela que não tinha uma memória clara do
passado.
O tratamento mudou,
sentaram no sofá e foram descortinando o passado. Café, bolachinhas, algumas
risadas e a conversa durou por mais algum tempo até que Zezinho disse:
— Agora que nos
entendemos, direi o motivo que me trouxe aqui.
— Eu tenho desde nosso
tempo de colegas uma fita do seu cabelo e a conservei até hoje com muito carinho.
Eu a devolvo nesse momento e me declaro um eterno apaixonado por você. Sei que você é divorciada. Voltarei daqui a
trinta dias e proponho o seguinte: Se você ficar com a fita seremos namorados,
mas se me devolver, minha decepção será terrível.
Samara passou os próximos
trinta dias revendo seu passado, a vida amorosa, financeira, casamento,
nascimento da única filha e a separação.
Agora surge do nada um
pretendente, que a ama desde pequena e quer muito fazê-la feliz.
Balançada, passava as
noites ruminando o passado expulsando o sono para longe.
Uma coisa Samara não
conseguia entender, porque não se lembrava apenas do Zezinho. Parecia que sua
imagem foi apagada da memória.
Passados os trinta dias,
lá estava Zezinho de volta, agora com um aspecto melhor e repleto de
esperanças.
Após o cafezinho, um pouco
de conversa e aflorou a esperada pergunta:
— Então Samara, que você
decidiu?
Ela convicta, buscou a
caixinha de presentes e emocionada a entregou.
Zezinho, com uma expressão
de espanto, desapontamento e curiosidade, abriu! Encontrou um bilhete que
envolvia um pacotinho de papel de seda contendo algo delicado.
O bilhete dizia:
Muito sensibilizada pelo
seu amor e muito grata por conservar tão bem a minha fita, eu após pensar muito
sobre a sua proposta, preferi manter minha vida como está.
Peço que a aceite de volta,
desejo muito que seja feliz.
Zezinho recebeu a notícia
como uma punhalada.
Sua fisionomia se
transformou. Parecia outra pessoa. Os olhos explodiam de raiva. Avançou sobre
Samara e a chacoalhou intensamente, atirando-a violentamente ao chão.
A filha, que apavorada
tudo assistira logo foi pega por ele e levada até o carro e partiram sem
destino.
Samara no chão, ainda com
a mente confusa teve alguns flashes de memória, onde via nitidamente uma cena
num canto da Escola em que Zezinho deitado sobre ela tentava beija-la. Ela
lutava para que a largasse até que ele saiu correndo levando uma fita arrancada
dos seus cabelos.
— Meu Deus, por isso é que
eu não lembrava dele! Cadê minha filha? Socorro! Saiu gritando desesperada pela
Rua afora.
No dia seguinte leu-se nos
jornais:
Morto
sequestrador da menina, filha da mulher, alvo do amor doentio do sequestrador.
Mãe e filha passam bem!
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