Sobrevivendo - Carlos Cedano



SOBREVIVENDO
Carlos Cedano

É admirável a habilidade de algumas pessoas para conquistar a simpatia e confiança das outras. Era o caso de Marco Antônio. Quando chegava ao serviço, normalmente atrasado, seu sorriso parecia invadir o ambiente e comportava-se como se fosse o dono do pedaço!

Sua rotina diária era conhecida: passeava com calma entre as mesas dos colegas recontando as noticias dos jornais e da TV que ganhavam um sabor especial quando narradas por ele! Logo depois subia um andar para ver a encantadora Amélia por quem estava apaixonado, porem ela não correspondia. Marco Antônio não desistia, mas Amélia só o suportava – dizia − por ser ele muito divertido. Nosso colega almoçava do meio dia até às quinze horas e “enrolava” no restante do dia.

Às segundas-feiras eram sempre dias especiais. Esse dia contava suas extraordinárias aventuras de fim de semana, sempre cheias de detalhes e de situações engraçadas que nos fazia rir a todos e admirar sua imaginação e criatividade.  Exagerava? Sim, todos sabiam, mas as pessoas relevavam isso.  Estavam hipnotizadas!

E o trabalho? Nosso amigo tinha habilidade para “jogar areia” nos olhos dos colegas, não se conhecia um relatório que tivesse elaborado salvo os poucos memorandos de caráter administrativo que a secretária Maria José redigia, e ele se limitava a assina-los! Ela sim era apaixonada por Marco Antônio, mas era seu segredo!

O seu Garcia, o chefe da área, tinha sua sala a uma distancia relativamente afastada e como bom burocrata, se seus pedidos de informes e relatórios fossem atendidos no prazo certo, tudo estava bem!

As coisas continuaram assim por um bom tempo até que um dia seu Garcia convocou para uma reunião o pessoal na sua sala. O motivo?  Comunicar que, após cinco anos sem aumento salarial, o Presidente da empresa pública tinha conseguido do Governador um aumento real de vinte por cento. Foi uma alegria generalizada em toda a empresa. Mas existia uma condição, o Governador exigia um corte de pessoal equivalente ao aumento concedido. Foi um pega pra capar!

Após do impacto inicial da proposta e com as cabeças mais frias e calmas, vieram as reflexões e ponderações sobre funcionários. Discutia-se reservadamente qual ou quais eram os funcionários que poderiam ser “sacrificados”. O debate corria solto, nomes iam surgindo com as decorrentes discordâncias cada vez mais acirradas e apaixonadas. A consequência foi o racha do grupo em dois, ambos radicalmente contrários.

Confidencialmente Maria José contou pra Marco Antônio que seu nome já tinha sido cogitado para a degola. Muitos colegas já aceitavam que ela era, em verdade, um parasita! Você precisa fazer algo Marcão - disse a secretaria - e rápido!

Quando uma semana depois o seu Garcia convocou para uma nova reunião onde comunicaria as decisões visando cumprir as diretrizes do Governador, todos ficaram muito surpresos. Quem estava sentado ao lado de seu Garcia? Sim, era o próprio Marco Antônio que assim, ganhava um status de funcionário diferenciado!

O chefe comunicou que dois funcionários seriam demitidos e que já tinham sido comunicados. Quando anunciou os nomes dos afastados, nenhuma reação nem favorável nem contra, seu Garcia aproveitou para pedir licença e se retirou na companhia de Marco Antônio, pareciam satisfeitos com o resultado da reunião!

Nessa noite num restaurante francês, Maria José e Marco Antônio jantavam e comentavam o “acontecimento do dia”. A secretária, com um sorriso de alegria e admiração, lhe perguntou:

         — Como você conseguiu essa façanha Marco Antônio?

         — Não foi difícil gatinha, após que você conseguiu que seu Garcia me recebesse em privado, expliquei pra ele a situação existente na área, disse-lhe que sua decisão deveria ser equilibrada sem ofender nenhum dos dois grupos em luta! Antes de mais nada deveria garantir a governabilidade da área sob seu comando.

         — E dai...? Perguntou Maria José.

         — Sugeri que demitisse os mais antissociais de cada grupo. Ele concordou e me pediu nomes. O restante da história você conhece!

         — Você e terrível meu amigo, admiro seu talento para sobreviver no meio da tempestade!

Ambos levantaram suas taças e brindaram!

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