Só em Carambaja! - Vera Lambiasi



Só em Carambaja!  
Vera Lambiasi

Quando eu era pequenininha lá no interior, minha mãe trabalhava no baile de debutantes do Carambaja Golf Club, o mais chique da cidade, na avenida da Grama. O mais animado era o Clube Lodão, de gente simples, mas não era sempre que tínhamos permissão para frequentá-lo. Lugar ermo, lá no alto do morro.

Bom, a Zona era no alto de outro morro, e sabíamos de muitos pais frequentando, mas não tínhamos nada com isso. Naquele tempo, as esposas diziam :”Ruim com ele, pior sem ele”. E toca aguentar o falatório.

Mas, nesta função de organizadoras do baile, as damas da sociedade divertiam-se muito. Para prender um enfeite, por exemplo, uma queria dar um pontinho, outra, usar um alfinete de gancho, a mais nova, grampear. Isso porque ainda não existia a pistola de cola quente. E passavam as tardes a discutir amenidades de decoração, moda, música, arranjos florais, buffet, e outros quetais.

Os maridos, ocupadíssimos, diziam trabalhar, mas era só dar uma checada no carteado do próprio clube, para flagrá-los. Melhor ali do que na “outra”, vangloriavam-se as mulheres.

Chegado o dia do baile, Delso e sua orquestra tocando Burt Bacharach, madames emplumadas num calor de 40 graus, entraram as debutantes, menininhas virginais de quase 15 anos. Entre elas, uma bem estranha, aparentando 18. Zum zum zum no salão syntekado, cochichos abafados das patronesses. Ninguém conhecia a beldade curvilínea.

Estava com um discreto vestido de musselina branco, mas todos adivinhavam suas formas por debaixo do tecido. A moça realmente não contava com o ar angelical das demais. Seus cabelos negros, caíam em curvas pelas costas nuas. Maquiagem pesada para a situação. Biscate, comentavam as santas. Ou veio da Zona, ou do Lodão, as mais maldosas. As organizadoras pegaram a lista, e lá estava ela, Rosecleia, de Maipu. Na hora pensaram se tratar de uma das meninas da Geny. Não era possível, pediram tantas referencias. Pelo número, foram até a mesa da misteriosa debutante. Lá, sentava-se o médico da cidade, esposa, e filhos homens. Quem teria coragem de interpelá-lo? Voltaram aos seus assentos, com os rabos entre as pernas. Iniciado o desfile, Rosecleia levou os convidados ao delírio, com seu rebolado. As outras, doces meninas de família, já urravam de raiva, e inveja. A noite era da morena garbosa.

Primeira valsa, levantou-se o pai orgulhoso, ao encontro da filha adotada.

A esposa do médico, desenxabida, permaneceu sentada.
E comentou à boca pequena:


           — Melhor do que montar casa para a quenga.

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