MEU TIO COTA - Jeremias Moreira


MEU TIO COTA
Jeremias Moreira

Meu tio Cota foi um pouco de doce na vida amarga da minha infância! 

Apesar de ser o mais velho dos irmãos, era meu pai quem liderava a família e tocava os negócios. Vendo agora, com a compreensão dos anos, acho que era um fardo muito grande para meu pai. Ele vivia tenso, preocupado e sempre queria tudo certinho. Ao contrário, tio Cota era cabeça fresca, vivia o momento da melhor maneira que pudesse. Morava num sitio, próximo a Guariroba, onde passei deliciosas férias. Sempre via meus primos e minha tia envolvidos com os afazeres do sítio enquanto tio Cota passava o dia, na varanda, esparramado na rede. Nunca o vi repreender um filho. Na mesa ao jantar, meus primos relatavam os acontecimentos do dia e a conversa corria como entre amigos: franca e calma. Muitas vezes desejei ser seu filho. Com seu jeito indolente, tio Cota era cativante.

Certo dia meu pai foi procurado por um agiota, o Deodato. O homem estava tenso, enfezado. Contou que emprestara dinheiro ao meu tio há mais de um ano e que ele se fazia de morto.  Quando cobrado, dizia que no próximo mês acertaria.

Desacorçoado, o agiota estava a caminho do sitio. Queria receber tudo o que lhe era devido. E estava indo armado para qualquer eventualidade.

Estressado como sempre e prevendo o pior, meu pai sentiu um nó no estômago. Pediu calma ao homem e ponderou que se o Cota não saldasse a dívida, que voltasse e ele veria o que poderia fazer.

Os dias se passaram e nada do Deodato voltar. Meu pai também não ouviu nenhum rumor de violência. Mesmo assim continuou com a comichão que sentia quando preocupado.

Um dia encontrou-se com o homem na rua:
— E aí, Deodato, como foi sua conversa com o Cota?
— Ah, nem te conto, o Cota me recebeu muito bem. Fez a mulher preparar um almoção daqueles... e... coitado! O Cota está passando certa dificuldade, sabe! Até emprestei mais um dinheirinho pra ele!
Esse era meu tio Cota! 

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