DUAS IRMÃS E CINCO MARIAS
Suzana da Cunha Lima
Desde crianças, minha irmã e eu fomos muito ligadas. Brincávamos juntas e sempre arranjávamos alguma coisa para nos entreter. Sem televisão, games e Internet, nossas brincadeiras eram simples, os brinquedos modestos, porém desenvolviam nossas habilidades e nossa curiosidade para a vida: bilboquê, yôyô, varetas, e particularmente um que chamávamos de Cinco Marias, uma precursora dos alabares.
Quem fazia estes saquinhos para nós era vovó, que morava com a gente. Depois enchíamos de areia, facilmente encontrável na praia, a duas quadras onde morávamos. E isso nos divertia muito, principalmente nos dias chuvosos, quando ficávamos no escritório, na parte de baixo da casa.
Por aqueles dias, nossa avó andava acamada e não saía de seu quarto, na parte de cima da casa. E a gente via médico, tios e a própria mamãe, se desdobrarem em atenção a ela.
Foi quando numa tarde muito chuvosa, estávamos as duas entretidas brincando das Cinco Marias, quando percebemos um movimento insólito. Gente que subia e descia, o médico e mamãe não saíam do quarto da vovó, o telefone tocando toda hora.
Mas, crianças como éramos, não atentamos para a gravidade da situação, até que mamãe, chorosa, entrou no escritório e nos disse: Vão se despedir de sua avó. Papai do Céu a chamou.
Olhei para minha irmã e ela, muito mais viva que eu e sentimental, começou logo a chorar. Só fui entendendo o recado de mamãe, aos poucos, quando subia as escadas, para beijar pela última vez minha avó já morta, estirada na cama e muito fria.
Os saquinhos ficaram espalhados no chão. E nunca mais jogamos as 5 Marias, Acho que uma parte de minha infância terminou ali.
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