Sinestesia da vida - Fernando Braga


Sinestesia da vida
Fernando Braga
Sin = mesma ou mesmo. Estesia = sensibilidade

       A vida das pessoas é cheia de surpresas, fatos surpreendentes, muitas vezes dificilmente aceitáveis, que ocorrem trazendo consigo muita alegria, desejos inexplicáveis, mas também sujeitos a produzirem muita dor.

       Vejam o que aconteceu há 10 anos com quatro pessoas, dois homens e duas mulheres e o que a vida lhes preparou.

       Eram dois irmãos, João e Maria, filhos de um casal de amigos, conhecidos de longa data. Ele um rapagão forte, bem  apessoado e que recentemente havia recebido o seu diploma de médico. Ela, sua irmã querida, também era formada e sua principal característica era sua beleza única, rosto divinal, somando-se à silhueta perfeita.

        Aqueles que a olhassem não podiam deixar de comentar sua perfeição, para homem nenhum botar defeito e para nenhuma mulher deixar de invejá-la. Ocasionalmente quando ia à piscina do clube que frequentava, o comentário era geral e ninguém deixava de admira-la. Simpática, alegre, de amizade fácil, eram outros atributos e também muito segura de si, sempre rejeitando qualquer proposta de namoro. Nada aceitaria a não ser quando encontrasse o seu príncipe encantado.

       Chegou o dia de seu casamento e lá estava ele, Carlos a quem escolhera não apenas por seus dotes físicos, mas também por sua posição de destaque em uma firma de conceito internacional.

       Após 4 anos, já tinham um belo casal de filhos.

       Foi quando João, o médico, resolveu casar-se, escolhendo para esposa, Miriam, uma interiorana que viera estudar arquitetura em São Paulo,     vistosa, com presença, comunicativa, porém com beleza que não podia ser comparada à de Maria e disto tinha conhecimento, perdia longe.

        Cerca de 4 anos após o casamento, Carlos e Miriam tinham igualmente um casal de filhos.

       Os pais, filhos, genro, nora e os 4 netos, formavam uma família unida e feliz. Tudo faziam para se reunirem, estarem e viajarem juntos, indo muito frequentemente passar os fins de semana na praia. Os dois casais se admiravam mutuamente, iam sempre juntos para o Guarujá, onde brincavam no mar e frequentavam os melhores restaurantes.

       Certa vez, jogando baralho juntos, Carlos percebeu que tinha alguma coisa diferente com Miriam, e passou  observá-la com maior interesse, pois algo havia despertado nele.

       Ela, por sua vez, que dizia sempre amar seu marido, não deixava de olhar Carlos de soslaio, quando este estava de lado ou distraído e dentro de si. Tinha a sensação de que algo se passava dentro dela, em relação a ele.   Com o tempo, surgiu uma atração mútua e forte o bastante para, em seu interior, se desejarem. Mas nada era demonstrado de ambas as partes e muito menos percebido por seus pares.

       No começo cada um conseguiu segurar seu sentimento, prevendo um desastre que ocorreria no seio da família.

      — Impossível. Impossível, que isto venha a acontecer! - previa ele, mas não conseguia tirá-la do pensamento.

Ela, por sua vez passou a aceitá-lo em seu coração, como uma fruta proibida.

       Agora, quando juntos, trocavam olhares maliciosos e ao mesmo tempo de carinho, embutido.

       Um dia a sorte ou o azar favoreceu uma situação. João e Maria saíram com as quatro crianças para irem ao zoológico, ficando Miriam sozinha em seu apto. Foi quando chegou Carlos.

       Surpresa, sentaram-se no sofá, ele tomou uma dose de uísque que lhe foi oferecido, acompanhado por ela. Começaram a jogar conversa fora, dentro de um ambiente respeitoso. Vieram outras doses de uísque e foi quando ele se aproximou dela, sentando-se ao seu lado. Ela lhe deu um   tapinha no ombro, mostrando carinho. Foi então que ele acariciou seu rosto, aproximando sua boca, da dela.

        Ela não resistiu, aderiu e logo após estavam grudados um ao outro e ali mesmo, se despiram e tiveram o que mais desejavam.

       Após o ato, limparam tudo, sem deixar vestígios e começaram a falar de algo mais profundo. Assim falou ele:

       — Eu não sei o que você tem, que me atraiu profundamente. Notei que quando nos tocávamos, mesmo em um cumprimento, suas mãos pareciam que me beijavam, os seus olhos me transmitiam um desejo corporal, sua voz tocava o meu coração pela musicalidade que continha, seu cheiro me entorpecia, embriagava meu cérebro, como este uísque que acabamos de tomar.

— Miriam, me desculpe, te desejo, e estou apaixonado por você!

— Carlos, você falou tudo o que eu queria ouvir! Também quando pego em sua mão ou ocasionalmente toco seu corpo, a minha pele arrepia, manda imediatamente influxos ao meu cérebro e fico possuída pelo demônio. Faço tudo para manter meu controle. Quantas vezes sonhei com você! Acho que este amor é recíproco.    

      — Me perdoe, mas nunca senti as mesmas sensações com meu marido. Gosto dele, o aprecio, é pai de meus filhos, mas... E agora, o que podemos fazer?

       — Vamos decidir! Eles estão para chegar. Vamos marcar um novo encontro, em algum lugar para termos uma conversa mais séria.

       -Ok, eu topo!

       Após um mês, os dois casais saíram para jantar. O restaurante estava lotado.  Carlos estava sentado do lado esquerdo de Miriam. Quando terminaram a refeição, ele se concentrou e imbuído de enorme coragem, colocou a sua mão sobre a dela, apertou-a e disse:

      — Nós, queremos nos separar de vocês! Nós dois estamos apaixonados um pelo outro e nada poderá nos separar! Nos desculpem, mas é o amor, é o que a vida nos preparou!

       Não se sabe se João e Maria esperavam por isto, mas a reação deles foi de gente civilizada. Imediatamente se levantaram, tomaram um táxi e foram para a casa de Maria e lá, não sabiam o que dizer um ao outro. Era um par de irmãos abandonados ao mesmo tempo!

       O mais difícil foi, no dia seguinte, comunicar a situação aos pais, que quando ouviram o relato, ficaram atônitos, parados, mudos e quase tiveram enfarte. Houve um duplo divórcio. Maria ficou com seus filhos e Miriam com os dela.

       Após 10 anos, Carlos e Miriam continuavam juntos, se amando e com mais dois filhos. Maria após dois anos casou-se novamente e muito bem, continuando aquela mulher divina, linda, maravilhosa. Carlos não se casou mais e tornou-se o maior “galinha” da paróquia. Não perdia uma!

       Neste ocorrido, venceu o amor e a coragem.

       Após certo tempo, ninguém estava perdendo.



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