Arquivo Morto
José
Vicente J. de Camargo
— Hora
da mudança chegou pessoal! Esvaziar as gavetas e armários. Não deixem de
numerar e anotar o conteúdo dos arquivos para não dar confusão quando forem
realocados no novo escritório. O esforço vale a pena, pois mudaremos para um
lugar melhor, com mais luz e vista para um jardim bem cuidado.
Assim,
Pedro comanda seus subordinados no departamento da empresa de marketing em que
trabalha.
− Chefe! Grita Solange com aquela voz estridente
de dar calafrios no mais calmo dos mortais.
− Sim! Responde Pedro, o que foi ...
− Encontrei uma carta ainda fechada no arquivo
morto. O que faço, vai pro lixo ou pra mudança?
− Traga-a para eu ver, completa Pedro.
Com a carta em
mãos, Pedro se surpreende com o nome do remetente e mais ainda para quem está
endereçada:
Remetente: Maria
do Rosário Fonseca
Destinatário:
Álvaro Fonseca – Diretor Financeiro
Vira e revira a
carta, indagando com seus neurônios como viera parar no arquivo morto do seu
departamento. Maria do Rosário se suicidara há alguns anos em meio a uma
profunda depressão. Álvaro está aposentado e pelo que sabe internado com crises
neuróticas por se considerar culpado pelo suicídio da esposa. Em dúvida se abre
a carta ou se a entrega ao Departamento de Recursos Humanos, resolve abri-la,
já que é o responsável por todos os documentos alocados no departamento. Após
lê-la, senta na sua mesa de trabalho mirando o ambiente bagunçado da mudança e
esboça um sorriso irônico:
“A vida dá suas
reviravoltas e acerta no final! Maria do Rosário escreve que ele Álvaro não é o
culpado do ato que irá cometer por ter descoberto seu romance infiel com
Mercedes, sua secretária. Mas sim por ser diagnosticada com um câncer avançado
que só a fará sofrer, sem chances de recuperação. Despede-se dele lembrando o
quanto a fez feliz e lhe perdoa pelo deslize final, um tanto atribuído a ela,
por já sentir o desânimo da doença”.
Esta confissão,
sem dúvida, aliviará Álvaro de suas agonias, pensa Pedro. E quanto a mesma ir
parar no seu departamento, com certeza deve ter sido Mercedes, que ao receber a
carta como secretária, pensou que fosse uma pressão de Maria do Rosário para
que o marido cortasse seu romance com ela. Assim resolve mandar a carta sem
abrir para o arquivo morto de um departamento qualquer da empresa.
Vou visitar o
Álvaro no hospital e lhe entregar a carta, resolve Pedro. Ela o reanimará com
novas forças para enfrentar seu destino que agora está livre e não mais
confinado em um arquivo morto...
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